A primeira onda do tsunami anunciado – a delação premiada da cúpula da Odebrecht – provocou estragos nas estruturas do governo Michel Temer e atingiu os pilares da “ponte para o futuro”. A delação de Cláudio Melo Filho, ex-diretor de Relações Institucionais, é apenas o começo. São 77 executivos que esmiuçaram suas relações com políticos de diferentes partidos e detalharam um esquema complexo, porque mistura corrupção com doações legais e ilegais para campanhas. Separar uma coisa da outra é tarefa que exigirá milhares de horas de trabalho da Polícia Federal, do Ministério Público e do Judiciário.
O problema do presidente Michel Temer não é apenas ter sido citado como a pessoa que negociou com Marcelo Odebrecht uma doação de R$ 10 milhões para o PMDB, em jantar no Palácio do Jaburu. Desse total, R$ 6 milhões teriam sido repassados ao presidente da Fiesp, Paulo Skaf, e R$ 4 milhões entregues ao ministro Eliseu Padilha para distribuição entre candidatos do PMDB. Padilha nega ter recebido esse dinheiro, mas é sabido que, por sua proximidade com Temer, era a ele que companheiros em dificuldade acorriam em busca de socorro financeiro do diretório nacional do PMDB.
O que deve tirar o sono de Temer é a fragilização de seu governo a partir dessa delação apocalíptica, que começa a ser divulgada no momento em que sua popularidade atingiu o nível mais baixo desde a posse, de acordo com pesquisa do Datafolha. Amanhã, o Senado deve aprovar a PEC 55, que fixa o teto dos gastos, mas só produzirá os efeitos esperados pelo mercado se vier combinada com a reforma da Previdência. Em um Congresso ameaçado pela Lava-Jato, será difícil aprovar uma reforma tão necessária quanto impopular.
Uma frase de Melo Filho resume as relações promíscuas da Odebrecht com o Congresso: “O propósito da empresa era manter uma relação frequente de concessões financeiras e pedidos de apoio com esses políticos, em típica situação de privatização indevida de agentes políticos em favor de interesses empresariais nem sempre republicanos”.
ALIÁS: Os delatores nada têm a ganhar quando mentem. Pelo contrário, podem perder os benefícios do acordo. Logo, dizer que os delatores mentem é uma linha de defesa muito frágil.