Dias atrás, vi o delegado gaúcho Andrei Augusto Passos Rodrigues, chefe da segurança de Luiz Inácio Lula da Silva assistir, em uma das tantas coletivas do governo de transição, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília, o ex-governador do Maranhão e senador eleito Flávio Dino dizer que a Polícia Federal (PF) não tem dinheiro sequer para pagar as diárias dos agentes que garantirão a posse, no dia 1º de janeiro.
Vivíamos o contingenciamento que obrigou a PF interromper a produção de passaportes. A fala de Dino, cotado para o Ministério da Justiça, escancarou um cenário devastador, que abrange também a Polícia Rodoviária Federal (PRF), no qual faltam recursos para abastecimento, manutenção de viaturas, diárias e passagens.
Fosse apenas as falas das coletivas no QG da transição poderíamos insinuar a catastrofisação de um contexto pelo olhar de quem se saiu vitorioso da eleição e que pretende ver o atual governo sangrar pelas próximos dias, até a transmissão de poder, marcada para as 15h do dia 1º.
Mas o que se vê, no apagar silencioso das luzes dos quatro anos de mandato de Jair Bolsonaro, é uma admissão de paralisia da máquina pública. Conforme o Relatório de Receitas e Despesas do Ministério da Economia, as pastas da Educação e da Saúde sofreram os maiores bloqueios do orçamento no quinto bimestre. Dos R$ 5,3 bilhões contingenciados, R$ 1,4 bi foram para a Educação - R$ 344 milhões para as universidades federais, muitas delas gaúchas - e R$ 1,3 bi para a Saúde. No ano, o maior bloqueio, R$ 3,9 bi, foi para o Ministério do Desenvolvimento Social.
O argumento é a necessidade de que as despesas não ultrapassem o teto de gastos. E, assim, seguem os bloqueios: Ministério da Defesa, R$ 559 milhões, Ciência e Tecnologia, R$ 379 milhões, e Infraestrutura, 349 milhões.
Por trás dos números, normalmente frios, há pessoas. E usemos o exemplo do Ensino Superior para ilustrar que os R$ 344 milhões, que, felizmente, o governo resolveu desbloquear nesta quinta-feira (1º) servem para pagar energia elétrica, bolsas de estudo e funcionários terceirizados, que, por exemplo, fazem a limpeza de salas e banheiros.
Estive também esta semana no Palácio Planalto - e a sensação é de ocaso, de "vamos terminar logo com isso". Se possível, acelerássemos os dias: o próprio Bolsonaro lamentou, recentemente, tempo longo entre o segundo turno e a posse. Ainda que tenha comparecido a seu local de trabalho poucas vezes desde a eleição, Bolsonaro não abandonou a política, ainda que se possa imaginar diante de seu silêncio. Participou ativamente das reuniões que levaram o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, a entrar com a ação no Superior Tribunal Eleitoral (TSE) argumentando supostos problemas nas urnas eletrônicas de 2020 para trás. Também tem trabalhado para evitar, agora que Arthur Lira está de braços com Lula, sua reeleição na presidência da Câmara. E, de birra, interrompeu o fluxo das verbas das emendas de relator - como um Vladimir Putin a fechar as torneiras do gás para a Europa.
PP e Republicanos abandonaram o PL em sua luta inglória e solitária contra o resultado das urnas. Pragmático e de olho no poder, Lira esta com Lula. O centrão migra para Lula. O PL está sozinho. Bolsonaro está sozinho.