A advogada Johana Muñoz Carvajal, 23 anos, acordou da anestesia no quarto da clínica Arte & Cuerpo, em Medellín. Ela é uma das vítimas de uma série de cirurgias plásticas que deixaram cicatrizes, entre outras reclamações direcionadas ao médico Daniel Posada.
Enquanto esperava receber alta, Johana lembrou que, dois dias antes, entrara ali em busca de informações sobre o implante de silicone nos seios. Posada a convencera a incluir no combo a lipoescultura. O pacote custaria 9 milhões de pesos colombianos (R$ 10,1 mil). Naquele 22 de abril de 2014, chegou em casa decidida.
– Vou operar amanhã – falou para o namorado Damiáns Corrales Ibarra, 32 anos.
– O quê? Não... – advertiu o marido.
– Estou em muito boas mãos, os caras têm experiência – encerrou ela.
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Dois dias depois, quando entrou na sala de cirurgia, Johana estranhou não ver Posada.
– Ele já vem – disse a enfermeira, apresentando outro médico: doutor David Majana.
Johana conhecia Majana apenas pelo nome. Em setembro daquele ano, ele se tornaria mais famoso por aparecer em um vídeo dançando com órgãos de uma paciente nas mãos, durante uma cirurgia.
Ao acordar, a paciente não tinha certeza se Posada estivera ali ou se Majana a operara. Antes de liberá-la, uma enfermeira orientou seus pais:
– Ela perdeu muito sangue. Deve tomar água.
Duas semanas depois, Johana acreditava estar recuperada. Não fosse um susto, enquanto passeava de carro com o namorado.
– Amor, o que tens aí? – gritou Ibarra, ao ver a substância esverdeada sobre a blusa de Johana.
– Silicone! – apavorou-se ela.
Johana começou a chorar. Procurou Majana e Posada, mas não os encontrou no fim de semana. Pelo WhatsApp, Majana receitou um antibiótico. O problema fora resolvido, mas Johana estava inconformada com as cicatrizes nos seios e com a assimetria das duas mamas após a intervenção.
– Te deixei com seios lindos – disse Posada, em consulta. – Não te preocupes, corrijo essa cicatriz.
Por mais 4 milhões de pesos (R$ 4,4 mil), Posada prometia refazer a cirurgia utilizando a técnica que aprendeu no Brasil.
– Estou fazendo especialização sobre reconstrução de seios de mulheres com câncer – disse.
– Mamãe e eu saímos convencidas: se esse cara é capaz de reconstruir um seio com câncer, o que não será capaz de fazer com o meu? – vibrou.
A cirurgia transcorreu de forma normal. Mas Johana sentia dores e queria a garantia de que as próteses antigas haviam sido substituídas. Estranhou ao ler no histórico clínico: uma mama aparecia com 350 centímetros cúbicos de silicone. Johana tinha 500 centímetros cúbicos no seio esquerdo e 450 no outro.
– Se iam equiparar, tinham de ter colocado uma quantidade superior a 450 – diz ela, que até hoje não tem certeza sobre a validade das próteses.
Dúvida semelhante perturba a empresária Angela Estefanía Obando, 29 anos. Três dias antes de Johana fazer a última cirurgia com Posada, ela também buscou reparação. Tudo começou no final de janeiro, quando Angela encontrou na internet a clínica Especialistas Del Poblado. Buscava reparar cicatrizes de uma cirurgia anterior e queria fazer lipo abdominal. O médico Posada a convenceu a aumentar os seios. No dia 2 de fevereiro, ela baixou para cirurgia.
– Foi um desastre. Posada nunca chegou para a cirurgia. David Majana me operou. Quando saí, havia cicatrizes, fiquei com bolas no corpo – relata.
Angela voltou a marcar consulta com Posada.
– Quero que você me opere – pediu. – Tranquilo. Corrijo tudo – teria garantido o médico.
A cirurgia foi marcada para 10 de novembro de 2014. Angela chegou às 17h30min, acompanhada da irmã e da cunhada. Posada desenhou os locais das incisões no corpo de Angela. Dispensou o anestesista. Decidiu trocar as próteses: Angela tinha 450 centímetros cúbicos no seio direito e 500 no esquerdo. Posada queria colocar 550 centímetros cúbicos.
– Doutor, é muito! – assustou-se. – As próteses estão nadando (no corpo), vou trocá-las – teria respondido Posada.
Às 18h, Angela entrou na sala de procedimentos. – Não era uma sala de cirurgia. Ali não tinha anestesista, respirador, equipamento para reanimação. Havia cama, lâmpada e aparelho de som, porque estava escutando música – lembra.
Quinze dias depois, Angela começou a sentir mais dores. Os pontos estavam inflamados. O seio direito necrosou. A pele caiu.
Angela enviava mensagens por WattsApp a Posada, mas não conseguia marcar consultas:
– Ele dizia que estava no Brasil. Pediu que eu não me preocupasse. Que isso era uma alergia ao micropore.
Em 10 de dezembro, enquanto trabalhava em sua clínica de reabilitação de drogados nos arredores de Medellín, Angela sentiu uma dor insuportável.
– Era como se os seios fossem cair. Havia pus por toda parte – descreve.
Foi levada para a Clínica Bolivariana, onde os médicos ordenaram internação urgente. A ecografia dos seios mostrou infecção.
– Há risco de infecção generalizada, e os seios estão muito perto do coração. É altamente perigoso – escutou de um médico.
Na mesma clínica, havia outra paciente de Posada. Quando as enfermeiras perguntavam com quem ela havia feito a cirurgia, Angela escutava:
– Hum…
– Chegou um momento em que perguntei: “Por que ‘hum’?”. Eu não era a única paciente dele.
– Esse cara está causando danos. Não pode entrar em nossa clínica – disseram a ela.
Angela ficou internada por oito dias. Permaneceu 20 dias afastada do trabalho. Foi salva, mas ainda não sabe a qualidade das próteses dos seios.
Tempos atrás, visitou a Disney, mas não conseguiu aproveitar alguns brinquedos devido às dores:
– Era como se meus seios fossem sair pela boca. Eu deito, e o seio direito vai parar embaixo da axila. Praticamente não tenho sensibilidade.
E há os efeitos emocionais. Angela chorava compulsivamente nos primeiros dias. Entrou em depressão. Não queria que o marido, Alejandro Rincón Orozco, 37 anos, a visse com os seios disformes.
– Você não paga cirurgia estética para ficar pior do que estava. Não posso colocar maiô, sequer vestir uma blusa decotada – lamenta.
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Veja imagens dos corpos de algumas vítimas: