Com ocorrências nos últimos dias de agosto, no último fim de semana e previsão de novo registro nesta quarta-feira, a baixa maré na costa tem chamado a atenção em Santa Catarina, principalmente com o aparecimento da carcaça de uma embarcação naufragada há 63 anos no Pântano do Sul, em Florianópolis, e barcos encalhados na área continental da Capital e em outros pontos do litoral catarinense, como em Itajaí.
A professora dos cursos de Oceanografia, Engenharia Ambiental e Sanitária da Univali, Camila Burigo Marin, lembra que o fenômeno é uma conjunção da chamada maré astronômica – causada pela força gravitacional exercida pela lua nova e cheia – com a maré meteorológica, provocada pela ação dos ventos ou outros fenômenos naturais. Porém, nos registros recentes no litoral catarinense, o que tem chamado a atenção é a ocorrência do vento quadrante nordeste com forte intensidade e por muitos dias. "É atípico", segundo Camila. A lua cheia, prevista para começar na madrugada desta quarta-feira, tende a intensificar a maré seca, caso o vento na direção nordeste persista. Confira a entrevista:
Esse fenômeno está relacionado a que exatamente? Apenas a influencia da lua cheia e do vento?
Na verdade a gente ainda não está na lua cheia, mas na nova. Quando a gente tem a lua nova e a lua cheia, a gente tem as marés vivas, ou seja, a gente tem as maiores amplitudes de marés, as chamadas sizígias. Agora a gente está se encaminhando para a lua cheia, no dia 6 [quarta-feira]. O que acontece? Temos os maiores alcances da maré e os menores também. O que aconteceu em agosto e aconteceu agora também, é que quem está influenciando é o vento, não é a maré astronômica em si. O vento de Nordeste está persistindo há alguns dias. O vento está vindo praticamente em direção à costa e a água é toda deslocada para fora, em direção ao oceano. Geralmente, observa-se muito o contrário, o deslocamento para a costa. Daí a gente tem aqueles alagamentos, ressacas e etc. A maré meteorológica pode provocar os dois efeitos, de secar ou alagar, dependendo da direção do vento.
O que a gente via com mais frequência era alagar. Por quê?
Exatamente. O que está meio estranho é que está tendo muito vento de nordeste seguido. Esse vento é que está culminando com o aparecimento desse evento que a gente chama de maré meteorológica. Se tiver no dia 6 a lua cheia e continuar esse vento, vai secar mais ainda, chegará a níveis mais baixos naturalmente. O vento potencializa. Se o vento estivesse jogando água para a costa, iria alagar. Nesse caso, com vento nordeste jogando para o oceano, tende a secar ainda mais.
Como a lua influencia a maré?
O fenômeno de maré é ocasionado pela atração gravitacional que acontece entre o sistema terra, sol e lua. E outros astros também acabam influenciando. Mas como está mais perto da terra, a lua é a que mais influencia. Com a força de gravidade, acaba puxando todos os fluídos para o lado da lua.
Essa intensificação do fenômeno podem gerar impacto ambiental?
É um processo natural. Tem locais que estarão mais expostos a essa variação de maré. Os organismos que vivem nessas áreas de variação, que a gente chama de zona intermareal, eles já têm adaptações para conseguir viver nesse processo. Quando eles ficam expostos, podem ser mais impactados por sol, chuva. Mas os organismos que vivem nessa zona estão habituados e têm sistemas de defesa para se adaptar.
Que organismos são esses exatamente?
Todos os que vivem no costão, o mexilhão, todas as algas. Tem os que ficam fixos e os que conseguem ir nesse vai e vém.
Então apesar da surpresa, o fenômeno é natural?
É natural, o que está sendo diferente é que a gente está tendo muitos dias consecutivos com ventos no mesmo quadrante, de nordeste, que acaba provocando esse efeito no litoral de Santa Catarina por conta da configuração do nosso litoral. A posição do nosso litoral propicia que esses ventos façam isso.
O que tem motivado esse vento? Há hipóteses?
Meteorologicamente pode ter N motivos. É muito difícil dizer com certeza o que está acontecendo. Acho que a gente está tendo o final do El Niño. Como tem essa variação de El Niño e La Niña, você tem uma intensificação de certos ventos, de umidade, bastante chuva em alguns lugares, seca em outros.
Estamos vivendo um período de estiagem há dois meses no Estado, isso também impacta na maré?
A maré é um efeito totalmente astronômico. É o efeito mais previsível que a gente tem. A gente consegue fazer a previsão de maré para daqui a anos. O que pode variar esse nível da maré é a maré meteorológica por causa dos ventos. Os ventos é que podem afetar o nível em que a água está chegando. Existem locais que estão mais suscetíveis a isso e outros menos suscetíveis. O Sul do Brasil é totalmente suscetível à maré meteorológica.
Quando esse fenômeno foi registrado recentemente?
Assim tão baixa realmente não me lembro. Foi algo atípico neste ano.
Nesse período é necessário tomar uma cautela maior?
O vento normalmente provoca ondas muito grandes. Para gerar esses fenômenos, tanto as ondas grandes quantos as marés meteorológicas, a gente precisa de vento de grande intensidade e de grande duração. É isso que está sendo diferente. Porque vento nordeste a gente até tinha, mas vento nordeste tantos dias consecutivos e com a intensidade que está aparecendo, está meio atípico. O maior perigo realmente são as ondas. Com as marés, tem que cuidar para entrar e sair com embarcação de rio. A atividade portuária é prejudicada tanto pelo aumento excessivo, quanto pela baixa excessiva.