O cinema americano nos acostumou mal. Bastou a primeira briga no pátio da escola para descobrirmos que soco de verdade não era como soco em filme. Não produzia o mesmo som e a mão de quem batia sofria tanto quanto a cara de quem apanhava. Das brigas a soco do cinema, aquelas de demolir saloon, ninguém saía com mais do que alguns hematomas, que duas cenas depois já tinham desaparecido, e os punhos ficavam intactos. Nunca se viu uma luxação em filme americano. Outra convenção do cinema desmentida pela realidade era de que um golpe atrás da cabeça nocauteava qualquer um. Não falhava. Pop, e o cara ficava inconsciente pelo tempo necessário. Todo mundo sabia exatamente onde,
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Mas a expectativa mais irreal que o cinema americano nos legou foi a da Justiça rápida. Não nos conformamos com a ideia de que o julgamento e a sentença não sigam o crime com a rapidez que se vê nos filmes e atribuímos a demora à nossa condição de povo atrasado, dado a formalismos anacrônicos que a diferença entre um paramentado tribunal brasileiro e um despojado tribunal americano – ou pelo menos um tribunal americano de cinema – só acentua.
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A impaciência com a morosidade da Justiça é compreensível, mas nem sempre é cabível. A demora não é uma peculiaridade brasileira, e é antiga. Hamlet, no seu famoso solilóquio, já listava, entre as razões para se suicidar, "the law's delay", as delongas da lei. E as instâncias e as idas e vindas de um processo judicial existem para prevenir o erro, proteger do arbítrio e garantir os direitos de todos até o último recurso – pelo menos em tese –, por mais que exasperem, a nós e ao Hamlet, e por mais que favoreçam firulas de advogado e a absolvição pelo esquecimento. E, se serve de consolo: a Justiça americana, além de também não ser de cinema, peca tanto pela ausência de instâncias e trâmites quanto a nossa pelo excesso. Com o agravante de que lá erros judiciais muitas vezes não recorridos podem resultar em sentenças de morte.
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Enfim, há delongas e delongas. São sintomas de um sistema judicial esclerosado, mas também é o que nos protege de uma Justiça, digamos, cinematográfica demais. Talvez a impaciência com a demora do processo judicial no Brasil tenha se agravado com o novo protagonismo do Supremo, instigado a se agilizar para acompanhar o açodamento da Lava-Jato e da Polícia Federal e não perder sua relevância no vertiginoso jogo político brasileiro.
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Já temos o nosso justiceiro galã, o Moro, falta americanizar o resto.