A colega Adriana Irion expõe na edição desta quarta-feira (3) de GZH uma situação que ajuda a explicar porque muitas mulheres relutam em denunciar violências que sofrem. Por falta de policiais disponíveis para atendimento, vítimas que batem na porta do plantão da 1ªDelegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), em Porto Alegre, voltam para casa sem conseguir registrar suas queixas. Desistem após espera de horas.
É preciso se colocar no lugar dessas mulheres. Como em todo tipo de constrangimento íntimo, é difícil para a maioria delas tomar a decisão de denunciar o companheiro ou familiar que as agrediu. Via de regra fazem isso como última opção, após diálogos infrutíferos, tentativas de conciliação, medidas por parentes ou amigos. Afinal, são sonhos rompidos, ilusões perdidas. Algumas jamais denunciam, até por medo.
Aí a mulher finalmente decide registrar queixa - e dá de cara com a burocracia de uma repartição policial cheia de serviço e poucos funcionários, incapaz de atender à demanda. Acrescenta-se a isso problemas no funcionamento de banheiros da delegacia, falta de papel higiênico, impressoras estragadas e falta de água para as vítimas. Está pronta a receita para a falha na rede de proteção.
A situação vem se somar a outro obstáculo crônico: o das mulheres que, mesmo tendo recebido medida protetiva contra seus agressores, são agredidas e até mortas, como denunciado pela colega Letícia Mendes no ano passado. A falta de fiscalização contribui para esse fenômeno.
Óbvio que a carência de agentes é problema crônico e não se limita ao setor de atendimento à mulher. Óbvio que o governo estadual não deseja isso. Óbvio que fará esforços para solucionar o problema. Só que serviço público é fazer escolhas de Sofia. Priorizar. Elencar. E o Rio Grande do Sul há muito exibe bons indicadores na prevenção dos feminicídios, seja por parte da BM ou da Polícia Civil. Importante não deixar a situação desandar.
A promessa de criar uma segunda Deam continua no papel. Estava anunciada para maio de 2023. Agora o novo anúncio é de que fica para o segundo semestre de 2024. Que pelo menos designem mais servidores para a delegacia já existente. As vítimas merecem e anseiam por isso.