A atmosfera pacata de cidade do interior contrasta com a realidade das últimas horas em Araricá, município de cerca de 5 mil habitantes, a 70 quilômetros de Porto Alegre. Em uma das diversas vias de casas térreas enfileiradas, onde a circulação de carros é tão baixa que os cachorros dormem no meio da rua, o silêncio usual foi rompido por uma saraivada de tiros que resultou na morte do casal Adair da Silva, 31 anos, e Karuel Barbosa, 25 anos, na noite de quinta-feira (5). A polícia investiga as causa do crime, que é tratado como uma execução.
A tragédia de cidade grande — foram, pelo menos, 79 disparos — ainda reverberava entre os moradores do município no fim da manhã desta sexta-feira.
— Para uma cidade pequena, é um abalo, né. É coisa que só se vê em cidades maiores — observa o funcionário público Elbio Farias, 48 anos.
Morador de uma casa em frente ao condomínio onde ocorreu o crime — o único de sobrados na Rua Emilio Jung, no Centro — conta que sua filha ouviu disparos por volta das 22h30min. Quando saiu para ver do que se tratava, viu apenas o rastro de um carro que deixou a via cantando pneu.
Os criminosos — pelo menos quatro, segundo a polícia —, tinham chegado poucos minutos antes. Pularam a grade do condomínio e arrombaram a porta da casa onde Adair e a namorada, Karuel, jogavam videogame no sofá. Em menos de cinco minutos, os dois haviam sido alvejados, e o grupo deixava a via.
No condomínio onde morava uma das vítimas, isolado pela polícia na noite de quinta-feira, restavam as marcas dos disparos em uma das paredes externas. Pelo menos cinco cartuchos de munição estavam espalhados pela via.
Foram disparos de quatro armas diferentes, entre elas um fuzil, segundo identificou a polícia. A brutalidade do crime chegou a confundir a moradora de uma casa vizinha, que não quis se identificar. Ao ouvir os tiros sucessivos, imaginou tratarem-se de disparos de metralhadora:
— Foi muito alto. Desesperador. Dava para ver que era uma arma grande — diz a mulher, que levou o filho pequeno para um quarto dos fundos da casa no momento do crime.
Em mais de três décadas de Araricá, a mulher relata nunca ter visto nada semelhante na cidade. Também não viu qualquer manifestação suspeita da parte do vizinho, que morava no local há cerca de três anos, e conhecia apenas de vista.
Silva, que nos últimos meses planejava abrir um atacado de roupas, já foi preso por porte ilegal de arma de uso restrito. A polícia investiga, agora, se o crime pode ter sido motivado por algum tipo de envolvimento com o tráfico de drogas. Karuel, que trabalhava como garçonete em um restaurante de Campo Bom e também atuava como modelo, não tinha antecedentes criminais.