Presidente da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs) há menos de um mês, Gilberto Porcello Petry surpreendeu seus colegas na primeira reunião da nova gestão ao propor que se identificassem e dissessem o que cada empresa produz. A ideia era permitir eventuais negócios entre os presentes. O pragmatismo é a característica mais evidente do empresário, que enfrentou a crise em um segmento muito afetado, o de bens de capital. Diretor-presidente da Weco, Petry tem um mantra:
– Vamos tirar pedido.
Embora avalie que o presidente Michel Temer "está garantido até o final de seu mandato", reforça o coro empresarial contra os ensaios de aumento de tributos:
– A população, pessoas físicas e jurídicas, não suporta mais impostos.
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Uma de suas primeiras atitudes na presidência da Fiergs foi pedir reforma política. Como entidades empresariais podem contribuir?
É impossível governar um país com 35 partidos registrados no TSE, dos quais 28 têm assento no Congresso. Não podem existir 35 ideologias que justifiquem a existência de um partido. O que acaba acontecendo é a coalizão, que termina sendo negociação de favores. O presidente, para conseguir apoio, em qualquer nível, tem de fazer favores e cedências que muitas vezes não se coadunam com as necessidades de gestão. Essa questão agora do rombo fiscal que o governo alardeia é resultado da abertura que tentam fazer por conta dos últimos acontecimentos. Entidades empresariais querem que haja essa reforma política.
Até agora, o único encaminhamento é a criação de um fundo com R$3,5 bilhões...
Não tem sentido em criar isso. É um excesso quando os partidos pedem criação de fundo ao mesmo tempo em que o governo fala em aumento de impostos. A população, pessoas físicas e jurídicas, não suporta mais impostos.
Como a intenção de tributar dividendos impacta as empresas?
Tributar dividendos é um absurdo, porque as empresas já pagam Imposto de Renda para distribuir dividendos. Agora querem que pague o IR para, depois, tributar de novo o dividendo. É bitributação, não pode. Seria questionado judicialmente, porque as empresas, para dar o dividendo, precisam ter resultado. Quando têm lucro, pagam o imposto e depois, do que sobra no líquido, distribuem entre acionistas, ou seja, já foi pago o imposto e querem cobrar de novo.
Como é possível evitar?
Há programas que, daqui a pouco, terão de ser reduzidos. Tem muita distribuição de benesses sem contrapartida. Vale disso, vale daquilo, bolsa disso, bolsa daquilo, auxílio comida, auxílio moradia. Vai precisar reduzir, senão fica difícil sobrecarregar quem está produzindo. As grandes despesas das empresas, nos balanços, são juros e impostos. O custo de produção, os salários, já não são os primeiros itens. A carga tributária do Brasil é de quase 40%. Os Estados Unidos, com carga de 25%, dão muito mais em troca. O nível do Brasil é quase igual ao de Suécia, Inglaterra, Dinamarca, onde não há gastos extras com segurança, plano de saúde, escola. Isso faz com que a carga efetiva de desembolso seja maior do que é a divulgada. Esses gastos não entram no cálculo da carga tributária, têm de ser supridos pela população, pelo Estado.
Uma das "bolsas" que é alvo de críticos no Brasil é a chamada bolsa empresário. Também tem de ser revista?
O que se chama de bolsa empresário é o dinheiro dado pelo BNDES para financiamento de atividades. A "bolsa" é a diferença entre o que o Tesouro Nacional paga para captar dinheiro no mercado e o que é cobrado das empresas. Isso funcionou no Programa de Sustentação do Investimento (PSI), quando o governo Dilma criou uma linha para que houvesse maior demanda por máquinas, caminhões, ônibus, com juro de 4,5% ao ano quando a captação ocorria de 6,5% a 9,5%. Essa bolsa é relativa. No Bolsa Família, você dá o dinheiro e terminou. Nesse, uma empresa vai aumentar a produção e gerar imposto com o aumento de produção. Pode gerar novos impostos e novos empregos.
A Fiergs já se posicionou contra a substituição da TJLP pela TLP, que a equipe econômica defende como forma de eliminar subsídios.
