Os juízes da Suprema Corte dos Estados Unidos se mostraram divididos, nesta quarta-feira (4), sobre o acesso de menores de idade transgênero a tratamentos médicos para redesignação sexual.
A principal instância jurídica do país examinou concretamente uma lei adotada em 2023 pelo estado do Tennessee (sul), governado pelos republicanos, que proíbe que menores que não se identificam com o seu gênero de nascimento tenham acesso a bloqueadores de puberdade e tratamentos hormonais de transição.
Quase metade dos estados americanos promulgou leis semelhantes.
Do 1,6 milhão de pessoas que se identificam como transexuais nos Estados Unidos, mais de 300.000 têm entre 13 e 17 anos, e mais de um terço vivem em um destes estados, segundo um estudo do Instituto Williams, grupo de reflexão da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA).
Os apoiadores da lei do Tennessee se reuniram em frente ao prédio do tribunal, no centro de Washington, antes das alegações orais, com cartazes que diziam "Vamos deixar que nossas crianças cresçam" ou "A saúde importa".
Vários menores e suas famílias, uma ginecologista de Memphis e a administração do presidente americano em fim de mandato, o democrata Joe Biden, denunciam a natureza "discriminatória" desta lei.
Eles alegam que a norma viola uma disposição da Décima Quarta Emenda da Constituição sobre igualdade porque priva as pessoas transgênero do acesso a tratamentos autorizados para outras pessoas.
A assessora jurídica da gestão Biden, Elizabeth Prelogar, criticou que a lei não leve em conta a vantagem dos tratamentos, como a diminuição dos casos de depressão e de ideias suicidas.
Chase Strangio, advogado da 'American Civil Liberties Union', o primeiro abertamente trans a argumentar perante a Suprema Corte, de maioria conservadora, criticou que a lei do Tennessee tenha "eliminado o único tratamento que aliviava anos de sofrimento" dos demandantes no caso.
"O que fizeram foi impor uma proibição desastrosa, anulando o julgamento muito cuidadoso dos pais que amam e cuidam de seus filhos e dos médicos que recomendaram o tratamento", disse Strangio.
- "Muito difícil" -
"Me parece que esta é uma área na qual particularmente temos pouca experiência", reagiu o presidente do tribunal, John Roberts, questionando-se se não seria conveniente deixá-lo nas mãos dos legisladores estaduais para avaliar seus benefícios e riscos.
Seu colega conservador, Brett Kavanaugh, também considerou "muito difícil" para os juízes tomarem uma decisão.
"Se os tratamentos forem proibidos, algumas crianças vão sofrer porque não terão acesso a eles, e se forem autorizados, outras vão sofrer tomando-os e lamentando mais tarde", resumiu.
O tema gera polêmica no país, onde o presidente eleito, Donald Trump, se comprometeu a impor uma proibição federal ao acesso a estes medicamentos para menores trans e a restringi-lo para adultos.
A lei do Tennessee, conhecida como SB1, foi assinada em março de 2023 para proteger os menores de procedimentos médicos "arriscados e suscetíveis de ter consequências frequentemente irreversíveis", declarou o representante do estado, Matthew Rice.
Diante das objeções apresentadas pelos três juízes progressistas, ele negou que a lei faça discriminações por sexo.
"Se um jovem pede bloqueadores da puberdade para tratar uma puberdade precoce demais, poderá obtê-los, mas não usá-los para a transição de gênero", argumentou Matthew Rice, assegurando que os mesmos critérios se aplicam a uma jovem.
Os bloqueadores da puberdade são usados em adolescentes que contemplam a transição de gênero para retardar o aparecimento de alterações físicas indesejadas.
Seus apoiadores afirmam que o processo pode salvar a vida de crianças que lutam com a disforia de gênero.
Em abril, a Suprema Corte permitiu que uma proibição semelhante em Idaho entrasse em vigor enquanto o processo legal continua.
De acordo com a lei de Idaho, os profissionais médicos que fornecerem tratamento a menores, incluindo bloqueadores de puberdade, terapia hormonal ou cirurgia, podem ser condenados a até 10 anos de prisão.
Os direitos das pessoas trans, em particular sobre a permissão para mulheres transgênero usarem banheiros femininos e participar de esportes femininos, fazem parte da "guerra cultural" travada entre republicanos e democratas.
* AFP