Autistas de até 12 anos contam com um abrigo organizado com atenção a suas particularidades em Porto Alegre. O espaço, improvisado em uma academia de crossfit, está localizado no bairro Passo D'Areia, na Zona Norte, e atende às necessidades de alimentação, ambientação e suporte médico e multidisciplinar das famílias das chamadas crianças atípicas (com desenvolvimento diferente), incluindo deficientes.
O projeto, executado no transcorrer de horas, ao ritmo da urgência da calamidade no Estado, foi idealizado pela jornalista Debora Saueressig e pela nutricionista Roberta Vargas, mães de autistas e fundadoras do Instituto Colo de Mãe. O abrigo, que tem capacidade para 75 pessoas, acolhia 60 na manhã desta sexta-feira (10).
A mobilização começou quando a dupla percebeu que, apesar de todo o cuidado e das melhores intenções dos envolvidos nas operações de acolhimento aos atingidos pela enchente, os abrigos comuns não poderiam atender a esse público específico.
— Tem muito barulho, muito estímulo sensorial, muita cor, não há alimentos específicos. Dentro do que a gente conhece de manejo, se fossem os nossos filhos tendo que ser levados a esses abrigos, eles entrariam em crise e precisaríamos sedá-los — explica Debora.
Ao chegar, as crianças e suas famílias passam por revisão médica e recebem o encaminhamento necessário, de acordo com cada caso. Profissionais de saúde de diversas formações atuam como voluntários: medicina, psicologia, fisioterapia, terapia ocupacional, farmácia. Há registro de pacientes que nunca haviam sido orientados sobre o autismo e estão tendo contato com especialistas, pela primeira vez, no abrigo.
A cozinha oferece todas as refeições e mantém disponibilidade permanente de lanches e café. Problemas como a seletividade alimentar severa são abordados no detalhe: se a criança come apenas a bolacha de determinada marca, o produto é comprado pela internet. Há iluminação reduzida no segundo andar e o esforço para manter um ambiente tranquilo, sem muito ruído.
— É um cuidado muito pontual. Cada criança tem um tablet para não perturbar o vizinho de colchão. Queriam nos doar uma TV, mas não posso botar uma TV que vai organizar uma criança e desorganizar outras oito — conta Debora.
Debora e Roberta coordenam os trabalhos indo diariamente ao abrigo. Uma nova unidade, bem mais ampla, deverá ser aberta nos próximos dias. O objetivo é manter o serviço por, pelo menos, seis meses.
— Me sinto absolutamente exausta e muito feliz. Determinadas situações emocionais, só a tragédia nos traz. Passo o dia abraçando pessoas que nunca vi. É um processo de muita criação de afeto. Criam-se muitos afetos a partir de uma tragédia. Isso é ímpar, é muito bonito de se ver — desabafa Debora.
O perfil do Instagram @somoscolodemae pode ser contatado para dúvidas, informações sobre disponibilidade de vagas, voluntariado e doações.