Em reportagem especial sobre Outubro Rosa, Donna ouviu a história de quatro mulheres para quem o diagnóstico do câncer de mama se tornou um impulso para a realização de antigos e novos sonhos.
Leia as outras partes da reportagem:
:: Depois de dois tumores na mama, paciente realiza o sonho da maternidade
:: "O câncer revolucionou minha vida", diz ex-bancária que lançou marca própria de moda
:: Professora vira triatleta depois do câncer de mama
Aos 32 anos, a engenheira civil Débora Righi tinha um roteiro bem planejado para sua vida: casar em 2019, defender a tese de doutorado em 2020 e engravidar logo em seguida. Até que, numa noite de domingo, em maio do ano passado, Bacon, o pug de estimação, pulou sobre sua mama esquerda. Ao levar a mão onde sentiu dor, apalpou um nódulo. Em menos de uma semana, chegou o diagnóstico "assustador".
- Eu, bem virgiana, tentei controlar tudo e descobri que não controlo nada. Lembro de dizer para o meu noivo "não desiste do casamento, não desiste de mim". Eu precisava de um propósito lá na frente - conta a professora de engenharia civil da Univates, em Lajeado.
Débora, que vive em Porto Alegre, enviou material genético para um teste nos Estados Unidos por US$ 250 (R$ 1.031). Descobriu que, embora a avó paterna tenha tido câncer de mama, não há, em nenhum dos 66 genes examinados, qualquer mutação genética que pudesse explicar este ou futuros cânceres. Oferecido apenas na rede privada no Brasil, o exame que escaneia genes como BRCA1 e BRCA2, envolvidos na maioria dos casos hereditários, custa entre R$ 4 mil a R$ 5 mil, de acordo com o Inca.
A engenheira não é sedentária nem tem excesso de gordura corporal, fatores que aumentam a probabilidade de surgimento de tumores. Também é exceção em relação à faixa etária das pacientes: cerca de quatro em cada cinco casos de câncer de mama ocorrem após os 50 anos.
Vaidosa, Débora sofreu muito com a queda dos cabelos e pelos do rosto e com a retirada das duas mamas. Não se reconhecia nas olheiras que via no espelho. Nesses momentos, pensava em como ia ser o casamento e desviava o foco da doença.
- Decidi que não queria transparecer o lado ruim do câncer, da mulher debilitada, triste. Passei a me dedicar a mostrar que dá pra ter autoestima durante o tratamento - diz.
A engenheira aprendeu a colar cílios postiços direto na pálpebra, fez micropigmentação da sobrancelha, comprou máscaras de tecido coloridas, se maquiava para ir às sessões de quimioterapia e exibia perucas de cores diferentes.
Pelas redes sociais, começou a conversar com outras pacientes e conheceu Débora Piangers, Caroline Bianchi e Michelen Andrighetto. Juntas criaram o projeto Oncolokas, com o objetivo de dar apoio a outras mulheres.
No dia 21 de setembro deste ano, encontraram-se pela primeira vez para realizar um desejo antigo: ir ao show de Sandy e Junior. Débora Righi, a última do grupo a receber o diagnóstico, vê nas novas amigas a esperança de realizar outros sonhos: depois do câncer, Débora Piangers casou e foi à Disney, Carol deu à luz Helena, e Michelen foi a Paris.
Débora Righi diz que o câncer a ensinou a valorizar o hoje, o que não significa deixar de fazer planos. Em setembro, realizou uma etapa importante do doutorado, a qualificação; a defesa da tese está prevista para o primeiro semestre do ano que vem. A data do casamento se manteve, 16 de novembro, um pouco mais de um ano depois de concluída a quimioterapia. Débora vai casar com Lucas, o namorado de nove anos que, durante o tratamento, foi a todas as sessões, trocou os curativos pós-cirurgia, deu-lhe banho.
- Ele precisou me limpar no banheiro! Chegamos num nível de intimidade que jamais imaginei. O casamento passou a ter um gosto de vitória - afirma.
Já com cabelo de novo, mas ainda curto, a engenheira vai casar de peruca para produzir o penteado que imaginou para este dia:
- Sempre quis casar de coque. Não ia deixar o câncer tirar meu sonho de criança.
Mas a cerimônia não vai estar completa. Débora perdeu o pai no final de setembro, devido a complicações de uma infecção. Enquanto vive o luto, acerta os últimos detalhes da cerimônia. A dor é amenizada quando pensa que o pai viu que ela ficou bem ao final do tratamento:
- Às vezes, me sinto egoísta por querer ser feliz. Mas todo pai deseja a felicidade da filha, então não é egoísmo seguir minha vida.