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Passado o susto inicial causado por sucessivos embargos à carne brasileira no Exterior, revertidos nos últimos dias pelos principais compradores, o sentimento no campo oscila entre apreensão e alívio. A incerteza vem de como os mercados irão se comportar a partir de agora. O consolo é de que o estrago foi bem menor do que poderia ter sido diante da repercussão mundial do escândalo da Operação Carne Fraca.
Na cidade gaúcha com a maior produção de frangos do Rio Grande do Sul, no Vale do Taquari, a criação dos animais não parou. Mas o clima ainda é de apreensão nos mais de 300 aviários de Nova Bréscia. A preocupação é justificada pela importância da atividade para a economia local. Em 2016, o município com 3,3 mil habitantes produziu 32,6 milhões de aves – o equivalente a 9,7 mil frangos por morador.
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Há 15 dias, quando a investigação da Polícia Federal detectou suspeitas de irregularidades em 21 frigoríficos no país, o temor em relação ao futuro da atividade tomou conta da localidade. Isso porque entre as empresas envolvidas estavam a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, e JBS, responsável pela Seara – principais compradoras da produção na região.
Embora nenhum dos abatedouros colocados sob suspeita funcione no Estado, a maior parte dos 135 produtores de Nova Bréscia é integrada às duas empresas – líderes no mercado brasileiro de carnes. Na última semana, alguns criadores de frango foram avisados pela BRF de que o vazio sanitário – intervalo de tempo em que os aviários ficam vagos para higienização até receber novos lotes de animais – será ampliado para 30 dias, o dobro do prazo habitual. Na prática, os produtores tenham sua rentabilidade reduzida no período.
A medida preocupa criadores como Ederson Consatti, 25 anos. A família dele está no ramo há mais de duas décadas, atua de forma integrada com a BRF e mantém dois aviários em Linha Olinda, com capacidade total para 40 mil aves. Por ano, entrega 280 mil animais para abate.
– Esperamos que a situação se normalize logo, porque a qualidade do nosso produto é 100%. Cumprimos todas as exigências sanitárias – diz Consatti.
Depois que a Operação Carne Fraca veio à tona, em 17 de março, dezenas de países e a União Europeia anunciaram restrições às importações de proteína animal do Brasil – em um efeito dominó. Uma semana depois, após força-tarefa do governo federal para tentar minimizar os danos do escândalo, nações como China, Hong Kong, Chile e Egito voltaram atrás, mantendo suspensas apenas as compras de unidades investigadas. Mesmo assim, as incertezas em relação ao futuro persistem:
– Não tínhamos dúvida de que haveria reflexos no município. Agora, temos de fazer o possível para superar as dificuldades – pondera a secretária de Agricultura de Nova Bréscia, Elisabete Mônica Cigolini, que também é dona de aviários e produz para a JBS.
Para minimizar possíveis perdas, o prefeito Marcos Antônio Martini (PDT) convocou para o próximo dia 11 uma reunião com líderes políticos da região, representantes das empresas, integrantes do governo gaúcho e do Ministério da Agricultura.
_ É hora de dar as mãos. O setor primário é a nossa principal fonte de renda, e não podemos ficar alheios ao que está acontecendo no país. Vamos conversar e definir que ações podemos adotar para ajudar _ afirma Martini.
Procurada, a BRF informou que os padrões do vazio sanitário nos aviários foram revisados e padronizados ao longo de 2016. Atualmente, o intervalo é de no mínimo 12 dias e no máximo 30 dias, dependendo dos desafios e particularidades da região. A empresa negou que a medida adotada em relação a alguns produtores tenha relação com os efeitos da Operação Carne Fraca.
Na terça-feira, a BRF informou ao mercado, por meio de comunicado enviado à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que está promovendo mudanças em sua gestão para "fortalecer as operações nacionais e globais da companhia" e continuar "dando respostas aos desafios que vem enfrentando desde a deflagração da Operação Carne Fraca".
Mercados baixam a guarda para o Brasil
A expectativa de normalizar as exportações de carnes do Brasil foi trazida pela reabertura dos principais mercados. O primeiro alento veio da China, maior parceiro comercial do país, que passou a restringir as compras apenas das unidades investigadas. A reboque vieram Chile, Egito e Hong Kong.
– O nosso principal trunfo é a sanidade. Enquanto a influenza aviária está no mundo, aqui estamos livres do vírus – destaca Francisco Turra, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
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Além da retomada da confiança no sistema sanitário brasileiro, a decisão dos países de manter as compras tem relação com a dificuldade em substituir um produtor de peso como o Brasil. Avicultor em Nova Bréscia, Cristiano Betti, 29 anos, torce para que a tranquilidade volte ao campo.
Nos últimos três anos, sua família implantou sete aviários do tipo dark house (casa escura), que mantêm as aves confinadas em condições especiais de iluminação, temperatura e umidade. O investimento superou os R$ 5 milhões, sendo que a maior parte foi financiada pela BRF.
– É claro que estamos preocupados. A carne que produzimos vai para o Oriente Médio – conta Betti.
Em Marau, no norte do Estado, a apreensão nas últimas duas semanas se concentrou no campo e também na cidade. Com 230 aviários instalados no interior, o município tem a planta da BRF como a principal empregadora – mais de 3 mil trabalhadores.
– Mais de 50% da arrecadação do município vem da avicultura – assinala Ademir Durante, secretário da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Marau.
A unidade exporta mais de 90% da produção de carne de frango e suína. Na semana após a operação, a insegurança levou o frigorífico a fazer farinha com asas e pés de galinha – normalmente vendidos para a China. Na sequência, a produção dos cortes foi normalizada, segundo a fiscalização agropecuária do Ministério da Agricultura no Estado.
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Até sexta-feira, a Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav) não tinha informação de redução da produção. O reflexo mais visível foi uma pequena retração no consumo, segundo a entidade.
– O que pode ocorrer são readequações para se ajustar à demanda. Mas o importante é que a produção não irá parar – resume José Eduardo Santos, diretor-executivo da Asgav.
No mercado de carne suína, a expectativa é que em 10 dias a situação se normalize, estima o diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos do Estado (Sips), Rogério Kerber.
Mercado bovino tenta se recuperar
Após o baque causado nos consumidores pela operação Carne Fraca, os frigoríficos gaúchos normalizaram o volume de abates de bovinos nos últimos dias. Mesmo não tendo nenhuma unidade investigada, o Estado foi impactado com os embargos que atingiram as plantas exportadoras. Nos dias seguintes ao escândalo, as plantas da Marfrig e do Frigorífico Silva reduziram o ritmo de produção, segundo Zilmar Moussalle, diretor-executivo do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados no Rio Grande do Sul (Sicadergs):
– Mas à medida em que as informações iam sendo esclarecidas, os abates foram normalizados – informa.
A queda brusca no consumo de carne bovina, verificada no fim de semana da operação, também foi revertida a patamares normais. Agora, a preocupação é com a redução de preço. Em uma semana, o quilo da carcaça caiu de R$ 9,80 para R$ 9 no Estado.
– A tendência é de queda no preço, até pelo movimento especulativo – diz Moussalle.
A partir de segunda-feira, a JBS dará férias coletivas de 20 dias em dez de suas 36 unidades de abate de bovinos. A decisão da empresa, justificada pelos embargos, deve fazer com que o mercado de bovinos no país demore um pouco mais para se recuperar.