O ator argentino Oscar Martínez não é um estreante, mas, graças ao talento e à constante presença no cinema e na TV de seu país nos últimos tempos, pode ser chamado de "novo Ricardo Darín" – aliás, ele já trabalhou com o conterrâneo nos filmes Relatos Selvagens (2014) e Kóblic (2016). Com O Cidadão Ilustre (2016), veio a consagração internacional: Martínez levou a Copa Volpi de melhor ator do Festival de Veneza do ano passado. Indicada pela Argentina a disputar uma vaga entre os finalistas ao Oscar de filme estrangeiro, a comédia dramática dos diretores Gastón Duprat e Mariano Cohn ganhou ainda o Goya de melhor produção ibero-americana – principal prêmio da indústria cinematográfica espanhola.
Em O Cidadão Ilustre, coprodução entre Argentina e Espanha, Daniel Mantovani (Martínez) é um escritor argentino que vive na Europa há três décadas, mundialmente respeitado por ter recebido o Prêmio Nobel de Literatura. Seus livros se caracterizam por retratar com olhar crítico a vida provinciana em Salas, a pequena cidade da Argentina onde nasceu – e a qual não visitou desde que partiu com planos de tornar-se escritor. Um dia, entre as numerosas correspondências recebidas diariamente pelo autor radicado em Barcelona, chega uma carta do prefeito de Salas convidando-o a receber o máximo reconhecimento da localidade: a medalha de cidadão ilustre. Surpreendentemente, e apesar de suas importantes obrigações e compromissos, Daniel decide aceitar a proposta e passar alguns dias em sua terra natal. A viagem reservará várias surpresas: será o retorno triunfal ao vilarejo que viu o escritor nascer, uma volta ao passado em que reencontrará velhos amigos, amores e paisagens da juventude – mas também um perturbador e mesmo perigoso confronto do protagonista com fantasmas, ressentimentos e fraquezas pessoais.
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O engenhoso roteiro de Andrés Duprat conduz a narrativa de O Cidadão Ilustre em tom agridoce, expondo com inteligência e crueza a ambiguidade da relação do lugarejo provinciano com seu filho mais cosmopolitano e, especialmente, a complexa personalidade de Daniel Mantovani – intelectual aclamado que despreza a própria consagração, sujeito vaidoso que desdenha a bajulação, criativo e sensível romancista refratário ao contato e ao afeto das pessoas. A direção segura de Gastón Duprat e Mariano Cohn – dupla que começou produzindo videoarte e cinema experimental e que já realizou filmes como o ótimo O Homem ao Lado (2008) – explora com sarcasmo paradoxos tematizados anteriormente em seus trabalhos: a imagem que o artista propaga de si mesmo, ao mesmo tempo marginal e superior em relação à sociedade, e a argentinidade dividida entre uma arrogante sofisticação europeia e um chauvinismo xucro. A alma de O Cidadão Ilustre, porém, está na excepcional atuação de Oscar Martínez, intérprete de filmes como Ninho Vazio (2008) e Paulina (2015) e que em breve poderá ser visto em Inseparáveis (2016), versão argentina do sucesso de bilheteria francês Intocáveis (2011).
O CIDADÃO ILUSTRE
De Mariano Cohn e Gastón Duprat
Comédia, Argentina, 2015, 120min, 10 anos.
Cotação: muito bom
Onde assistir: Cinemark Ipiranga, Espaço Itaú, GNC Moinhos e Guion Center