Um dos filmes brasileiros mais aguardados dos últimos tempos, Aquarius abre nesta sexta-feira o Festival de Gramado precedido por elogios entusiasmados e polêmicas calorosas. O longa que será exibido nesta noite no Palácio dos Festivais, fora do concurso, inaugurou na quarta-feira o complexo com cinco salas de rede Reserva Cultural em Niterói (RJ). O diretor Kleber Mendonça Filho e a protagonista Sonia Braga compareceram à sessão.
Além da expectativa por assistir ao novo trabalho do realizador do premiado O som ao redor (2013), o evento foi marcado pelos novos capítulos do debate surgido desde que a delegação de Aquarius protestou no Festival de Cannes, em maio passado, contra o governo do presidente interino Michel Temer. A classificação indicativa de 18 anos imposta ao filme no Brasil foi considerada por muitos como uma represália. E pelo menos dois cineastas anunciaram a retirada das candidaturas de suas produções a uma indicação ao Oscar, em desagravo às manifestações contra Aquarius expressas por um dos integrantes da comissão responsável pela escolha do representante nacional no Oscar: Gabriel Mascaro, de Boi neon, e Anna Muylaert, de Mãe só há uma. Já o diretor e produtor Guilherme Fiúza Zenha comunicou seu desligamento dessa comissão.
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Sonia Braga será homenageada hoje no Palácio dos Festivais com o Troféu Oscarito. A atriz está excelente em Aquarius no papel de uma mulher madura que resiste sozinha em seu apartamento contra a especulação imobiliária. E reagiu com indignação e ironia quanto à classificação etária do filme – que teria sido motivada pelas breves cenas de nudez e sexo:
– Não é justo com menores de 18 anos, Aquarius não merece essa classificação. Será que é porque aparece um tubarão na trama? Não permitir que essas pessoas tenham acesso ao filme é uma limitação da liberdade. Você que tem 16, 17 anos e quer ver o filme: proteste!
Risonha e exuberante em um vestido vermelho, acompanhado de um véu que jogava para o alto na hora das fotos, a atriz comentou no encontro de quarta que quer raspar a cabeça ("Não combina comigo, que faço uma dieta saudável, ter que pintar o cabelo"), minimizou o fato de interpretar a mãe de Julia Roberts no filme Extraordinário ("É apenas um dia de filmagem com Julia Roberts, talvez eu nem cruze com ela no set, porque só apareço com a filha dela") e falou sobre o Troféu Oscarito que receberá nesta sexta em Gramado:
– Não é uma homenagem a mim, especificamente. Vamos homenagear Aquarius, que é o que me leva a Gramado. Já fui premiada duas vezes lá (pelos filmes Eu te amo e Memórias póstumas).
Kleber Mendonça Filho repete em Aquarius temas centrais em seus trabalhos anteriores, especialmente em O som ao redor: o crescimento urbano desordenado de Recife – e, por extensão, das grandes cidades brasileiras –, as abissais desigualdades sociais, a peculiar forma de convivência entre patrões e empregados domésticos no país e a tendência ao apagamento da memória individual e coletiva. O diretor comentou sobre a polêmica que envolve Aquarius e a reação de seus colegas:
– Fiquei tocado com o ato deles. Eu acho que esse governo está aprendendo nos últimos três meses que a cultura é um instrumento muito forte. As ideias das pessoas que fazem a cultura são muito fortes. O Gabriel (Mascaro) me disse que estava se sentindo privilegiado de maneira errada com a perseguição a Aquarius. Acho isso incrível! Não vou tirar o Aquarius da lista – disse Kleber a ZH antes da projeção de seu drama.
Biografia de Elis Regina abre disputa por Kikitos
A competição de longas-metragens brasileiros do 44º Festival de Cinema de Gramado terá início neste sábado com a aguardada cinebiografia da cantora gaúcha Elis Regina (1945 – 1982), com sessão às 19h no Palácio dos Festivais. Com direção de Hugo Prata, Elis tem como protagonista Andreia Horta e destaca os principais momentos da vida e da carreira da artista a partir de sua chegada ao Rio de Janeiro, nos anos 1960.
Outros cinco longas nacionais estão na disputa pelos Kikitos. São eles O roubo da taça, de Caito Ortiz, Barata Ribeiro, 716, de Domingos Oliveira, El mate, de Bruno Kott, O silêncio do céu, de Marco Dutra, e Tamo junto, de Matheus Souza. A mostra de longas estrangeiros reúne sete produções que serão exibidas até sexta da semana que vem.
Além de Sonia Braga, também serão homenageados pelo Festival de Gramado o ator Tony Ramos (sábado), o cineasta e ator José Mojica Marins (terça) e a atriz argentina Cecilia Roth (sexta).
Enzo Arns, diretor de eventos da Gramadotur, responsável pela organização do festival, diz que a edição deste ano conta com orçamento de R$ 3,3 milhões, sendo R$ 1,2 milhão em recursos próprios, R$ 1 milhão via Lei Rouanet e o restante captado por meio da LIC-RS e patrocínios diretos:
– Não foi um ano fácil para captar recursos, mas o Festival de Gramado tem a vantagem sobre outros eventos culturais de já ser muito conhecido e ter grande visibilidade. Para esta edição, buscamos uma seleção de filmes que combinassem qualidade artística e apelo de público. Investimos ainda em uma programação mais interativa com as pessoas que ficarão de fora do Palácio dos Festivais.
Entre as inovações desta edição do evento, estão a renovação da cenografia do Palácio do Festivais e de seu entorno e uma nova dinâmica da premiação –alguns prêmios serão entregues no tapete vermelho. Arns ainda destaca uma iniciava de 2016 que vai ganhar corpo em 2017 como evento oficial.
– Estamos realizando nessa edição encontros entre profissionais do setor com foco no cinema como arte e como negócio. Teremos uma programação paralela em parceria com o Festival de Sundance e, no ano que vem, teremos o primeiro Gramado Film Market, evento que será realizado junto com o Festival de Gramado.