Notícia que fica pela metade, que não diz de onde veio o fato e para onde foi a consequência do fato, não é notícia, é meia-notícia. Notícia que fica pela metade revela ter sido escrita por jornalista desprovido de curiosidade, que não fez a si mesmo as perguntas que deixou em aberto para seu público leitor. E jornalista desprovido de curiosidade é um meio-jornalista. Somente meios-jornalistas são capazes de produzir meias-notícias, e meias-notícias, convenhamos, cheiram mal.
Cheiram mal e obrigam o leitor a preencher as lacunas do enredo a seu bel prazer, o que faz com que o fato noticioso acabe se transformando, a depender da imaginação de cada um, em uma narrativa ficcional. O que nem sempre é saudável para a verdade histórica dos fatos. Vejamos, para ilustrar a tese, um exemplo recentemente publicado (que eu sei que a estimada leitora e o prestimoso leitor apreciam o momento dos exemplos), ocorrido na longínqua Austrália, a terra dos bumerangues e dos cangurus. Gosto de ler notícias sobre a Austrália porque aquela é uma região do planeta que me fascina desde criança, devido à existência nela de animais muitíssimo esquisitos. Entre eles, a équidna (já viste foto da équidna, madame?), o ornitorrinco (o amigo leitor já deve ter visto ornitorrincos), o pássaro kiwi (sim, sim, madame, é um pássaro),o ágil dingo e o casuar. Este último foi quem causou.
Fiquei sabendo, por meio de um site de notícias, que, dia desses, um casal de australianos (de humanos australianos) levou um baita susto ao chegar em casa e deparar com um enorme casuar enfiado dentro da sala de estar. O casuar, se a senhora e o senhor não sabem, é uma ave gigantesca, de cerca de um metro e meio de altura, considerada a ave mais perigosa do mundo, devido à sua agressividade. E ponto, foi isso. A matéria não diz de que maneira a ave entrou na casa (tampouco a razão) e nem de que forma foi (e se foi) retirada de lá.
Como cabe a cada um de nós preencher as lacunas deixadas em aberto, com licença, lá vou eu, apresentar a minha versão dos fatos. O casuar queria assistir na tevê a cabo à transmissão da votação do impeachment da presidente Dilma, na Câmara dos Deputados brasileira e não pensou duas vezes: invadiu a sala, pegou o controle remoto e pôs-se a ver aquela coisa. Não é preciso dizer que, pouco depois, apavorado, fugiu da sala sem que fosse necessário chamar os bombeiros e afiar os bumerangues. Minha versão é essa. Se a da senhora for melhor, fique à vontade.
Opinião
Marcos Kirst: os perigos da meia-notícia
A matéria não diz de que maneira a ave entrou na casa e nem de que forma saiu de lá
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