Conhecido como solo criado, o ato de comprar da prefeitura a permissão para construir mais do que o prestabelecido para um terreno terá novas regras em Porto Alegre. O prefeito Nelson Marchezan deve sancionar nos próximos dias a lei que regulamenta a "outorga onerosa do direito de construir", um sinônimo para o solo criado estabelecido pelo Estatuto das Cidades.
— Nesse conceito de solo criado, Porto Alegre é pioneira: a primeira lei que regulava esse instrumento é de 1994. Depois as atualizações do Plano Diretor trouxeram mudanças, e mais tarde o Estatuto das Cidades estabeleceu diretrizes gerais. O governo sentiu a necessidade atualizá-lo — explica Germano Bremm, assessor técnico da Procuradoria-Geral do Município.
Apesar da nomenclatura pouco amigável, a lógica da compra de índices construtivos é relativamente simples. Quem tem um terreno que prevê, por exemplo, um imóvel de 250 metros quadrados, mas quer construir algo maior, precisa comprar a diferença do poder público. A aquisição está sujeita à disponibilidade de índices para cada região — são oito no total, previstas no Plano Diretor —, que é limitada, e também a um limite máximo para construir, diferente para cada terreno.
Conforme Bremm, o solo criado é um instrumento urbanístico que serve para ajudar no planejamento urbano. A partir do momento em que a prefeitura determina os limites para construção em uma região, ela define para onde a cidade deve crescer nos anos seguintes. O estoque de índices, que é limitado, é publicado a cada seis meses no Diário Oficial, e fica disponível para consulta no site da prefeitura.
Saiba o que muda com as novas regras:
Compra de índices maiores no balcão
Atualmente, somente o solo criado de até 300 metros quadrados, considerado de pequeno adensamento, pode ser comprado no "balcão", ou seja, diretamente com a prefeitura. A nova lei expande os índices chamados de médio adensamento, entre 300 e 1 mil metros quadrados. Acima de 1 mil metros quadrados, nada muda: a compra seguirá viabilizada através de leilão anual. Esse é um dos pontos que deve mostrar maior impacto prático na cidade. Isso porque ele deve facilitar o processo de compra de índices para empreendedores que antes estavam condicionados ao leilão, onde o preço do metro quadrado costuma variar.
Pagamento com contrapartidas
A nova legislação permitirá que o pagamento do solo criado seja feito não apenas em dinheiro, mas em contrapartidas. Desse modo, será possível que quem adquire índices construtivos possa ressarcir a prefeitura realizando uma obra no mesmo valor. Serão permitidas obras vinculadas a projetos habitacionais, implantação de equipamentos urbanos e comunitários, criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes, e outras previstas no artigo 26 do Estatuto das Cidades. A prefeitura acredita que a medida ajudará a destravar obras necessárias ao município, uma vez que trabalhos executados por pessoas físicas e pela iniciativa privada enfrentam menos burocracia do que aqueles contratados pelo poder público.
Fundo destinará recursos para obras
Antes destinados ao Fundo Municipal Pró-Mobilidade, recursos da venda de índices construtivos de terrenos de médio e grande adensamento agora irão para o Fundo de Gestão de Território. Mais abrangente do que o antigo fundo, voltado ao sistema viário, o novo prevê investimentos em obras de infraestrutura, aquisição e desapropriação de terrenos, instalação de equipamentos públicos, como praças e parques, e para a preservação de bens tombados e inventariados. Os recursos obtidos através da venda em balcão para os terrenos com menos de 300 metros quadrados continuarão sendo encaminhados para o Fundo de Habitação Social, como ocorre hoje.
Criação do Fator de Planejamento
O valor do metro quadrado, que hoje varia entre cerca de R$ 200 e R$ 2 mil em diferentes partes da cidade, pode facilitar ou dificultar o adensamento de uma região. Para que a prefeitura possa ter maior ingerência sobre esse cálculo, a nova lei acrescenta uma variável chamada de Fator de Planejamento. Ela prevê que, em alguns casos, o poder público aumente ou diminua o valor do metro quadrado em uma região predeterminada para estimular ou desestimular — dependendo da infraestrutura disponível — a ocupação de diferentes áreas da Capital. A aplicação do multiplicador, que pode variar entre zero e 1.3, poderá ser feita por decreto ou projeto de lei — nesse caso, terá de ser aprovada na Câmara Municipal.