São tempos sangrentos no interior do Rio Grande do Sul. Na praia de Magistério, município de Balneário Pinhal, três homens foram mortos a tiros na madrugada de quarta-feira (14), por um grupo de pessoas que se passaram por policiais. Em Santa Maria, no mesmo dia, três homens e uma mulher foram assassinados, em locais diferentes, no episódio mais violento de 2024. Em Caxias do Sul, quatro pessoas foram mortas desde o início da semana. Em contrapartida, Porto Alegre vive um fevereiro de relativa calmaria, apesar de que no Rio Grande do Sul o aumento nas mortes foi de 15%.
Quais as explicações para essa mudança de padrão, já que a Capital costuma concentrar a maioria dos homicídios? Uma delas é sazonal. Assim como os banhistas, os criminosos e os homicídios também migram no verão. Quadrilhas da Região Metropolitana costumam se mudar, levando até a família junto para o litoral. Por trás disso está a lógica do mercado: ganhar dinheiro com a venda de drogas para o turista que está nas praias.
Esse empreendimento econômico embute a necessidade de montar bocas de fumo, preparar logística de receptação da droga e fornecimento no varejo e conhecer a área. As facções fazem isso e, vez que outra, se estranham na disputa pelos melhores locais de venda. No caso de Magistério, por exemplo, investigações policiais indicam que os homens teriam sido mortos por vingança de uma facção de Porto Alegre. A residência já tinha funcionado como ponto de drogas, anos atrás.
É um problema que se repete a cada verão. Em 2015, seis homens foram mortos numa pousada em Cidreira. A polícia concluiu que se tratava de disputa por ponto de drogas e prendeu os assassinos, que foram condenados a dezenas de anos de prisão. Em 2019, cinco pessoas foram mortas numa danceteria em Mostardas e outras quatro ficaram feridas. A facção que fez a chacina assumiu o crime, em vídeo divulgado nas redes sociais. Foi um ataque terrorista contra clientes inocentes da boate, motivado por represália dos bandidos contra a direção do estabelecimento, que se recusava a colaborar financeiramente com os criminosos.
Se no litoral o problema dos homicídios é sazonal, nas demais partes do Interior já foi incorporado à rotina. A região de Caxias do Sul vive uma disputa permanente entre três grandes facções da Grande Porto Alegre, que fundaram núcleos na Serra. Elas eliminaram parte das quadrilhas independentes e agora disputam o controle do varejo das drogas. Em grande parte dos casos, os matadores saem da Grande Porto Alegre para aniquilar inimigos (a mando de seus chefes na Região Metropolitana) e retornam para a metrópole. Nem moram na área serrana. Em outros casos, estão radicados lá, verdadeiras franquias das facções da Capital e Vale do Sinos.
Além de sofrer do mesmo problema que Caxias do Sul, Santa Maria conta com um agravante: fora as três facções metropolitanas, a cidade tem pelo menos outras quatro facções nativas. São quadrilhas que atuam em poucos bairros, divididas por regiões e até ruas, explica o chefe da Delegacia Regional da Polícia Civil santa-mariense, delegado Sandro Meinertz. A cidade da Região Central, assim como Caxias, sempre foi polo de atração de migrantes e, em consequência, de criminosos. O aperto dos policiais sobre as disputas na Capital faz com que, inclusive, alguns criminosos notórios que atuavam na Região Metropolitana tenham espalhado tentáculos por Santa Maria.
Como se vê, não é simples explicar os surtos de assassinatos. Mais difícil ainda é elucidá-los e prender os responsáveis. Menos mal que os indicadores de homicídio no Estado vêm caindo ano a ano, graças aos esforços da Brigada Militar e da Polícia Civil.