Presidente e um dos fundadores do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH) no Rio Grande do Sul, Jair Krischke vê as mortes de dois jovens de Bento Gonçalves como resultado do despreparo na formação de policiais militares.
>> Brigada Militar conclui que houve excesso na morte de jovens em Bento Gonçalves e indicia quatro PMs
Há três meses, na madrugada de 16 de março, Anderson Styburski, 16 anos, e Danúbio Cruz da Costa, 20, foram baleados e mortos por dois brigadianos. Eles estavam no bagageiro (baú) de uma Fiorino conduzida por Tiago de Paula. O motorista fugiu de uma abordagem, o que provocou uma mobilização da Brigada Militar (BM).
Para Krischke, o modelo de policiamento estabelecido no Brasil tornou-se ineficaz pois coloca os servidores fardados tão somente a favor do Estado e deixa a população em segundo plano. Levantamento divulgado por Krischke aponta 18 mil pessoas mortas pela polícia de 2003 a 2012 no país. Muitos desses casos são semelhantes ao desfecho trágico de Bento, onde pessoas são mortas por engano.
- Chama a atenção de organismos internacionais. É muito exagerado esse índice, mata-se por distorção e falta de qualificação. As manifestações nas ruas do país deixaram ainda mais claro que a polícia não enxerga a nós, os cidadãos. Não se cumpriu a missão de proteger e, ao final, houve confrontos e vandalismo - lembra.
O ativista diz que chegou a hora de a sociedade debater qual a polícia militar se quer pois a formação dos servidores ainda remete aos tempos da ditadura, quando se privilegiava o combate e a repressão. Outros agravantes que influenciam no comportamento dos policiais nas ruas são a diferença salarial entre praças e oficiais e a falta de um plano de carreira para soldados. Ele também compara o tempo de treinamento entre europeus e brasileiros. Em média, um policial gaúcho é considerado apto a enfrentar criminosos com seis meses de curso. Na Alemanha, destaca o presidente do MJDH, o padrão é de três anos. Diferentemente do Brasil, não há divisão entre polícia militar e civil em países como os Estados Unidos.
- Em Bento era uma mera suspeita e acabou nisso. O cidadão, portanto, deve procurar de todas as formas evitar ser perseguido pela polícia. É mais um exemplo do que o Congresso nos deve: uma polícia voltada para a cidadania.
A Polícia Civil concluiu o inquérito sobre a morte de Anderson e Danúbio em 45 dias. O delegado Álvaro Becker indiciou os PMs e o condutor da Fiorino por duplo homicídio, mas a investigação foi devolvida pelo Ministério Público por falta de consistência e perícias. O caso segue em aberto na delegacia.
A Brigada Militar, por sua vez, admite que houve excesso na abordagem e indiciou Edegar Júnior Oliveira Rodrigues e Neilor dos Santos Lopes por homicídio, o soldado Alexandre Schifeldein por ter agredido Tiago durante buscas aos ocupantes da Fiorino e o sargento Lorival de Abreu Cardoso por não ter adotado providências para preservar a cena do crime.
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