Para Gonzalo López, 77 anos, foi uma vida inteira de economia vivendo com um salário de operário em uma fábrica, tentando poupar para garantir que o filho com lesões cerebrais seria cuidado mesmo após ele partir. López e a mulher juntaram US$ 87 mil. No entanto, há quatro anos, quando a crise econômica foi deflagrada, um funcionário do banco ligou para a casa de López para sugerir que ele transferisse o seu dinheiro para um novo "produto" que lhe daria um retorno de 7%.
- Eu perguntei: 'É seguro?' - contou López. - Confiei nele. Ele sabia que o dinheiro era para meu filho.
Hoje, López é um dos cerca de 300 mil espanhóis que, no meio de uma recessão brutal, viram as economias de uma vida praticamente eliminadas no que os críticos chamam de uma campanha fraudulenta de vendas feita por bancos que estavam ameaçados pela implosão do mercado imobiliário espanhol. Muitos, como López, são mais idosos e não têm educação formal, e foram facilmente ludibriados quando funcionários dos bancos tiveram a ideia de gerar o capital e liquidar os débitos de suas contas, fazendo com que os donos de poupanças investissem em seus bancos em vez da poupança.
Para muitos poupadores, a primeira indicação de que tinham adquirido investimentos arriscados foi quando um desses bancos faliu há dois anos. Da noite para o dia, eles ficaram impossibilitados de sacar o dinheiro. Logo, entenderam que tinham comprado produtos financeiros complexos, originalmente projetados para investidores sofisticados. Eles tinham se tornado credores e não eram os primeiros da fila.
A situação desses pequenos poupadores - que investiram US$ 40 mil em média, mas perderam coletivamente US$ 10,3 bilhões - ganhou as manchetes e deixou o país dividido em relação ao que deveria ser feito por eles. Algumas pessoas dizem que eles deveriam ter tido mais cuidado, especialmente quando lhe ofereceram taxa de juro alta. Eles assinaram páginas de documentos declarando que estavam cientes.
Em contrapartida, outros acusam os bancos de poupança da Espanha de fraude, se aproveitando dos seus clientes mais vulneráveis quando as instituições já sabiam que estavam em apuros e que possivelmente abririam falência. O aumento súbito da construção na Espanha entrou em colapso em 2008 e, segundo um relatório recente do governo, o pico de vendas desses instrumentos financeiros híbridos ocorreu no ano seguinte.
Governo espanhol estabeleceu um sistema de arbitragem
Miguel Duran, advogado que representa cerca de 1,8 mil investidores, disse que quase todos os seus clientes receberam ligações em casa e lhe disseram para ignorar as páginas de formulários que estavam assinando porque eram só formalidades. O advogado disse que mesmo o nome das ações preferenciais que lhe venderam, chamadas de "preferentes", eram enganação. Duran contou que os poupadores acreditaram estar adquirindo uma taxa boa porque, como clientes antigos do banco, eram preferenciais.
Nos últimos dois anos, o setor bancário espanhol tem sido reestruturado e socorrido pela União Europeia. A maioria dos bancos de poupança sofreu fusão ou foi absorvida por companhias mais sólidas. No entanto, a maioria dos que foram salvos era de grandes bancos internacionais, não os pequenos investidores que foram direcionados para esses produtos arriscados.
- Sinto uma sensação de impotência - disse López. - E raiva. É difícil acreditar que tudo se foi.
Entre os mais infelizes investidores estão aqueles que tinham dinheiro em um dos sete bancos de poupança que faliram e formaram o Bankia, um novo banco nacional. Em junho, a instituição trocou os seus produtos híbridos por ações do novo banco, descontando 38% delas. Porém, uma vez que essas ações entraram no mercado aberto, o valor caiu para 18% do valor original.
Centenas desses acionistas começaram a protestar todas as quintas à noite na Puerta del Sol, em frente ao edifício do Bankia que ainda ostenta a sinalização do falecido banco Caja Madri. Alguns estão desempregados, atrasados no pagamento da hipoteca ou sobrevivendo das pensões do governo.
Carmen Babiano, 52 anos, e Francisco Margues, 55 anos, vão todas as semanas, mesmo que seja difícil pagar a tarifa do metrô. Margues é contador, mas perdeu quase todos os clientes e os negócios ruíram. Só lhe sobrou um único cliente, que lhe paga cerca de US$ 1,4 mil por mês. Contudo, depois de Margues pagar o imposto de renda, o seguro de saúde e algumas coisas básicas como a conta de luz, só sobram US$ 400 para o casal sobreviver.
Nas últimas semanas, o governo estabeleceu um sistema de arbitragem para os acionistas do Bankia que acreditam ter sofrido fraude. Quase 134 mil pessoas já solicitaram arbitragem. Nos 12 casos que chegaram aos tribunais, os juízes decidiram em favor dos investidores.
A família Camaño Brazales tem esperanças de que eles ganharão no tribunal. Tomás Camaño, 64 anos, passou 18 anos como porteiro de um banco de poupança quando aceitou o conselho de um funcionário e colocou suas economias nos preferentes. A filha de Tomás, 27 anos, que começou a trabalhar aos 16 anos, investiu o dinheiro que ela tinha economizado - mais de US$ 60 mil. Ela perdeu o emprego na recessão e mora com os pais, todos dependentes da pensão de US$ 1,6 mil mensais de Camaño.