:: Parem de tratar magreza como sinônimo de normalidade e felicidade :: É essencial que o homem repense a masculinidade como lhe foi ensinada
Eu tinha uma amiga que sentia verdadeiro pavor de fazer 30 anos. Jamais a compreendi. Ela contava os anos, ai meu deus, vou fazer 28, estou chegando perto, e sofria.
Sigo sem compreender. Farei 39 anos em breve e só consigo ver coisas boas nessa passagem do tempo, com exceção de uma ou duas rugas na testa que eu às vezes vejo e penso poxa, isso não estava aí, e das ressacas, mas essas a gente aprende a controlar.
Quando eu tinha 20 anos, vivia em função de parecer bonita. Mesmo que fingisse que não, mesmo que fosse já uma jovem escritora cheia de ideias, eu vivia achando que, além de ser boa, tinha que ser bonita e magra e perfeita pra ser completa. E achava que não estava querendo cumprir as expectativas dos outros, ju-ra-va que vivia sem me importar, mas olha, como me importava. Me importava e ainda tentava me convencer que era porque eu queria. A mente pode ser muito traiçoeira quando não estamos prontos para ver as coisas como são. Nossos desejos não nascem do vácuo.
É claro que não sou uma pessoa totalmente livre e desencanada hoje em dia, mas, olha, que melhorada dá a vida quando você passa a se importar menos. Menos, apenas. Se importar menos com o que os outros vão achar, com a sua aparência de manhã, com a celulite na bunda.
Se, aos 20 anos, eu tivesse o corpo que tive nos últimos anos, me recusaria a sair de casa. Pior: eu sei que não fui a única, que não sou a única, que garotas lindas entram no mar de camiseta porque aprenderam que ser corpos não passaram pelo controle de qualidade da sociedade.
Eu era um case de demonstração de busca por aprovação. Passou. Ainda bem que passou. Ainda bem que passou e espero que fique no passado.
Esses dias, um moço, ao saber minha idade, disse NOSSA mas você não tem cara de 38! Entendo que ele disse isso como elogio, mas foi meio que uma “elofensa”, né? Aquela ofensa disfarçada de elogio e cunhada por minha irmãzinha Mari Messias. Depois, fiquei pensando, o que é ter cara de 38? Mechas grisalhas? Bochechas flácidas? Conjunto de tactel de cores fluorescentes? E o que é se comportar como 38? Fechar a camisa até o último botão? Rezar o terço? Ficar em casa depois das 21h?
Não acredito que a idade defina muita coisa a nosso respeito. Esperam, é claro, que, com certa idade, você tenha se estabilizado, mas e se eu não quiser estabilizar nada? E se a vida de pagar prestações não for pra mim?
E se eu quiser sair fora, vender tudo e ir morar numa casinha em algum lugar com montanhas e muitos gatos? E se eu quiser virar patinadora profissional, fazer muay thai, raspar a cabeça? E se eu quiser mudar pra Tierra del Fuego e aprender dança de salão? E se eu quiser beber pinga na esquina, dançar até as 7h? Vão dizer que não tenho mais idade? Tenho, repito, 38 anos e acabei de entrar no pole dance. Amo. Arraso. Penso melhor de cabeça pra baixo. Não pode?
Enquanto eu tiver vontade, não é a minha idade que vai me impedir.
A vida já é cheia de prisões, e eu não vou permitir que tornem a passagem do tempo mais uma. Não permita também. A vida é sua. O corpo é seu. O tempo não vai parar e a sua vida vai seguir passando.
Os incomodados que lidem.
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