O futuro do transporte coletivo de Caxias do Sul volta a ser discutido nesta quarta-feira (9), na Câmara de Vereadores. O presidente da Associação dos Usuários do Transporte de Passageiros (Assutran) ocupará a tribuna do legislativo para discutir a próxima licitação para o serviço.
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O contrato de concessão entre a prefeitura e a Viação Santa Tereza (Visate) termina em 2020. Os últimos anos da relação entre as partes foram conturbados: hoje, elas estão em lados opostos de três ações judiciais em andamento. Paralelamente, a prefeitura precisa publicar um novo edital para o serviço em menos de dois anos.
Buscando antecipar para qual direção o transporte coletivo de Caxias será conduzido, o Pioneiro conversa com as partes interessadas nesse processo: a prefeitura de Caxias, a população — por meio da Assutran — e a Visate, começando pelo Secretário Municipal de Trânsito, Transportes e Mobilidade, Cristiano de Abreu Soares.
O titular da pasta que regula o transporte coletivo afirma que o edital está em fase de elaboração. No entanto, ele adianta que o município já tem alguns pontos do próximo contrato definidos. Entre eles, está a preferência por duas empresas operando o serviço de ônibus urbanos em Caxias.
— Teremos, sim, mais de uma empresa de transporte coletivo na cidade. A gente imagina que duas empresas seja a quantidade adequada — pontua.
De acordo com Soares, houve o entendimento que uma empresa sozinha não fornece um serviço satisfatório à população.
— A ausência de concorrência não impacta diretamente na tarifa, mas impacta sem dúvida na qualidade do serviço. Com a concorrência dentro da cidade, o cidadão consegue perceber se uma empresa opera com pontualidade e outra não, por exemplo. Elas acabam competindo nesse sentido, da qualidade — justifica.
As duas concessionárias, porém, não competiriam pelos mesmos passageiros: a exemplo do que ocorre em outros municípios, as linhas existentes seriam divididas entre as empresas.
A possibilidade de mais concessionárias atuarem no transporte coletivo de Caxias foi tema de discussão em audiência pública promovida pela Assutran há exatamente um mês. Embora a entidade diga que ainda não tem posicionamento oficial sobre o tema, um dos palestrantes convidados e o material distribuído ao público no evento alertavam para o aumento dos custos causados por mais de uma companhia operando, já que cada uma necessitaria ter estrutura própria na cidade e transportaria menos passageiros.
— Sempre há prós e contras. De fato, são duas estruturas, mas têm outras qualidades que a gente percebe como positivas, que, na nossa opinião, compensam. Não é isso que vai ser determinante (para a tarifa) — contrapõe o secretário.
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Além da projeção de mais uma companhia atuando na cidade, a prefeitura prevê outras mudanças para o próximo contrato de concessão.
— Existem alguns erros do passado que a gente precisa corrigir — coloca Cristiano de Abreu Soares.
Entre as elas, o secretário cita a manutenção de uma "correção" já colocada em prática: o recebimento das reclamações sobre o serviço pelo Alô Caxias, pelo telefone 156.
— A reclamação do transporte coletivo não pode ser para a própria concessionária, é o poder público que tem que ter essa informação. O Alô Caxias tem contribuído para que a nossa fiscalização seja mais efetiva — diz.
Conforme o secretário, desde que a medida entrou em vigor, em agosto de 2017, a prefeitura já recebeu mais de 350 pedidos de fiscalização e todos eles resultaram em autuações.
Outro mecanismo pensado para facilitar a inspeção do serviço é o acompanhamento dos ônibus por GPS. Hoje, esse controle é feito pela própria Visate, mas a prefeitura quer transferir a estrutura para a Secretaria de Trânsito.
— Se hoje eu quiser saber onde estão os ônibus, se eles estão cumprindo horário, eu preciso, dentro da minha equipe de fiscalização, que são seis pessoas, avaliar mais de 300 veículos. Fica muito difícil. Ao passo de que se a gente tem o GPS, esse controle é interno. Essa deveria ser a abordagem — explica.
Conforme o secretário, somente assim a prefeitura saberá se o serviço está sendo corretamente remunerado, já que o custo da passagem considera o quilômetro rodado e é necessário garantir que todas as voltas previstas sejam executadas.
