Em 2006, um anúncio do Ministério do Turismo de Aruba dizia: "Eu disse a ela que a câmera estava desligada. (Ninguém é bom o suficiente para ir para o céu. Vá para Aruba)". Ganhou todos os prêmios e nenhuma polêmica. Dez anos depois, no Cannes Lions – Festival Internacional de Criatividade, que terminou domingo passado, uma agência brasileira teve que devolver dois prêmios por causa de um anúncio com a mesma ideia. A sociedade (e, diga-se, muitos publicitários) viram no título "Calma amor, não estou filmando isso.mov", uma abordagem machista e estimuladora da pornografia, da violência, quando vídeos íntimos são expostos na internet. Feito para anunciar Aspirina, o anúncio deu muita dor de cabeça.
E dá, também, o que pensar. Afinal, neste pequeno intervalo de tempo, não mais aceitarmos uma abordagem como esta é um sinal claro de uma visível melhora do nosso comportamento social, e também de nossa relação vigilante diante dos deslizes da publicidade – embora seja preciso tomar cuidado com exageros persecutórios, pois a publicidade é uma vidraça fácil e atrativa de se atirar pedra. Mas, quase sempre, ela é consequência do comportamento social, e não causa.
Neste mesmo Festival de Cannes, o Brasil teve seu pior desempenho desde 2012, justamente em um ano onde a responsabilidade social da publicidade esteve no centro da pauta. Temas como racismo, desigualdade e representação feminina dominaram os debates e as apresentações de muitos anunciantes e agências, e houve até mesmo uma certa tendência de maior reconhecimento criativo às campanhas do tipo "engajadas". O secretário-geral da ONU, Ban Kimoon, palestrou no evento e cobrou dos presidentes dos maiores grupos de comunicação do mundo maior engajamento na promoção do desenvolvimento sustentável.
A sociedade que cada vez mais acolhe a diversidade é a mesma que, em movimento pendular, escolhe a xenofobia no plebiscito inglês ou um Donald Trump nos EUA. Mas é inevitável que ela está mudando e obriga que muita coisa mude junto com ela. A publicidade é só uma delas.