Após quase dois anos sem shows, Erasmo Carlos volta aos palcos em Porto Alegre neste sábado (27). No Auditório Araújo Vianna, a partir das 21h, ele apresenta o espetáculo O Futuro Pertence à Jovem Guarda, trazendo clássicos sessentistas do movimento cultural.
O título também remete a seu novo disco, previsto para sair nos próximos meses, no qual regravou canções de Golden Boys, Vips, Renato e seus Blue Caps, Eduardo Araújo, Roberto Carlos, entre outros.
Erasmo completou 80 anos em 5 de junho. Não foi um ano fácil, embora tenha sido exitoso: no primeiro semestre deste ano, anunciou que estava curado do câncer de fígado que enfrentava há quatro anos. No final de agosto, superou a covid-19. Tudo isso em meio à pandemia, sem contato com seu público. Para Erasmo, a apresentação no Araújo servirá para reaprender a fazer shows.
Em conversa com GZH, o Tremendão falou sobre seus reaprendizados, sobre o disco Carlos, Erasmo..., sobre as batalhas que andou vencendo, sobre playlists e séries que andou assistindo.
Antes de tudo, você se tornou bisavô em setembro. Parabéns pela Lua! Bisavô do rock, então?
Veja só, rapaz! Mas o Gilberto Gil também não é bisavô?
Mas Gil não é bisavô do rock…
Pois é (risos)! Ainda não a vi pessoalmente, só por fotografia e vídeo. Ela nasceu nos Estados Unidos, meu neto mora lá. Ah, ela é lindinha! Uma gracinha! Estou muito feliz, bicho.
Qual a expectativa de voltar aos palcos? Como você está se sentindo?
É um aprendizado. Desaprendi um pouco, esqueci que era artista (risos). Agora tenho que me acostumar. "Ih, é assim?". Desacostumei com uma porção de coisas. Até com selfie eu me desacostumei. Esses dias, andando na rua, alguém me abordou, e eu me espantei: "Eu? Você quer tirar uma selfie comigo?". É mesmo, cara, tem essa. Não lembrava (risos). Estou animado por estar voltando.
O seu reencontro com os palcos será em Porto Alegre. Antes da pandemia, você vinha com frequência ao Rio Grande do Sul para se apresentar. Então, você retorna à Capital gaúcha para redescobrir como se faz show?
Está sendo tudo novo para mim. "Erasmo, tem ensaio." Aí, tenho que ficar reaprendendo as coisas (risos). Daqui a pouco, terei que reaprender a pegar avião. Então, em Porto Alegre, vou reaprender a fazer shows. Vou ficar nervoso, mas quando pisar no palco, sei que o carinho das pessoas vai me trazer à realidade. "Isso que é show, Erasmo." Estou feliz de voltar aos palcos aí.
Por que o futuro pertence à jovem guarda, como diz o título do show?
Esse show e o trabalho do disco prestam homenagem à frase "O futuro pertence à jovem guarda", de autoria de Vladimir Lenin (revolucionário russo, 1870-1924). Essa frase rendeu o nome da Jovem Guarda. Foi um movimento maravilhoso que mudou o comportamento social e musical de uma geração. Essa frase também é mais profunda do que parece. A jovem guarda é a nova geração, os bebezinhos que nascem. Eles que são os responsáveis pelo futuro. Cabe à gente dar educação, saúde e amor, para eles mudarem o mundo. Esse não foi o mundo imaginado pelos profetas e poetas. Está horrível! Mal conduzido. Cabe à jovem guarda consertar. Temos que começar a pensar nisso urgentemente, porque daí sairá um mundo melhor, com muita solidariedade. Muito amor, sabe, bicho. E banir o ódio definitivamente das cabeças. O ódio está impedindo tudo, é terrível! É um inimigo mortal que todo mundo tem em qualquer setor. Só prejudica a corrente do bem. Tudo isso eu leio nessa frase.
Você foi um dos protagonistas da Jovem Guarda, que trouxe novos padrões estéticos, comportamentais e musicais à juventude nos anos 1960. Hoje em dia, como é cantar as canções daquela época?
