Um dos ícones da contracultura, a cantora Joan Baez se apresenta em Porto Alegre no dia 19 de março. Será o primeiro show da madrinha do folk não apenas em Porto Alegre, mas no Brasil: em 1981, em sua primeira visita ao país, o governo militar a proibiu de cantar em São Paulo e no Rio - outras duas capitais nas quais ela agora tem espetáculos marcados.
Aos 73 anos, a ativista e pintora diletante fará uma turnê pelo país (passando antes por Argentina, Uruguai e Chile), trazendo no bojo do seu violão músicas que formam a trilha sonora de uma geração e que ganharam sua interpretação personalíssima - como Blowin' in the Wind (Bob Dylan), Imagine (John Lennon), The Night They Drove Old Dixie Down (The Band) e Gracias a la Vida (Violeta Parra).
Também haverá espaço para canções de sua autoria, como Diamonds & Rust e Be Not Too Hard, e faixas de seu disco mais recente, Day After Tomorrow (2008), recheado por músicas de Tom Waits (a faixa-título), Elvis Costello (Scarlet Tide), Patty Griffin (Mary) e Steve Earle (God Is God), que também produziu o disco. Bastante elogiado, Day... colocou Joan novamente nas listas de mais vendidos depois de 30 anos. Bem-humorada, a cantora conversou por telefone com Zero Hora sobre política, música e até sobre o ex-namorado Bob Dylan.
Zero Hora - Você pertence a uma geração de artistas que acreditavam que a música tinha uma função política e social. Essa crença não parece existir mais hoje.
Joan Baez - Acho que o que falta hoje é senso de comunidade. Muita gente tem feito muita coisa boa, mas sem esse sentimento que nós tínhamos nos anos 1960, o sentimento que nos foi dado por Martin Luther King - ou até mesmo por Barack Obama, quando ele discursava há 10 anos. Com Obama, foi um fenômeno estranho, que eu realmente não entendia, mas, pela primeira vez em muito tempo, sentia novamente aquela força que aproximava as pessoas.
ZH - Obama não faz mais com que você se sinta otimista, é isso?
Joan - Nunca fui muito otimista, para ser bem sincera (risos). Principalmente com relação a partidos políticos, Casa Branca, essas coisas. Se Barack Obama tivesse decidido não concorrer a presidente e se tornasse parte de um movimento, acho que ele teria feito muito mais progresso, porque poderia captar aquele sentimento de que precisávamos. Estou convencida disso. Mas, uma vez que decidiu concorrer a presidente, precisou entrar num esquema típico de quem quer esse tipo de cargo, e aí não há nada que se possa fazer.
ZH - E na música, existe quem faça a diferença hoje?
Joan - Não gasto muito tempo descobrindo novos artistas. As pessoas acham que sim, mas o que eu mais faço mesmo é pintar, no meu ateliê, cercada de silêncio (risos). Não sou de forma alguma uma expert no que está acontecendo no mundo da música, não tenho como opinar. Às vezes, me pego apaixonada por algum disco, tipo do Willie Nelson, e fico uma semana inteira ouvindo (risos). E, quando quero dançar, coloco um Gipsy Kings. Na verdade, tudo parece ser uma versão estendida das bobagens que eu ouvia quando tinha 17 anos, como uma rebelião contra aquela superficialidade. Agora, a música virou entretenimento. E as pessoas que têm algo a dizer simplesmente não encontram espaço ou alguém para ouvi-las em larga escala.
ZH - Mas você mantém contato ainda com o pessoal da cena folk dos anos 1960, certo?
Joan - Muito pouco. Às vezes, encontro Jackson Brown, Bonnie Raitt, Emmylou Harris... Até porque nunca fomos muito próximos, nós não moramos perto nem nada. Na nossa vida, temos cinco ou seis amigos próximos e, naquela época, nós não tínhamos esse tipo de amizade.
ZH - Nem com Bob Dylan?
Joan - Dylan não tem jeito, ele não tem amigos próximos (risos). Qualquer coisa que as pessoas imaginem sobre eu e Dylan, diga a elas para... esquecer (risos). Fiquem com as belas canções, apenas.
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Gustavo Brigatti
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