Não está mais subsidiado. A TJLP é mais baixa do que as taxas de mercado, porque os bancos só financiam no curto prazo. O problema é que não há alternativa para financiamento de longo prazo. Para poder executar seu projeto de financiamento, o governo Dilma teve de transferir R$ 500 bilhões do Tesouro para o BNDES. Isso não ocorre mais. Em todo o mundo, bancos internacionais financiam investimentos. Aqui, os bancos privados exigem garantias em uma proporção que é quase o dobro do valor do empréstimo. Já foi de 130%, hoje é de 180%. Dizem que debênture é uma alternativa, mas nem todos têm oportunidade de lançar esse tipo de papel.
Há chance de tirar a reforma tributária do papel, como acena o governo?
Vai ser difícil. Vai voltar a discussão se imposto tem de ser pago na origem ou no consumo. Nos Estados Unidos, é no consumo, mas aqui São Paulo produz um terço do total, mas não consome o equivalente, então vai trancar. Quem pode perder vai ser contra.
E uma simplificação é possível?
Dá para fazer algo nesse sentido, simplificar. Tem muita portaria, muito regramento, que consome muito tempo estudando. Empresas gastam muito tempo e dinheiro. Uma simplificação de tributos seria muito bem-vinda.
Há sinais de reação na economia?
A crise começou em maio/junho de 2014. A (então presidente) Dilma disse que seria transitório, que depois da Copa ia mudar, mas não mudou nada. Agora com o presidente Temer garantido até o final de seu mandato, o país está institucionalmente mais equilibrado. Presidente não se troca a cada 60 dias, é traumático. Há possibilidade de reação.
É possível projetar que Temer esteja "garantido"?
Ficou claro que, mesmo se houver outra denúncia, o presidente só pode ser julgado no STF com aprovação do Legislativo. E qualquer nova medida que venha teria o mesmo resultado, a menos que seja algo muito grave.
As federações industriais estão mobilizadas para garantir conteúdo local no setor de óleo e gás. Isso ainda é possível?
É preciso garantir algum nível de conteúdo local, porque essa foi maneira que a Noruega encontrou para garantir o desenvolvimento de sua indústria. Não é necessário chegar a 65%, como antes, mas também não podem começar a surgir subterfúgios, como incluir propaganda como conteúdo local.
A ampliação da GM no Estado pode ser um sinal de virada?
Companhias de grande porte, como a GM, definem que vão produzir um carro ou outro com muita antecedência. Essa unidade de Gravataí é considerada a mais moderna e eficiente do mundo, então faz sentido concentrar a produção ali. A ampliação tem força para atrair fornecedores. Tivemos há pouco consultadas de um interessado, que queria saber que linhas de crédito poderia conseguir aqui.
Que característica quer dar a sua gestão na Fiergs?
O que tem de ser valorizado é o empresário industrial, que arrisca seu patrimônio para colocar um negócio. É criticado por visar só o lucro, mas se não tem lucro, fecha a empresa. A gente vê pouco essa valorização aqui, mas vê no Japão, na Alemanha, nos EUA.
Era um cargo que ambicionava há tempo?
Há muito tempo companheiros diziam que deveria oferecer meu nome. Em duas oportunidades anteriores, meu nome foi foi falado. Na mais recente, como vi que a casa (a Fiergs) ia rachar, concordei em nome da unidade. Neste ano, disseram que era a minha vez, tanto que não tive voto contrário. Mas não quero dar a impressão de que estava louco para presidir a Fiergs.
É fato que na primeira reunião o senhor propôs uma rodada de negociação entre os presentes?
Foi um pouco diferente. Pedi que todos apresentassem sua empresa e o que faz. A Fiergs também é um fórum de negócios. A gente passa muito tempo aqui e às vezes, em três anos, não fica sabendo o que o outro fazia. Saber o que uns e outros fazem ajuda a propiciar negócios. Fico muito feliz que as pessoas reconheçam isso. Um rapaz encontrou meu filho e contou que fiz algo que ninguém fez. A gente conversa, discute os problemas do país, mas também faz negócios. Vamos tirar pedido.