É culpa minha também: só depois desses temporais é que a imprensa levanta o debate da fiação subterrânea. Aqui estou eu, escrevendo mais uma coluna sobre isso, mas, quando a luz voltar para todo mundo, a discussão será interrompida de novo. E vai retornar só na próxima chuvarada.
Você sabe: hoje falta luz porque a rede elétrica fica exposta e, como Porto Alegre é uma cidade muito arborizada – o que é ótimo –, a força do vento derruba os galhos, que caem sobre os fios, e os fios entram em curto. Com a fiação subterrânea, não teria nada disso.
O problema é que discutir esse assunto, em Porto Alegre, é dar murro em ponta de faca. Prefeitura e CEEE repetem sempre a mesma cantilena: enterrar tudo é caro demais, cada quilômetro custaria R$ 10 milhões, a conta de luz aumentaria etc etc etc. E nunca avança nada.
Por que não pode haver um planejamento? Sabemos que a cidade tem outras prioridades, mas é inexplicável que outras questões relevantes precisem arrancar essa da pauta. Até porque ninguém exige que a cidade inteira tenha cabeamento subterrâneo – seria completamente fora da realidade.
São Paulo, por exemplo, começou enterrando fios nas vias mais importantes, com alta densidade de carga. Ou seja, nos locais onde mais se consome energia elétrica: Avenida Rebouças, Nove de Julho, Oscar Freire, sempre em parceria com a iniciativa privada. Se Porto Alegre fizesse algo parecido, a frequência e a extensão dos apagões já reduziriam.
– Mas tem outro ponto que merece ainda mais atenção – diz o urbanista Anthony Ling, editor do site Caos Planejado.
Ele entende que, ao apontar a fiação subterrânea como única solução, a sociedade acaba aceitando a inércia das autoridades e a falta de ações a curto prazo. Segundo Anthony, basta olhar para cima para confirmar, nos postes de luz, o descaso com a infraestrutura atual da cidade.
– O que precisamos é de uma gestão eficiente, independentemente de os fios passarem por cima ou por baixo. Temos algum plano para evitar apagões com fiação aérea? Onde está o mapeamento das áreas de maior risco, um planejamento da arborização voltado para isso, um levantamento dos postes comprometidos? Talvez nem precise de fiação subterrânea se o sistema atual funcionar direito – acredita Anthony.