A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) alerta desde 2001 para a necessidade da criação de políticas públicas que previnam o bullying e a violência nas escolas brasileiras. Em pesquisa publicada naquele ano, 42% das crianças e adolescentes de Porto Alegre disseram que não conseguiam se concentrar nos estudos em razão da violência, 33% ficavam nervosos ou revoltados e 32% perdiam a vontade de ir à escola. Coordenadora da área de ciências humanas e sociais e representante interina do escritório da Unesco no Brasil, Marlova Jovchelovitch Noleto concedeu a seguinte entrevista a ZH:
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A Unesco tem acompanhado as situações de violência em escolas do Rio Grande do Sul?
Vi ações em governos anteriores (entre 2003 e 2011), quando tinha um comitê estadual de prevenção da violência. Fizemos o Escola Aberta, tivemos alguns programas com a prefeitura de Porto Alegre, e agora a Unesco voltou a falar com o prefeito Nelson Marchezan.
O que a Unesco entende por violência na escola?
Vai desde o entorno até a escola propriamente dita e engloba não só a violência física, mas também a psicológica, o abuso verbal, a violência sexual, o assédio, o bullying e o cyberbullying. É um tema complexo para não ser abordado nas suas múltiplas facetas. Noto ausência completa dos governos na questão da violência na escola.
Três casos recentes chamaram a atenção. Quando uma aluna de 15 anos foi assassinada, professores de uma escola de Porto Alegre disseram que nada tinham a ver com a vida dela e que os alunos estão acostumados à violência. O segundo episódio foi em escola vandalizada por alunos após episódios de violência no entorno. Professores queriam resolver o problema com cerca elétrica e vigilância. O último caso foi a morte de Marta. Como avalia o posicionamento das escolas?
Não resta dúvida, pelos três casos que acabaste de me descrever, que é fundamental trabalhar ações de políticas de prevenção à violência. Nós estamos falando de uma menina assassinada, aliás, de duas. Se tu olhares para o Brasil, esse cenário se repete em todos os Estados. Isso que estás descrevendo, que os professores parecem inertes, representa também uma banalização das situações de violência. Ninguém deve se acostumar com a violência. A escola precisa ser um lugar seguro e protegido para que a educação prospere.
Os professores estão despreparados para lidar com a violência?
Eu acho que não podemos generalizar. O que se vê é pouco investimento na capacitação. Em alguns programas que a Unesco desenvolveu em parceria com o Ministério da Educação, houve investimento, inclusive em Porto Alegre. Mas não teve continuidade, e sabemos que esses programas precisam ser permanentes. Estamos trabalhando com a Secretaria de Educação Continuada (órgão ligado ao MEC) para desenhar um novo programa de prevenção, que será lançado até o final do ano.