Temos recebido muitas informações sobre a chegada do coronavírus em nosso país. Nas rodas de conversa tenho ouvido muitas falas no sentido de que isso não acontecerá conosco, somos um país forte, Deus ajuda e outras falas como, isso tudo é exagero. Fico pensando no que significa essa negação assim tão forte. Me questiono de onde vem essa onipotência de nos acharmos melhores que os outros e que não sofreremos com tal situação. Claro, também não podemos entrar numa histeria e surtar antes do surto. Mas penso que precisamos ser responsáveis, conosco, com as pessoas que amamos e com todos. A ficha ainda não caiu, mas vai cair em algum momento. Não acredito que estejamos ignorando a epidemia. Acho que o fato das pessoas continuarem a se reunir em aglomerações, irem para bares, festas, shows ainda é uma forma de celebrar a vida, embora denuncie uma negação dos fatos. Acredito também que fazemos isso, porque somos um país imaturo, nunca enfrentamos situações de grandes epidemias ou guerras. Tomara que nunca precisássemos passar por isso, mas parece que a nossa geração vai viver algo neste sentido.
Vale lembrar que as guerras, as epidemias, são o contrário do cotidiano. São as exceções. São aqueles momentos em que fica clara uma ameaça de extinção da coletividade e isso, sem dúvidas, faz com que reconfiguremos o lugar de cada um. Tem um texto do Freud, Luto e Melancolia em que ele fala sobre o fato de que infelizmente o ser humano precisa chegar à melancolia para compreender certas verdades sobre si mesmo. Neste sentido, parece que o coronavírus nos mostra que dependemos uns dos outros, que somos seres sociais e que não podemos viver de modo individualista. Compreender isso e pôr em prática parece ser ainda o maior desafio diante desta epidemia, e sem pânico, pois o desespero não nos ajudará. Será que conseguiremos nos voltar para nós mesmos e para os que convivem conosco o dia a dia? Será que conseguiremos viver sem o barulho lá de fora que nos rouba a vida, mas que simula o fim da angústia? Será que conseguiremos silenciar dentro de nós, aguentar o silêncio do outro e romper com o mercado e sua busca insana por acumulação? Eu não sei as respostas, não sei se alguém sabe, mas sei que teremos de nos reaprender enquanto ser humano, resgatar nosso sentido gregário e desafiar a sociedade a nos respeitar enquanto pessoas, sujeitos e não apenas indivíduos que movem a máquina capitalista. Para isso, talvez, precisemos parar de negar o que se apresenta, a buscar soluções enquanto ainda estamos tranquilos e não esperar que tudo fique perto demais e grande demais para resolver. Preocupar-se com isso, também é uma forma de amar.