Uma terceira alteração se dará na estrutura de atendimento aos usuários: com duas empresas operando, a prefeitura considera mais eficiente assumir o sistema de bilhetagem eletrônica. Para recarregar o cartão de ônibus, por exemplo, a população usaria uma estrutura da própria administração municipal.
— Talvez (o sistema atual) tenha sido cômodo para a prefeitura no passado, porque era uma empresa apenas. Mas a gente acha que isso é inadequado. Não pode uma das empresas ter a bilhetagem eletrônica e outra não, ou as duas terem sistemas diferentes — exemplifica.
O secretário admite que as mudanças possam gerar mais custos para o município. No entanto, hoje o ônus dessa estrutura já seria transferido para o próprio usuário.
— Pode inclusive contribuir, um pouco, para o barateamento (da tarifa) — projeta.
OUTRAS PROPOSTAS
O edital para a concessão do serviço de transporte coletivo vai ser tratado pela equipe técnica da prefeitura de forma interna até seu lançamento, conforme o Secretário de Trânsito. Estas são algumas propostas em discussão:
:: Reajuste da tarifa
A princípio, seguiria anual. O modelo de cálculo da tarifa, porém, mudaria. A planilha Geipot, que consta no contrato atual, deve ser substituída por outro sistema, ainda não definido. Aspectos da planilha já foram ignorados pela prefeitura neste ano. Conforme Soares, para chegar ao valor de R$ 3,85 vigente, foi acatada orientação da Procuradoria-Geral do Município (PGM). A PGM teria considerado os mesmos critérios que a Justiça que estabeleceu, em caráter liminar, para determinar a passagem de 2017 em R$ 3,70.
— Foi mantida a coerência com o processo que está judicializado. E para o novo contrato, entendemos que a Geipot não é adequada. Estamos buscando outros meios de fazer esse cálculo — declara.
:: Duração do contrato
Nada foi definido oficialmente, mas a prefeitura considera adequada a duração de 10 anos para o contrato de concessão.
:: Gratuidades
O município não descarta rever as gratuidades no transporte coletivo para tentar baixar o valor da passagem. Se discute o fim do passe-livre no último domingo do mês e também a limitação do benefício para idosos. Nenhum direito adquirido seria revogado, mas, futuramente, um critério de renda poderia ser adotado para definir quais usuários de 60 a 64 anos teriam direito à isenção. A ideia é discutir as mudanças com a população e a Câmara de Vereadores.
Plano Municipal de Mobilidade deve embasar futuras políticas
Além de sancionar reajustes insuficientes para a tarifa, a Visate alega que o município também contribui para o desequilíbrio econômico-financeiro da empresa por não permitir a racionalização do serviço — ou seja, a diminuição de veículos em horários em que o número de passageiros é menor.
Segundo o Secretário de Trânsito de Caxias, a prefeitura considera a adequação do serviço ao número de usuários algo natural, mas falta lei específica para regular o processo. Cristiano Soares aponta que não será o novo edital que tratará da questão, mas sim o Plano Municipal de Mobilidade Urbana, que deve entrar em discussão a partir do segundo semestre deste ano.
— É um assunto que vai, no encerramento do Plano Diretor, ser o próximo passo da prefeitura. Talvez possa ser um direcionador de como trabalhar essa racionalização de linhas conforme cai a quantidade de passageiros. O nosso desafio é atrair mais usuários ao transporte coletivo, porque dessa maneira se barateia a tarifa — declara.
O plano é exigência do governo federal para todos os municípios com mais de 20 mil habitantes. Se a legislação não for elaborada até abril de 2019, as cidades não poderão mais receber recursos federais para projetos de mobilidade urbana.
Mesmo com a qualificação do serviço, porém, o secretário alerta que não é possível acabar com certas situações consideradas inadequadas pela população, como a superlotação dos ônibus no horário de pico.
— Nenhum sistema no mundo é ocioso no horário de pico. Se for, está mal dimensionado e a tarifa se torna muito cara, porque nos demais horários também tem que manter toda essa estrutura. O sistema acaba superlotado (no horário de pico) porque no restante dos horários vai ser muito ocioso. Tem que ter esse equilíbrio, nem sempre agrada, mas é uma forma de manter o custo da passagem o mais baixo possível.