A cada colheita da maçã, Vacaria recebe até 12 mil trabalhadores em busca de oportunidades nos primeiros meses do ano. Grande parte dos safristas são da região da Fronteira e das Missões, porém, há pessoas de outros estados brasileiros que viajam dias para aproveitar a época na serra gaúcha.
— Saio de Alagoas, atravesso o estado da Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, pra chegar até aqui. Quatro dias na estrada. Só faz três paradas para café, almoço, jantar e banho, nesses intervalos, e de resto é só viagem — conta Josivan Vieira, natural de Poço das Trincheiras e que percorre cerca de 3,3 mil quilômetros.
A colheita atrai safristas por conta do restaurante e alojamento que são fornecidos em propriedades da região; a maçã ajuda no sustento de Josivan e sua família durante o ano.
— Quando termina a colheita, a gente volta, é perto do inverno. Plantamos as lavouras lá, milho e feijão. Passado isso, acabam os trabalhos. Lá pelo mês de setembro e outubro, estamos todos desempregados. Aí ficamos no aguardo de que as fazendas em que trabalhamos no ano anterior chamem de novo para fazermos outra colheita, e ganhar um dinheirinho para que, nesses tempos em que passamos lá, possamos ir sobrevivendo — conta.
Os pais de Josivan e a esposa ficam em Alagoas. Os filhos — já adultos — também viajam para trabalhar nas lavouras de maçã. Esse é o segundo ano do trabalhador no sul do país.
— Nos finais de semana e dias que não tem trabalho, a gente sai pra dar uma volta nas cidades, conhecer as culturas. Que são diferentes das da gente lá, dá pra conhecer os locais diferentes e passear um pouco né, tirar o stress — relata.
Alguns trabalhadores passam anos longe da terra natal, em diferentes partes do país. José Auristano Nascimento dos Reis é um deles. O natural de Feira de Santana, na Bahia, quando não está na colheita da maçã, aproveita as lavouras de laranja em São Paulo.
— Pegamos lá em junho e vai até dia 15 de janeiro, por aí. Termina a colheita da laranja lá, a gente já fica entrando em contato pra poder vir pra cá. Quando termina lá, a gente já vem pra cá. Aí, depois, voltamos pra São Paulo, ficamos ligando pra tentar arrumar outra turma para poder trabalhar lá — afirma.
José Auristano já contabiliza quatro anos fora de casa. A esposa e a filha moram em São Paulo, os pais moram na Bahia e junto com ele, em Vacaria, veio um irmão para trabalhar na colheita.
— Olha, rapaz, faz quatro anos que não vou em casa. Tenho vontade de voltar, mas agora não. Deixa eu ficar um pouco mais velho pra poder já ficar lá de vez. Quem sabe uma aposentadoria... porque agora lá não dá. Não tem rendimento, não tem serviço. Pra ir pra lá e ficar só olhando para o ar seco que tem lá, não compensa. Temos que ficar andando assim, no Sul, que é melhor — explica.
O proprietário da lavoura onde esses trabalhadores estão alojados, José Sozo, diz que paga mais do que os safristas ganham em outras colheitas. Isso porque a retirada da maçã exige maior cuidado.
— Aí, quando chegaram aqui, eu dizia: "ó, calma pessoal, que a maçã está de primeira no pé e tem que chegar na mesa do consumidor de primeira qualidade também". Eventualmente, tem maçã que vai para suco, é separada do pé, nas câmaras, e vai para classificação. Então, eles se integram, aprendem e contribuem — avalia.
Rotina no pomar
Em outra propriedade, a de Eliseu Zardo Boeno, cada trabalhador colhe, em média, quase duas toneladas de maçã por dia. Isso porque, conforme ele, oferece um extra por produtividade e o horário pode ser estendido.
Cada safrista leva no ombro uma sacola com aproximadamente 10kg da fruta. A pé, percorre as macieiras e por vezes usa uma escada. Tira as frutas com a mão, deposita na sacola e, quando ela está cheia, retorna até uma caixa (chamada de bin) que fica no reboque de um trator próximo, entre as macieiras, onde deposita as frutas. O número médio de "viagens" que o trabalhador faz é de 200 por dia.
Junto aos bins, ficam trabalhadores que fazem a classificagem. Isto é, separam as maçãs boas para venda.
A cada quatro bins estão cheios, com 330 kg cada, eles são transportados por um trator até uma área de carregamento. Uma empilhadeira, então, coloca os bins sobre uma plataforma em cima de um caminhão, que transporta as maçãs a um centro de distribuição.
São cerca de 10 distribuidoras em Vacaria. Esses centros, que também têm câmaras frias para armazenar as frutas, vendem aos mercados e supermercados.
Período de Colheita
Vacaria é o município que mais produz maçã no Estado e um dos maiores do país. Neste ano, a safra no RS está prevista para cerca de 430 mil toneladas, segundo Boeno, que também é presidente da Associação Gaúcha dos Produtores de Maçã.
Rio Grande do Sul e Santa Catarina têm volumes próximos de produção e respondem juntos por 90% da maçã colhida no país. O restante está no Paraná.
A colheita da fruta em Vacaria começa em dezembro com a variedade precoce Eva, mas o grande volume é a partir da segunda metade de janeiro com a Gala, que termina em março. Cerca de 95% dessa variedade já foi colhida neste ano.
A colheita da Fuji começa em abril e vai até maio. Depois disso, fica apenas uma parte pequena de maçãs de variedade tardia, como a Pinky Lady, que são colhidas até o fim de maio.