#vocênãoéCharlie #elenãoéCharlie #eunãosouCharlie
Cada um é cada um. Só a diferença nos salvará.
Me solidarizo totalmente com a hashtag que transitou em velocidade frenética pelos servidores do planeta logo depois do atentado em Paris. A indignação coletiva é um bem necessário. É uma dimensão, mas não a única, da reação que nos cabe enquanto os corpos inertes descansam no chão da França.
Tem aí uma armadilha.
É justamente assim que eles nos enxergam. Todos iguais. Uma massa de pagãos manipulada e dominada pelo monstro capitalista que se chama EUA. Mostramos unidade nas praças e nas redes sociais. Mas o que precisamos mesmo, agora, é defender a diferença.
Se todos somos Charlie, todos apedrejamos mesquitas na quinta-feira. Todos colocamos a bomba no restaurante árabe da França. Todos berramos slogans islamofóbicos na Europa mal cicatrizada do nazismo.
Nós somos diferentes. Eles também. Centenas de milhões de muçulmanos mundo afora, a maioria, condenam o terrorismo. Só não gritam mais alto porque, muitas vezes, têm medo da violência dos regimes a que estão submetidos.
É pelo direito à assimetria e à pluralidade que devemos lutar. Impor, se for preciso. Principalmente a quem acha que somos todos iguais.
Liberdade não é falta de limites. Vale para a raiva e para o humor. O nó da questão: como e quem estabelece esses limites. O fundamentalismo acredita que a violência é o pincel atômico a desenhar fronteiras. Nós, que somos vários, pensamos diferente. A mediação, o diálogo, o bom senso, o respeito, a liberdade, a ética e a quantidade exata de leis - nem mais, nem menos - são os únicos autorizados a exercer esse papel.
Não é Deus nem o diabo que nos indicará o ponto de equilíbrio dessa gangorra. De um lado, os direitos de cada um. No outro, os direitos de todos. Se somos todos iguais, a gangorra tomba. É isso que as bombas e o medo e o radicalismo querem.
Acabou a brincadeira.