O ministro das Relações Exteriores, Embaixador Mauro Vieira, realizará nesta quarta-feira sua primeira visita oficial à República Cooperativa da Guiana. Em Georgetown, será recebido pelo presidente David Granger e manterá reunião de trabalho com o chanceler Carl Greenidge.
Os temas da pauta, de acordo com o embaixador brasileiro, Lineu Pupo de Paula: infraestrutura, desenvolvimento na região de fronteira, cooperação técnica, cooperação militar e integração regional.
Em 2016, será comemorado o 50º aniversário da independência da Guiana.
Além de ser Estado associado ao Mercosul desde 2013, a Guiana é membro da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), da Comunidade de Estados Latino-Americanos e do Caribe (Celac) e da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
O comércio Brasil-Guiana registrou, em 2015, o valor de US$ 30 milhões, tendo crescido 78,5% nos últimos 10 anos. A comunidade brasileira na Guiana é estimada em cerca de 17 mil pessoas, a quarta maior na América do Sul, atrás apenas de Argentina, Paraguai e Bolívia.
Guiana e Brasil estabeleceram relações diplomáticas em 1968, e há importantes investimentos brasileiros em projetos auríferos no país caribenho.
Anteriormente conhecida pelo seu nome colonial Guiana Inglesa, a Guiana fica no norte da América do Sul. Limita-se com o Suriname a leste, Brasil ao sul e sudoeste, Venezuela a oeste, e com o oceano Atlântico ao norte.
Culturalmente, é parte do Caribe anglófono. Foi colônia holandesa e, subsequentemente, britânica. É o único Estado-membro da Commonwealth (Comunidade de Nações) situado na América do Sul, além de ser a única nação sul-americana a ter o inglês como idioma oficial.
Historicamente, a região onde fica" compreendeu a grande massa de terra no norte do rio Amazonas e leste do rio Orinoco, conhecida como a "terra de muitas águas". Ao longo da história, consistiu em três colônias holandesas: Essequibo, Demerara e Berbice. Com 215 000 km², a Guiana é o terceiro menor Estado independente no continente sul-americano, depois de Uruguai e Suriname.
A zona mais habitada é a faixa litorânea, constituída por um terreno plano, pantanoso e, em grande parte, posicionado abaixo do nível do mar. Para evitar inundações, foi construído um complexo sistema de diques e canais. O interior do país é ocupado pela densa floresta amazônica.
Disputa com a Venezuela
Em julho do ano passado, os presidentes da Guiana e da Venezuela discordaram, durante sessão plenária dos chefes de Estado do Mercosul, sobre o entendimento de cada um em relação aos conflitos territoriais entre os dois países. David Granger, fez um apelo ao bloco para que apoiasse a integridade do território guianense. Para Nicolás Maduro, da Venezuela, Granger é um "grande provocador" e não reconhece a ajuda que vem recebendo nos últimos anos.
A disputa quanto à posse das fronteiras marítimas entre Guiana e Venezuela é antiga. Em 1899, acordo decidiu que uma parte do território pertenceria à Grã-Bretanha, que antes controlava a então Guiana Inglesa. A Venezuela, no entanto, sempre considerou a região "em disputa". Durante sua declaração, o presidente da Guiana disse que em outubro de 2013 "nosso vizinho adentrou nossas fronteiras e expulsou" uma das embarcações do país.
Naquele período, uma companhia de petróleo dos EUA realizava estudos sísmicos, baseados em estimativas de que o local dispõe de bilhões de barris de petróleo. A Venezuela se baseia no Acordo de Genebra, de 1966 – logo após a independência da Guiana –, segundo o qual a região ainda está "por negociar".
- A Guiana aceita todas ideias de democracia e ordem social. Abraçamos o princípio de solidariedade regional. Portanto, no interesse de maior integração e no espirito de solidariedade, fazemos apelo para continuar vigiliantes e garantir soberania a pequenos países. As violações de fronteiras podem levar a conflitos. Quando são determinadas por acordos internacionais, outros estados podem se sentir compelidos a fazer isso - disse David Granger.
De acordo com o presidente da Guiana, há mais de cem anos as fronteiras foram marcadas e os mapas feitos com a demarcação que o "mundo inteiro reconhece". - Temos comprometimento e respeito mútuo entre territórios. Estamos comprometidos com as relações mútuas de paz, amizade e não interferência mútua - disse Granger, para quem, se essa vantagem estratégica for "obstruída", o país será "completamente" ignorado.
Ao falar antes de Granger, no encontro dos chefes de Estado do Mercosul, o presidente venezuelano, Nicolás Maduro celebrou o fato de que as duas nações vão se encontrar no fim de agosto, em Assunção, no Paraguai, para discutir o assunto. Após a cúpula, porém, em entrevista, Maduro subiu o tom.
- Lamentavelmente, (Granger) é um provocador. Sua única missão à frente da presidência da Guiana é provocar a Venezuela para um grande conflito. Não está governando a Guiana. Abandonou a Guiana. Por isso, a Guiana está com uma tremenda inundação e ele anda pelo mundo contra a Venezuela. Lamento pelo povo da Guiana, que é nosso irmão. Vai governar a Guiana, em vez de provocar, em vez de jogar pedra. Não critica o direito venezuelano, que é um país humanitário. Venezuela é o país que mais ajuda a Guiana em seu desenvolvimento nos últimos 10 anos, em toda sua história - disse Maduro.
Na ocasião, faltavam semanas para as eleições parlamentares venezuelanas. A leitura que se fez do episódio foi a de que Maduro tentava criar fatos capazes de unir os venezuelanos em torno de um inimigo comum. O mesmo foi feito, no ano passado, em relação à Colômbia, onde, conforme Maduro, eram preparados contrabandistas que iriam matá-lo. Estratégia antiga...
Entenda mais sobre a disputa
Em uma disputa que remonta mais de cem anos, a Venezuela insiste que é dona por direito de tudo a oeste do Essequibo, reivindicando quase dois terços do território da Guiana, incluindo Bartica. A disputa se acalorou depois que a Exxon Mobil, trabalhando para o governo guianense, anunciou a descoberta de uma grande reserva de petróleo em alto-mar além da costa do território disputado. Uma canção folclórica guianense diz o seguinte: "Não abrirei mão da montanha, não abrirei mão do mar, não abrirei mão do rio que me pertence".
A disputa data do século 19, quando a Guiana era uma colônia britânica e a Grã-Bretanha buscava expandir sua presença na América do Sul, fazendo reivindicações agressivas a respeito das fronteiras da colônia. A Venezuela fez objeção e buscou ajuda dos EUA, que recomendaram um painel de arbitragem.
O painel, então, reuniu-se em Paris, em 1899. Era composto de quatro juízes, dois britânicos e dois americanos, além de um diplomata russo que daria um quinto voto em caso de necessidade de desempate. Um ex-presidente americano, Benjamin Harrison, foi o principal advogado da Venezuela.
Quando o painel anunciou sua decisão, ela foi vista como altamente favorável à Grã-Bretanha, que ficou com quase todas as terras que buscava.
Esse pareceu ser o fim da controvérsia até 1949, quando a carta de um advogado americano que atuou no processo se tornou pública, afirmando que os juízes britânicos estavam em conluio com o diplomata russo para forçar um resultado favorável à Grã-Bretanha. As autoridades venezuelanas declararam inválida a decisão de 1899 e insistiram na devolução do território, uma exigência que persistiu após a Guiana ganhar a independência do Reino Unido em 1966.
A disputa entrou em uma fase furiosa nos últimos meses, tendo como pano de fundo o aprofundamento da crise econômica e política da Venezuela.