Ele tinha 65 anos e um dia surpreendeu a todos com a informação de que estava, finalmente, conseguindo falar com seu pai. Ninguém imaginava que ele ainda tivesse pai. Alguns chegaram a pensar que o contato se dera numa sessão espírita. Mas não, o pai estava vivo. Casara-se cedo, tinha vinte e poucos anos quando o filho nasceu. Por isso mesmo, nunca haviam se entendido muito bem. Não tinham interesses em comum.
Não tinham assunto.
*
Na política, eram opostos. O pai reacionário e o filho progressista.
As poucas vezes em que falavam de política, sempre acabavam da mesma maneira.
– Vá viver em Cuba – dizia o velho para o filho.
E este:
– Vá viver no século 19.
Depois passavam semanas sem nem se olharem.
*
Mas agora tinham assunto.
– Estou podendo, finalmente, falar com meu o meu pai.
– Sobre o que vocês conversam?
– Remédios.
Comparavam tratamentos.
– Qual é o seu betabloqueador?
– Está tomando o que para o colesterol?
– Experimenta este.
Trocavam hemogramas.
– Sua glicose está melhor do que a minha!
*
E o filho contou que era comum ir à farmácia com o pai, de braços dados.
*
MÃE
Ela contou que o conselho que recebeu da sua mãe, quando se casou, foi "Não seja inteligente demais, minha filha. Disfarce".
E contou que a mãe lhe dissera que devia o sucesso do seu casamento a uma frase.
– Que frase, mamãe?
– "Não tenho cabeça para essas coisas complicadas, mas..."
A mãe usava a frase como preâmbulo sempre que precisava dizer ao marido o que ele deveria fazer.
Segundo a mãe, para um casamento feliz, preâmbulo é tudo.