Quando a criança ultrapassa a "barreira dos cinco anos", vê "suas chances de ser adotada com valores próximos a zero", conforme a pesquisa Tempo dos processos relacionados à adoção no Brasil, publicada em junho pela Associação Brasileira de Jurimetria. Para resolver o problema de que a maioria dos pretendentes prefere crianças pequenas e a maioria dos aptos à adoção tem mais de seis anos, grupos de apoio se espalham pelo país para incentivar adoções tardias e de grupos de irmãos.
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Atualmente, há mais de 120 grupos ligados à Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), pelo menos quatro no Rio Grande do Sul. Morador de Farroupilha, o casal de empresários Denice, 47 anos, e Marcelo Mincarone, 50, participa do grupo DNA da Alma e decidiu habilitar-se à adoção para crianças de até 10 anos. A decisão foi tomada porque eles já tinham vivenciado as experiências da primeira infância com o filho biológico Gabriel, hoje com 14 anos.
Ingressaram no CNA em dezembro de 2013 e participaram de uma festa no abrigo onde Laiane, hoje com seis anos, morava. Extrovertida, a menina tratou logo de fazer amizade com Gabriel, em um encantamento mútuo.
- Dizíamos para ele: "Gabriel, estamos habilitados para adotar a Laiane, mas pode ser outra criança. Não sabemos qual filho virá para nós" - relembra Denice.
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Em uma articulação do destino para unir os irmãos, Laiane acabou sendo adotada pelo casal em outubro de 2014. Chegou chamando Gabriel de "mano" e afirma que será ciumenta com as futuras cunhadas. Sobre o que mais gostou na mudança, responde:
- Do mano, da mãe, do pai e da "zoiuda" da Meg (a gata da família).
Marcelo descreve a filha:
- A Laiane é um furacão. Apesar de ter sofrido negligência, é uma menina muito alegre, que se adaptou bem. Os habilitados não precisam ter medo da adoção tardia, pois o amor derruba qualquer barreira.
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Amigos de Lucas, da Capital, atua com busca ativa
Em Porto Alegre, o Instituto Amigos de Lucas também trabalha para incentivar adoções tardias, de irmãos e de crianças com problemas de saúde.
- Os grupos de apoio são muito importantes para que os pais conheçam a realidade da fila de adoção e possam ampliar seus perfis - afirma a presidente do grupo, Maria Rosi Marx Prigol.
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O Amigos de Lucas também atua com busca ativa, quando as comarcas entram em contato com grupos de apoio à adoção para procurar pretendentes que, embora cadastrados no CNA, não aparecem no sistema para determinada criança.
- Se tem um casal que procura adotar uma criança de até cinco anos, não aparecerá no CNA como candidato para um filho de cinco anos e três meses. É preciso entrar em contato com os casais, tirar o telefone do gancho. Há casais que estão tanto tempo na fila que aceitam crianças fora do perfil informado no CNA - completa Rosi.
OS CAMINHOS DA ADOÇÃO
Para os pais
1) Pessoas com mais de 18 anos estão aptas a adotar, independentemente do estado civil, desde que seja respeitada a diferença de 16 anos entre quem deseja adotar e a criança.
2) É preciso ir à Vara da Infância de sua comarca e fazer uma petição - preparada por um defensor público ou advogado particular - para dar início ao processo de inscrição para adoção.
3) Depois, é necessário passar por curso de preparação psicossocial e avaliação com entrevistas e visita domiciliar.
4) Durante a entrevista, o pretendente descreverá o perfil da criança que deseja adotar, podendo optar por etnia, sexo, idade, estado de saúde e se aceita irmãos.
5) A partir do laudo da equipe técnica da Vara e do parecer emitido pelo Ministério Público, o juiz dará sua sentença, e o pretendente poderá ser inserido no cadastro de adoção.
Para as crianças
1) Quando têm os direitos violados, as crianças e os adolescentes são encaminhados a abrigos por determinação judicial ou, em caráter de urgência, por requisição do Conselho Tutelar. No Brasil, a maioria é acolhida por ser vítima de maus-tratos e abuso sexual.
2) Conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os acolhidos devem permanecer, no máximo, por dois anos nos abrigos.
3) Neste período, a rede de proteção às crianças e aos adolescentes precisa trabalhar para que eles voltem para a família biológica ou sejam encaminhados à adoção.
4) Quando a opção é pela adoção, as crianças precisam ser destituídas do poder familiar, ação judicial encaminhada pelo Ministério Público para que os pais biológicos percam a ligação legal com as crianças. A ação precisa ser julgada em, no máximo, 120 dias, conforme a Lei da Adoção.
5) Após serem destituídas da família biológica, as crianças precisam ser incluídas, em até 48h, no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), para aguardar pretendentes a pais.
O encontro
1) A Vara da Infância deve entrar em contato com o pretendente quando houver uma criança com o perfil compatível, e ambos deverão passar por estágio de convivência monitorado pela Justiça e pela equipe técnica do abrigo.
2) Se o relacionamento correr bem, o pretendente deverá ajuizar a ação de adoção.
3) Ao entrar com o processo, o pretendente receberá a guarda provisória, que terá validade até a conclusão do processo, e a criança passará a morar com a família.
4) A equipe técnica continuará fazendo visitas periódicas e apresentará uma avaliação conclusiva para que o juiz confirme ou não a adoção.
5) A sentença a favor da adoção determinará que seja feito o novo registro de nascimento, já com o sobrenome da nova família, e a criança passará a ter todos os direitos de um filho biológico.
Fontes: Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e Lei 12.010 (Lei da Adoção).
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