Uma das portas de entrada de imigrantes caribenhos e africanos no Brasil, o Acre está enviando para Porto Alegre oito ônibus ocupados por refugiados haitianos e senegaleses.
Os veículos começarão a sair de Rio Branco, capital do Acre, a partir de quinta-feira, dia 21. Como a distância é superior aos quatro mil quilômetros, as viagens duram cerca de quatro dias, com o desembarque em Porto Alegre podendo ocorrer na próxima segunda-feira.
Considerando que os veículos são de capacidade para 44 pessoas, o número de imigrantes a desembarcar em Porto Alegre poderá ser de 396, já que serão feitas nove viagens entre Rio Branco e Porto Alegre, informa Nilson Mourão, secretário dos Direitos Humanos do Acre.
Novos imigrantes mudam o cenário do Rio Grande do Sul
No último dia 12 de maio, o governo estadual do Acre publicou no Diário Oficial a contratação de ônibus para transportar os imigrantes em caráter de "emergência social". Na descrição do veículo contratado, são determinadas as características, como a oferta de serviço de ar-condicionado, cortinas, poltronas reclináveis e sistema de rádio, além de três refeições diárias.
A publicação no edital também definiu que a jornada contaria com paradas em Porto Velho (RO), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Curitiba (PR) e Florianópolis (SC).
No mesmo ato, o governo do Acre também contratou 35 ônibus para levar imigrantes haitianos para São Paulo. No total, os serviços de fretamento custaram R$ 2,087 milhões.
Haitianos enviados pelo Acre estão deixando o Estado
Nilson Mourão explica que as viagens entre Rio Branco e São Paulo começaram na semana passada. No caso de Porto Alegre, terão início nesta quinta-feira. Ele explica que nem todos os quase 400 migrantes virão ao Rio Grande do Sul. Parte considerável deles descerá antes em Curitiba e, principalmente, Florianópolis.
- A partir de quinta-feira à noite, partirão os ônibus para o Sul. Deverá ser um por dia - diz Mourão.
Ele ainda falou sobre a situação dos imigrantes no Acre, porta de entrada dos refugiados no Brasil.
- A situação é dramática. Desde dezembro de 2010, só faz aumentar o número de migrantes. Agora temos muitos familiares chegando. O marido já está aqui, daí ele traz a mulher, os filhos, o primo, um cunhado. Temos em Rio Branco um abrigo que já está completamente deteriorado. Tem capacidade para 200 pesoas, mas chegou a ter mil ao mesmo tempo - relatou Mourão.
Vice-prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo confirmou que a prefeitura tomou cnhecimento da chegada de novos imigrantes por terceiros. Ele disse, contudo, que ainda não é possível precisar a data e horário de desembarque.
Melo afirmou que o governo do Acre não avisou a prefeitura de Porto Alegre.
- O governo do Acre não pode cometer esse tipo de irresponsabilidade. Estamos tratando de pessoas. Todos vão ser bem-recebidos, mas a prefeitura sozinha não tem como enfrentar isso, precisamos de uma força-tarefa e de uma coordenação do governo federal - diz Melo.
Ele reforça que a chegada de centenas de imigrantes, que vem, em parte, sem nenhum contato local e sem conhecimento da língua portuguesa, demanda a mobilização do governo e da sociedade para a busca de abrigo e de colocação no mercado de trabalho. A aproximação do inverno gaúcho é outra preocupação.
zh.doc: quem são os novos imigrantes do Rio Grande do Sul
Melo recorda que, no final de 2014, chegaram à rodoviária de Porto Alegre ônibus com haitianos vindos do Acre. Não houve aviso prévio. A prefeitura decidiu recepcioná-los, mas os imigrantes, assustados, evitavam o contato, naturalmente dificultado pela questão da língua - os haitianos falam creole, uma mistura de francês com dialetos locais. Naquela ocasião, os viajantes queriam, na verdade, ir para São Paulo e Santa Catarina. Porto Alegre acabou sendo apenas um ponto de parada.
Mourão assegura que está tentando melhorar a interlocução com demais Estados e prefeituras para avisar com antecedência sobre a chegada de refugiados.
- Estou tentando corrigir essa polêmica do passado. Já notifiquei São Paulo e Santa Catarina. Amanhã (quarta-feira) vou tentar fazer o mesmo com Porto Alegre e Curitiba - assegurou o secretário dos Direitos Humanos do Acre.
Para ele, o problema é a política migratória do país.
- Temos uma política migratória de fronteira aberta. Se é aberta, o imigrante entra, é legalizado e recebe apoio humanitário. O que precisamos é construir um processo de parceria e de cooperação entre os Estados para oferecer abrigo - avaliou Mourão.
Nesta terça-feira, o Ministério da Justiça anunciou a suspensão do transporte de imigrantes do Acre para a cidade de São Paulo. Os estrangeiros só devem voltar a ser levados após ser estabelecida nova estratégia. O governo do Acre diz que a operação está mantida.
A imigração de haitianos para o Brasil começou a ganhar fôlego em 2010, depois do terremoto que devastou o país e ampliou o cenário de pobreza, desemprego e desesperança. Eles entram no país pelo Acre e Amazonas, mas, depois de solicitar o refúgio, migram para as regiões Sudeste e Sul, onde conseguem mais acesso ao emprego. No Rio Grande do Sul, os imigrantes estão concentrados no interior, em cidades como Encantado, Bento Gonçalves, Caxias do Sul, Lajeado e Passo Fundo, trabalhando principalmente em frigoríficos e na construção civil, setores em que os empresários enfrentavam dificuldades para encontrar mão de obra. A indústria, desde o início, se interessou pela contratação dos imigrantes. A partir de 2015, contudo, os refugiados começaram a permanecer mais em Porto Alegre.
Além dos haitianos, o Brasil e o Rio Grande do Sul também contam com número crescente de imigrantes de Senegal e, em menor escala, Gana, Bangladesh e República Dominicana.
Em 2011, o número de pedidos de refúgio no Brasil, feito junto à Polícia Federal, foram de 3.501. Em 2013, chegaram a 17.927. Já em 2014, somente até o final de julho, as solicitações de abrigo no país estavam em 17.903.
Até agosto do ano passado, as estimativas eram de que cerca de dez mil novos imigrantes - caribenhos e africanos - estavam vivendo no Rio Grande do Sul. Os haitianos estariam em torno de sete mil. Depois, a segunda maior comunidade era a de Senegal.