A troca dos comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, na esteira da substituição do ministro da Defesa, não deveria ser motivo para qualquer brasileiro perder o sono, se vivêssemos em tempos normais. Se há temor de um “autogolpe”, ou de qualquer coisa parecida, é porque o presidente Jair Bolsonaro, em mais de um momento, usou o nome do Exército em vão e tentou envolver as Forças Armadas na sua política de confronto com governadores que adotam medidas restritivas para conter a disseminação do coronavírus.
A preocupação é com a tentativa de aprovação — às pressas — de projeto que permite a decretação de “mobilização nacional” nos casos de “situação de emergência de saúde pública de importância internacional decorrente de pandemia e de catástrofe natural de grandes proporções”. Pelo projeto, nesses casos as polícias estaduais ficariam subordinadas diretamente ao governo federal “para a manutenção da ordem pública e segurança interna nos Estados”. É aí que mora o perigo.
Por mais que os comandantes militares tranquilizem a população, garantindo que não há risco de ruptura institucional, manifestações pretéritas de Bolsonaro e de seus filhos são motivo de preocupação dentro e fora do Congresso. Em alguns momentos, os movimentos do presidente lembram o do falecido líder venezuelano Hugo Chávez, de quem em 1999, numa entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, o capitão se declarou admirador.
“Chávez é uma esperança para a América Latina e gostaria muito que essa filosofia chegasse ao Brasil. Acho ele ímpar e pretendo ir à Venezuela para tentar conhecê-lo”, disse Bolsonaro há 22 anos, quando era um simples deputado do baixo clero. E foi além: “Acho que ele (Chávez), vai fazer o que os militares fizeram no Brasil em 1964, com muito mais força. Só espero que a oposição não descambe para a guerrilha, como fez aqui”.
Ainda que nos últimos anos tenha usado a Venezuela como símbolo do que nenhum país deseja ser, Bolsonaro tem comportamentos autoritários que lembram não só o de Chávez como de seu sucessor, Nicolás Maduro, em sua ânsia de aniquilar a imprensa, desqualificar o Legislativo, atacar o Judiciário e usar as Forças Armadas para se perpetuar no poder.
A diferença é que, no Brasil, os comandantes militares mais graduados resistem a envolver as Forças Armadas em uma nova aventura autoritária. Foi por resistir ao uso político do Exército que o general Edson Pujol — um dos mais preparados da tropa — caiu em desgraça com Bolsonaro. O agora ex-ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva foi demitido por não querer entregar a cabeça de Pujol e por querer preservar a função institucional das Forças Armadas. General da reserva, o vice-presidente Hamilton Mourão foi taxativo quando questionado sobre a possibilidade de uma ruptura:
— Zero. Pode botar quem quiser, não tem ruptura institucional. As Forças Armadas vão se pautar pela legalidade, sempre.
Aliás
A tentativa de aprovar às pressas o projeto que trata da “mobilização nacional” fez soar o alerta no Congresso. Deputados e senadores não dão sinais de que estejam dispostos a dar cheque em branco para Jair Bolsonaro.
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