"Doutora, levei um susto enorme nesta semana. Meu filho engasgou feio, chegou a ficar cianótico (roxo por insuficiência respiratória). Ainda bem que meu marido tinha feito treinamento de socorrista e conseguiu fazer que o pedaço de pão ser eliminado."
Esta e outras histórias semelhantes acontecem no dia a dia de quem tem filho ou é cuidador de crianças pequenas. A Academia Americana de Pediatria (AAP) publicou em 2010 que, a cada cinco dias, morre uma criança por engasgo com alimento nos Estados Unidos. As estatísticas são semelhantes ao redor do mundo. Aproximadamente 80% dos episódios na infância acontecem em crianças menores de três anos, com o pico de incidência entre um e dois anos. Nesta idade, a maioria das crianças consegue se locomover e utiliza a via oral para melhor exploração do seu mundo. Tem habilidade fina para pegar alimentos e pequenos objetos e levá-los à boca, mas ainda não tem os dentes molares para mastigar. Além disso, a via respiratória tem menor diâmetro nos pequenos, o que contribui para este tipo de acidente.
De longe, os objetos aspirados com maior frequência são alimentos. Assim, pedaço de fruta, bala, salsicha, uva inteira e amendoim são os campeões no risco para as crianças. Tamanho, formato e consistência têm importância. No grupo não alimentar: moedas, botões, balões de látex e partes de brinquedos são frequentes. Mas na eventualidade de engasgo, como proceder?
Em primeiro lugar, se a criança está com dificuldade para respirar, mas está tossindo forte e se esforçando para expelir o corpo estranho, não interfira. Provavelmente a obstrução é leve e a tosse é mais eficaz para expulsar do que qualquer manobra. Mas se ela não consegue respirar, não faz som, tem tosse fraca e está ficando pálida ou com lábios arroxeados, é hora de ação imediata, porque a obstrução é completa. Peça para alguém ligar para o 193 pedindo ajuda especializada e atue.
Se tiver menos de um ano, vire o corpo do bebê sobre sua coxa, com a cabeça rebaixada e aplique tapas nas costas. Repita cinco vezes. Se não adiantar, vire o bebê e aplique cinco compressões no tórax. Repita os ciclos até que expulse o corpo estranho.
Se for maior de um ano, posicione-se atrás da criança, abraçando o tórax, coloque sua mão fechada, com o polegar virado para cima, logo abaixo do osso do peito. Segure este punho com a outra mão e aplique compressões bruscas para dentro e para cima até expelir o corpo estranho. Esta manobra força o diafragma para cima, aumentando a pressão intratorácica e intratraqueal, fazendo expelir o corpo estranho.
Se não adiantar, abra a cavidade oral e veja se enxerga o objeto. Se for visível, retire com dois dedos em pinça. Mas atenção: não se recomenda tentar tirar o corpo estranho com os dedos se não estiver visível. Pode dificultar ainda mais a expulsão. Retorne às manobras até a expulsão ou chegada do Samu.
Estas ações têm sido valiosas em salvar vidas e podem ser aplicadas por qualquer pessoa que tenha aprendido a técnica. Recomenda-se que pais, professores e cuidadores conheçam e aprendam. Em alguns países, o treinamento é obrigatório para professores e babás. Mesmo assim, a prevenção é fundamental.
Lembretes
- O engasgo pode acontecer mesmo com líquidos, nos bebês. Neste caso, aspire as narinas com a boca.
- A introdução de alimentos (a partir do sexto mês) deve acontecer de modo gradual, amassados (frutas raspadas).
- Ensine a sentar-se durante as refeições.
- Alerte irmãos sobre colocar alimentos ou objetos na boca dos menores.
- Segundo a AAP, os objetos são considerados com risco de aspiração se tiverem diâmetro menor do que 4,4cm.
- Leve para avaliação médica mesmo tendo resolvido o engasgo.
Fonte: Academia Americana de Pediatria (AAP)