HONG KONG e PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) - Manifestantes contrários ao governo de Hong Kong invadiram nesta segunda-feira (1º) o Parlamento local, durante protesto que lembrava o 22º aniversário da devolução do território à China, em um novo capítulo da crise política que atinge a região desde o início de junho.
Já no início da madrugada de terça-feira (2), tarde de segunda pelo horário de Brasília, a polícia decidiu entrar no local e usou bombas de gás lacrimogêneo e spray de pimenta para retirar os manifestantes.
Com isso, o confronto se alastrou pelas ruas -parte delas bloqueadas pelos protestos-, e 54 pessoas ficaram feridas, incluindo três em estado grave segundo o jornal britânico The Guardian.
O governo local informou ainda que 13 agentes de segurança ficaram feridos e tiveram de ser encaminhados para um hospital.
Desde o começo do dia, o território ficou dividido entre o ato do governo para comemorar o aniversário de devolução -Hong Kong foi uma colônia britânica antes de retornar ao domínio chinês, em 1997- e o protesto convocado por ativistas pró-democracia.
Com gritos de "vamos lá, Hong Kong", milhares de manifestantes foram às ruas contra o governo e o controle chinês. Os organizadores afirmaram que 550 mil pessoas participaram do ato, enquanto a polícia afirma que foram 190 mil.
A maior parte do protesto, que tinha autorização do governo para ser realizado, ocorreu de maneira pacífica. Um primeiro confronto foi registrado quando jovens encapuzados ocuparam e bloquearam as três principais avenidas de Hong Kong com grades de metal.
Policiais, equipados com cassetetes e escudos, posicionaram-se diante dos manifestantes. Os agentes usaram gás lacrimogêneo, e os ativistas responderam lançando ovos.
Depois disso, um pequeno grupo, composto em sua maioria por estudantes vestidos com capacetes e máscaras, dirigiu-se até o prédio do Parlamento.
Usando um carrinho de metal, barras de ferro, pedaços de andaime e guarda-chuvas (que se tornaram um dos principais símbolos do movimento pró-democracia), os manifestantes conseguiram quebrar o vidro reforçado e avançaram contra o complexo do governo.
A polícia mobilizou uma unidade antidistúrbios dentro do edifício e usou bombas de gás lacrimogêneo e spray de pimenta para tentar conter a ação.
Um outro grupo de ativistas tentou impedir a ação dos colegas e se postou na frente dos vidros, mas acabou sendo retirado. Mais tarde, parlamentares que apoiam os protestos divulgara, uma carta criticando a tentativa de invasão do prédio e os bloqueios das ruas.
Após esse confronto, os dois lados chegaram a um impasse, com os manifestantes cercando o Parlamento e a polícia, dentro dele, tentando impedir a entrada do grupo.
Por volta das 21h locais (10h no horário de Brasília), os agentes de segurança deixaram o local -ainda não está claro por que isso aconteceu- e os manifestantes conseguiram entrar no edifício.
O grupo derrubou portas, destruiu quadros, pichou algumas paredes e estendeu faixas com inscrições como "Não há manifestantes, apenas um regime violento" e "Hong Kong livre".
O Parlamento emitiu um alerta vermelho que exigia que o local fosse esvaziado imediatamente, mas durante três horas o legislativo local ficou sob controle dos manifestantes.
Foi só pouco depois da meia-noite de terça (13h de segunda em Brasília) que a polícia entrou no Parlamento para retirar os manifestantes à força, recomeçando, assim, o confronto.
Usando escudos, capacetes e máscaras de gás, a polícia disparou gás de pimenta nos ativistas que estavam do lado de fora do Parlamento--eles usaram guarda-chuvas para se proteger.
Às 2h locais (15h de Brasília), os agentes já tinham conseguido retomar completamente o controle do prédio invadido.
As ações foram transmitidas ao vivo, em nove ângulos diferentes, por meio de um esquema montado pelos próprios manifestantes, segundo o Guardian.
As imagens mostravam tanto programas noticiosos da mídia tradicional quanto da imprensa alternativa, no estilo câmera na mão. O número de espectadores de todas as telas, em alguns momentos, chegava a 100 mil pessoas.
A líder de Hong Kong, Carrie Lam, condenou a invasão "extremamente violenta" do Parlamento e pediu que a população "volte à calma o mais rapidamente possível".
Segundo o acordo de devolução com Londres, Pequim se comprometeu a respeitar a democracia no território, que possui um sistema legal próprio e certo grau de autonomia política -um arranjo conhecido como "um país, dois sistemas".
Nos últimos anos, porém, a ditadura do Partido Comunista vem tentando aumentar seu poder sobre o território, levando a oposição pró-democracia a organizar grandes manifestações.
A situação piorou no início de junho, quando o governo de Hong Kong -apoiado por Pequim- apresentou um projeto de lei de extradição que abriria a possibilidade de suspeitos serem enviados à China continental para serem julgados.
Protestos convocados por ativistas pró-democracia contra a nova lei reuniram milhares de pessoas e acabaram obrigando o governo a suspender temporariamente o projeto.
As manifestações, porém, continuaram e passaram a mirar a chefe-executiva de governo, Carrie Lam, considerada uma aliada do regime chinês.
Carrie Lam, porém, se nega a renunciar ao cargo, apesar da onda de protestos -que também é vista como um desafio ao líder da ditadura chinesa, Xi Jinping.
No último domingo (30), o governo britânico pediu que a China respeitasse o acordo de devolução e mantivesse a democracia no território.
Nesta segunda-feira, o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China, Geng Shuang, respondeu a Londres.
"O Reino Unido não tem mais nenhuma responsabilidade sobre Hong Kong. Os assuntos de Hong Kong são uma questão puramente interna da China e nenhum país estrangeiro tem o direito de interferir", afirmou.
- Cronologia dos protestos em Hong Kong
set. a dez.14 Protestos pró-democracia têm início
set.16 Geração de ativistas pró-independência ganha assentos no Parlamento
mar.17 Carrie Lam é eleita chefe executiva de Hong Kong por Colégio Eleitoral
jun.17 Dirigente chinês Xi Jinping dá posse a Lam e alerta contra aventuras independentistas
set.18 Partido Nacional Hong Kong, pró-independência, é banido
abr.19 Governo Lam propõe projeto de lei que facilita extradição para a China continental
abr.19 Corte de Hong Kong condena nove líderes dos protestos pró-democracia de 2014
6.jun.19 Protestos contra projeto de lei de extradição têm início
12.jun.19 Votação de projeto é adiado após protestos
18.jun.19 Carrie Lam pede desculpas e adia por tempo indefinido projeto de lei de extradição
1º.jul.19 Manifestantes invadem Parlamento