Se André Abujamra e Mauricio Pereira fundassem uma dupla nos dias de hoje, é possível que não escolhessem o nome Os Mulheres Negras. A menos que quisessem enfrentar oposição de movimentos sociais. Mas a banda de pop experimental surgiu na contracultura paulistana dos anos 1980, quando havia inocência em não fazer sentido. E, se não são negros e muito menos mulheres, André (voz, guitarra e teclados) e Mauricio (voz e sax) afirmam passar longe de qualquer alusão ao racismo.
Feito o preâmbulo, Os Mulheres Negras prometem agradar o público mais jovem que desconhece seu trabalho – e que possa questionar o nome da banda. O show ocorre às 21h de hoje, no Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/nº) e mistura música e encenação, o que tornou possível entrar na programação do festival Porto Verão Alegre 2018. A apresentação será uma releitura dos shows dos anos 1980, época em que os músicos, sem o recurso dos computadores pessoais, utilizavam equipamentos sonoros para passar a impressão de serem mais do que uma simples dupla – manobra que Mauricio chama de “tecnopobre”:
– A gente usava pedalzinho de sampler, aparelhinhos, quinquilharias e traquitanas para fazer duas pessoas soarem como uma big band de 20.
A noite trará sucessos como Sub, canção do disco Música e Ciência (1988) em homenagem a Yellow Submarine, dos Beatles, e Purquá Mecê, com versos aparentemente sem sentido como “Purquá mecê, purquá/ Comê o tucanô, a flor, o animá/ Trabalhos do senhor!”.
Separados depois de seis anos de estrada, intervalo em que André criou a banda Karnak e Mauricio focou em projetos pessoais, Os Mulheres Negras retornaram graças a um hobbie de Charles Gavin. O ex-integrante dos Titãs gostava de garimpar trabalhos lançados em vinil a fim de recuperar pérolas e relançá-las em CD. Em 2001, tanto Música e Ciência quanto Música Serve Pra Isso (1990) saíram pelo selo da Warner, e o ressurgimento da dupla se completou com shows pontuais pelo Brasil.
Retomada da dupla com mais harmonia
Apesar de não ter gerado novas músicas, a pausa e o retorno provocaram uma renovação no relacionamento entre André e Mauricio, que se conheceram em uma oficina de percussão em 1984. Segundo André, o tempo na relação garantiu um amadurecimento que se compara ao de um casal que sobrevive após idas e vindas:
– A gente era dois caciques da tribo, quebrava pau, brigava. Depois que cada um foi fazer seu trabalho, voltamos de uma forma que, em vez de ser cacique, agora a gente é pajé, curandeiro. Mais velhinhos, cuidamos um do outro.
Para quem insiste em buscar a origem do nome da banda, a dupla esclarece: foi de forma rápida e aleatória que botaram os olhos em um livro do pai de André, o ator e apresentador Antônio Abujamra (1932–2015), e sentiram-se atraídos pela frase “Quantas mulheres negras tentaram suicídio quando a primavera não era suficiente”. Encurtando a oração até o sujeito, resolveram o dilema de quem precisa nomear um grupo recém criado colocando um artigo masculino no plural – no melhor estilo nonsense que os tempos reconheciam.
Não vendo problemas em utilizar palavras que denominam minorias sociais a que claramente não pertencem, Mauricio faz uma reflexão sobre a crítica de quem defenderia uma restrição à banda.
– Em uma época de mudanças como essa, as pessoas precisam se apegar a palavras de ordem. Com esse nome, a gente tá no meio do tiroteio. Se a gente tiver que sangrar e morrer, azar. Faz parte da história do mundo. Vão ver o show. Os Mulheres Negras é tudo menos uma banda de reacionários – garante.
SERVIÇO
OS MULHERES NEGRAS
Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/nº). Segunda-feira, às 21h.
Ingressos: antecipados R$ 30, R$ 24 (sócios do Clube do Assinante e Banricompras) e R$ 20 (idosos e estudantes); na hora: R$40, R$ 32 (sócio do Clube do Assinante e Banricompras) e R$ 20 (idosos e estudantes).
Pontos de venda sem taxa: bilheteria do teatro, das 13h até o horário de início do espetáculo.
Pontos de venda com taxa: site vendas.teatrosaopedro.com.br.
Confira a programação completa diariamente no roteiro da página 6. Outras informações pelo site e pela página no Facebook.