Um furacão tributário sacode a Argentina: o presidente Javier Milei acabou com o tradicional órgão arrecadador, a Administração Federal de Ingressos Públicos (Afip). Mas como nem um autoproclamado anarcocapitalista governa sem impostos, criou a Agência de Arrecadação e Controle Aduaneiro (Arca).
É como se, no Brasil, a Receita Federal fosse extinta e substituída por uma nova entidade, mais enxuta. Foi um "hasta la vista" ao sistema anterior do ministro de Desregulação e Transformação, Federico Sturzenegger: haverá redução de "uns 3 mil agentes".
A medida foi anunciada na segunda-feira (21) e está sendo detalhada por Sturzenegger nesta terça, depois que Milei anunciou uma fase de "deep motosiera", ou seja, cortes profundos na estrutura pública.
O plano é reduzir em 45% os cargos superiores e em 31% os níveis básicos, o que representa eliminação de 34% da estrutura atual. O governo argentino projeta economia anual de US$ 6,5 milhões.
Mas a "deep motossera" não corta só empregos e salários públicos. Inclui uma medida ambicionada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad: vários tratamentos especiais - parte do chamado "custo tributário" - serão eliminados.
No pacote, foram revogadas duas normas de exportação e importação: uma que obrigava a presença de representantes do fisco na alfândega e outra que criou o mecanismo de "valor de referência" , segundo Sturzenegger um "engendro (aberração) kirchnerista fonte de burocracia e corrupção".
Um decreto publicado nesta terça-feira (22) determina que benefícios fiscais para os clubes de futebol serão extintos em seis meses. A medida foi tomada depois de o governo Milei tentar, sem sucesso, impedir a reeleição do presidente da Associação de Futebol Argentino (AFA), Claudio "Chiqui" Tapia.
Outro benefício fiscal cortado é a isenção de IVA para jornais, revistas e outras publicações periódicas, incluindo assinaturas de edições jornalísticas digitais. O novo chefe da Direção Geral de Impostos (DGI), um dos cargos mais importantes da Arca, é Andrés Vázquez, um ex-kirchnerista que, em 2009, liderou uma pouco usual operação de fiscalização no Clarín, um dos maiores grupos de comunicação da Argentina, na época bastante crítico à administração de Cristina Kirchner.
Enquanto essas medidas estão sendo anunciadas, grupos de inquilinos advertem para o aumento da inadimplência nos aluguéis e nos despejos judiciais, porque o impacto dessa despesa no orçamento familiar seria "o mais alto da história". Alertaram, ainda, para o risco de que isso possa ser o início de uma profunda crise habitacional e social.