Tem músicas belíssimas, bicho, que falam do fundo do coração. Muito profundas. Fiquei muito feliz cantando Devolva-me e A Volta. Gravei Tijolinho, que eu amo, acho uma música inocente, linda e maravilhosa. O primeiro single das oito faixas é Nasci para Chorar. Neste show não tem música de época, só Jovem Guarda.
Você chegou aos 80 anos em junho. Como você se sentiu ao completar oito décadas?
Eu não sei como é se ver como uma pessoa de 80 anos. Por dentro, me vejo como jovem. Por dentro, sou um menino. A mente não tem idade. O problema é que, cada vez mais, o corpo não te obedece. A mente manda, mas o corpo não faz. Fica limitado. Fora isso, tem sido legal envelhecer, tem a sabedoria acumulada que compensa. No fundo, envelhecer é uma merda, pois você fica privado das coisas boas. Passa a não ser dono do seu corpo. Mas a banda toca assim, a gente tem que dançar.
No primeiro semestre deste ano, você anunciou que estava curado do câncer de fígado que enfrentava há quatro anos. No final de agosto, você enfrentou a covid-19 e, novamente, venceu. Como essas experiências te transformaram?
Eu estava comemorando a alta do câncer e veio a covid (risos). A covid deixou umas sequelinhas, um pouco de cansaço. Perdi um pouco de massa muscular, mas estou me recuperando. Assim como o show vai ser uma recuperação para mim. Aos poucos, vou retomando minha vidinha antiga. Não recomendo a ninguém essa batalha contra covid. É uma guerra. É sério, mesmo. Fiquei 12 dias no CTI.
O cultuado disco Carlos, Erasmo… completou 50 anos em 2021. Como esse álbum atravessou as décadas para você?
Ele tem fãs, bicho. E eles me cobram muito: "Poxa, Erasmo". Quando gravei, não imaginava que ia ser cult. Gravei como disco normal, que gravo sempre. Mas aí ele tomou um rumo diferente. As pessoas acham que indiquei vários caminhos para a música brasileira. Mas foi sem querer (risos). Fico feliz com isso. A gravadora Universal está relançando o vinil. As pessoas que gostam de LP e desse álbum, é só esperar mais um pouquinho que logo sai.
Na sua opinião, por que esse disco segue sendo tão celebrado até hoje?
Não sei, bicho. Talvez pela invenção. Antigamente se inventava muito mais, os músicos e compositores eram mais ousados. As gravadoras eram mais generosas em deixar os estúdios para você fazer pesquisa. Hoje em dia isso acabou. Ninguém faz mais pesquisa, trabalho artesanal com a música, já tem fórmulas prontas. Coisas empacotadas e pré-formatadas, como se fosse uma fábrica de canções. A música feita com artesanato morreu. Um ou outro pode estar fazendo, mas do jeito que está, é tudo apressado. Muito pouco tempo de estúdio e mixagem, as pessoas não têm paciência. Não curtem o que estão fazendo. É a impressão que tenho.
Como estava sendo sua vida na quarentena? Esse período te inspirou artisticamente?
Aprendi a fazer playlists. Comecei a fazer playlists para uso pessoal. Passei a separar as músicas mais lindas que já ouvi na minha vida. Tenho uma playlist principal que já tem mais de 800 músicas mais bonitas da minha vida. Só as preferidas. Também tenho playlists especializadas. E séries de televisão também, comecei a ver muito. Eu e minha mulher passamos a cuidar mais da casa. Joguinhos de vez em quando.
Que séries você assistiu e gostou?
The Walking Dead, eu gosto bastante de ver. Sou fã mesmo. Estou esperando vir uma temporada ótima. Curto também Killing Eve. Comecei a ver uma série com três mulheres malucas que começam a roubar (Good Girls). O Gambito da Rainha, Você, Round 6, são muitas séries boas.
O FUTURO PERTENCE À JOVEM GUARDA
- Sábado, a partir das 21h, no Auditório Araújo Vianna (Avenida Osvaldo Aranha, 685).
- Abertura da casa: 19h.
- Classificação: 16 anos.
- Ingressos: de R$ 45 a R$ 310 pelo Sympla. Desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante e um acompanhante.