Se eu pudesse escolher mais uma atividade inviável (além do latim, da poesia, do saxofone), gostaria de ter um programa de televisão que percorresse as livrarias do Brasil para apresentá-las, mas somente as de rua, aquelas que, como os antigos cinemas desaparecidos, guardam o charme de estarem em contato com as calçadas, de terem o próprio café, habitadas por livreiros dedicados, entregues a um metiê obsoleto: saber o livro que ainda não sabemos querer, cuidar dos volumes como se não fossem meras caixas de sapato.
Minhas ideias sempre esbarram no financiamento. Mas vejam, o custo de produção de uma temporada, com folga, não chegaria a 0,1% do que nos levantou um ex-ministro da economia (o espanto das grandes somas colocadas em unidades), valor que também daria, por exemplo, para comprar 10 shows de pequeno porte, 10 montagens de teatro, ou, pasmem, publicar 25 livros de autores independentes. 0,1%. Por vezes agradeço não ter o raciocínio matemático do meu tio Regis: há muita coisa no país que é melhor não calcular.
A primeira temporada seria no Rio Grande do Sul, interior e capital. Em Porto Alegre, há quatro lugares a visitar: no Bom Fim, Palavraria; na Cidade Baixa, Bamboletras e Sapere Aude; no centro, a clássica Palmarinca. Aos queridos amigos dos sebos, peço que aguardem a segunda temporada. No interior, há pelo menos seis livrarias que justificam um turismo de leitores às suas cidades. Em Canela, a charmosa Empório Canela, que, além de tudo, é um bistrô espetacular. Em Gramado, o requinte da Sucelus. Em Santa Cruz, o belíssimo prédio e as tortas inesquecíveis da Iluminura. Em Pelotas, no centro, o acervo da Livraria Mundial. Em Caxias, a elegância e a variedade da Arco da Velha, com seu café de qualidade superior. Por fim, o programa chegaria àquela que é uma das mais impressionantes livrarias que já conheci, incluindo aí as de outros países, uma joia localizada num casarão de esquina em São Francisco de Paula, a Miragem, com seu interior amadeirado e seus muitos pisos surpreendentes.
Senhor das coisas inviáveis, quem sabe um dia eu faça um programa-piloto. Por ora esta crônica é o que posso fazer.