O Ministério da Saúde passou a exigir dados adicionais para o preenchimento de óbitos pelo coronavírus no Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe, o SIVEP-Gripe. A ferramenta está passando por atualização desde terça-feira (23), situação que provocou instabilidades no preenchimento das informações por diversas instituições de saúde do país. De acordo com o governo de São Paulo, a alteração foi feita sem aviso prévio e pode causar um represamento de dados sobre a pandemia nos próximos dias.
Entre os novos dados que o SIVEP-Gripe passou a exigir, estão número de CPF, cartão de vacinação do SUS, declaração de estrangeiro e a confirmação ou não de se o paciente já havia se imunizado contra o coronavírus.
— Burocratizar sem avisar fez com que não tivéssemos aportado por grande parte dos municípios do país o número de óbitos —, afirmou o secretário estadual de Saúde de São Paulo Jean Gorinchteyn.
De acordo com a equipe de Vigilância Epidemiológica de Porto Alegre, a inserção de novas variáveis no SIVEP-Gripe provocou instabilidade no sistema desde a noite de terça-feira. Algumas instituições de saúde da Capital não conseguiram inserir dados a respeito de casos e óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). O problema se estendeu até a tarde desta quarta-feira (24) quando foi solucionado, informou o órgão municipal, mas podem ocorrer novos casos de instabilidade.
O reflexo das mudanças no sistema foi sentido nos dados de São Paulo, que registrou 281 óbitos nas últimas 24 horas, uma queda de 24,3% em relação ao dia anterior. Na véspera, aquele Estado havia batido o seu recorde com 1.021 mortes pelo coronavírus, o que representou quase um terço do total do país, que ultrapassou pela primeira vez a marca das 3 mil vidas perdidas para a doença.
— Os municípios não foram devidamente informados, não se deixou prazo para que eles possam se habilitar nessa mudança e os municípios não conseguiram completar o preenchimento desses campos — alertou Gorinchteyn durante entrevista coletiva.
— Os campos que foram inseridos retardam o aporte dessa informação e muitos deles não têm importância nesse momento. Isso passa a ter um impacto.
O Conselho Nacional das Secretarias Municipais (Conasems) afirmou que a nova forma de registrar estes óbitos já estava em discussão, por causa da necessidade de aprimoramento nas informações coletadas, mas que houve falha na comunicação sobre a mudança. Como a medida pegou gestores de surpresa, o conselho pediu a retirada dos novos campos.
— O que ocorreu foi uma falta de comunicação adequada no momento em que foi colocada a funcionalidade em produção no referido sistema e por este motivo solicitamos a retirada desses campos como obrigatórios por enquanto — afirma a nota.
Segundo o conselho de secretários, o campo do CPF já existia na plataforma utilizada pelos gestores, mas não era obrigatório.
Em entrevista ao Estadão, o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e coordenador da plataforma InfoGripe Marcelo Gomes disse que a inclusão dos campos é boa, mas foi adotada em um momento errado.
— São coisas que facilitam as análises dos dados, mas nesse momento é uma mudança de roda com o carro em alta velocidade. Ter CPF ou CNS facilita limpeza de duplicidades, identificação de suspeita de reinfecção, e cruzamento com outros bancos de dados — afirmou Gomes.
Segundo o pesquisador, o problema é que o preenchimento destes campos exige que o paciente tenha o número do CPF em mãos.
— Caso contrário, o agente de saúde tem que pesquisar o CNS da pessoa ou fazer um novo cadastro — concluiu.
O Ministério da Saúde ainda não informou o que motivou a mudança nos protocolos de preenchimento para mortes pela covid-19 nem a totalidade dos novos campos exigidos.