Quem espia de longe uma sessão de autógrafos pensa que nada pode ser mais entediante. Uma longa fila com pessoas cabisbaixas esperando a vez de receber uma assinatura num livro, e na outra ponta um escritor que não vê a hora de a tortura acabar e voltar para casa.
Enganam-se, caríssimos. Entediante é disputa de pênaltis. Em sessões de autógrafos, acontece de tudo.
Tenho expertise, fiz muitas. Passei pelas maiores alegrias – e por alguns vexames históricos. Já comi mosca em um lançamento em Curitiba e em Brasília também – apareceram três pessoas em cada. E eu não era iniciante.
Quando iniciante, lancei livro na Feira de Porto Alegre durante um temporal apocalíptico. Apareceram dois parentes e o jornalista Ruy Carlos Ostermann. Fiquei extasiada com sua gentileza. Meu primeiro VIP.
Autografar para ídolos deixa o ego em festa. Tive Danuza Leão, Nelson Motta e Millôr Fernandes na mesma fila de uma sessão no Rio. Você chega a ter medo de acordar no dia seguinte e descobrir que foi um sonho. Do onírico para o real: vez em quando, surge um admirador desequilibrado (quem esquece Mark Chapman?). Mas inusitado mesmo foi quando um trio de meliantes afanou a bolsa que pendurei no encosto da cadeira enquanto autografava. As câmeras de segurança registraram. Não percebi nada. A fila andou normalmente.
É fato, minha fila anda. Sou rápida e solidária ao pessoal que está em pé, com fome, com artrite. Em 45 segundos, escrevo "um beijo carinhoso", faço uma pergunta para puxar papo e tiro uma selfie. Costuma ser suficiente, mas tem leitor que se abaixa, cruza os dois braços sobre a mesa e anuncia: vou te contar minha história. Agora? Jura? O suor escorre pela testa.
Já autografei para um golden retriever. Já teve quem me fizesse assinar um contrato de casamento de brincadeirinha. E quem me convidasse para madrinha de uma união que começou na fila um ano antes. Pois é. Enquanto esperam, os leitores se relacionam. Fazem amigos. Arranjam namorados.
Estranhezas, sobressaltos, comoções: é um agito ótimo. Horror, só quando você enxerga, no meio da fila, uma pessoa que você conhece, mas não lembra o nome. Ela abana de longe. É certo que dispensou a identificação no papelzinho: "Não preciso, sou íntima". Ela está chegando perto e você já não atina mais nada (foi numa dessas que uma vez dediquei "Para Marquinhos" e o leitor se chamava Romualdo, a gente pira diante de uma tragédia iminente). Falta um minuto. Dê uma pista, Jesus. A pessoa finalmente chega na sua frente. Abre os braços: "Prima!!" É da família. Só piora.
Nunca, jamais, em nenhuma hipótese, pergunte numa sessão de autógrafos: lembra de mim? Nem mesmo se você for a mãe do autor. A não ser que não seja fã dele.