A Polícia alemã foi acusada, nesta quarta-feira (29), de ter vazado documentos confidenciais para a extrema direita e de avivar a tensão, após a violência registrada na cidade de Chemnitz e em outras partes do país.
Ontem, nas redes sociais, militantes de extrema direita fizeram circular uma cópia de um dos dois mandados de prisão emitidos na segunda-feira pela Justiça alemã contra um iraquiano e um sírio. Os dois jovens, na faixa dos 20 anos, são suspeitos de terem esfaqueado um alemão de 35 na madrugada de domingo em Chemnitz.
Este homicídio motivou os atos de violência, no domingo, na terceira maior cidade da região da Saxônia, no leste da Alemanha. O episódio foi usado como justificativa, por parte da extrema direita, para insistir em uma de suas ideias favoritas: a decisão da chanceler alemã, Angela Merkel, de permitir a entrada de mais de um milhão de refugiados na Alemanha provocou uma alta no índice de criminalidade.
O ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, denunciou hoje o vazamento do mandado e considerou o ato "absolutamente inaceitável".
Suspeita-se de que o vazamento tenha sido feito diretamente por membros da Polícia.
- Investigação judicial
"Quando ouço que o mandado de prisão foi vazado, aparentemente, pela Polícia para veículos da extrema direita, temos um grande problema para resolver", criticou o vice-ministro presidente da região da Saxônia, Martin Dulig.
"Deve ficar claro que não se continuará a tolerar certas coisas na Polícia", afirmou Dulig.
"Não é possível que haja policiais que pensem que podem vazar coisas, quando sabem perfeitamente que estão cometendo um crime", insistiu.
Trata-se de uma questão delicada, já que o documento contém o nome de um dos dois suspeitos, de testemunhas e da juíza encarregada do caso, com detalhes sobre as circunstâncias deste assassinato.
O Ministério Público de Dresden abriu uma investigação para "esclarecer (os fatos) o quanto antes".
A cópia deste documento confidencial foi divulgada no Facebook, e depois retirada, pelo grupo nanico local de extrema direita Pro Chemnitz, uma filial do partido Alternativa para a Alemanha (AfD) e o Pegida, informou a rede pública ARD.
O suspeito mencionado no documento esfaqueou a vítima "cinco vezes" no peito, com "a colaboração consciente de outro suspeito que também tinha uma faca", descreve o documento.
O mandado de prisão não menciona o motivo inicial da briga que deu lugar à agressão. A Polícia já desmentiu, em diferentes momentos, porém, os rumores divulgados pela extrema direita de que a vítima quis defender uma mulher que estava sendo assediada, ou agredida sexualmente.
- Críticas -
Este escândalo se soma às críticas à Polícia saxã, regularmente acusada de simpatia - e até de conluio - com a extrema direita nessa região, reduto do partido anti-Islã e anti-Merkel Alternativa para a Alemanha (AfD). Foi lá que registrou seu melhor resultado eleitoral nas legislativas de 2017 (27%).
Na semana passada, a Polícia saxã já havia sido criticada por prender, a pedido de um manifestante de extrema direita, uma equipe de televisão que filmava um ato contra Merkel em Dresden. O manifestante em questão tinha sido contratado pela Polícia local em caráter privado.
As forças de segurança também foram criticadas nos últimos dias por falta de preparo e de mobilização nos incidentes violentos em Chemnitz.
Em menor número, os policiais se viram cercados no domingo pelos neonazistas, que lhes lançaram garrafas, pedras e outros objetos. A chanceler Merkel denunciou "o ódio nas ruas" e "as perseguições coletivas".
Na segunda-feira à noite, durante duas manifestações da extrema direita e da extrema esquerda, a Polícia se viu mais uma vez em desvantagem numérica, ainda que os serviços de Inteligência interna tenham alertado que as cenas de violência poderia ocorrer.
Ao todo, foram mobilizados cerca de 590 agentes em Chemnitz, enquanto as duas concentrações reuniram mais de 6.000 pessoas. Os confrontos deixaram pelo menos 20 feridos.
* AFP