As capivaras, animais-símbolo da Estação Ecológica do Taim, no sul do Estado, ainda encontram brechas entre as grades de proteção que ladeiam a BR-471, rodovia de 15,7 quilômetros que rasga o banhado em dois. Assim como elas, tartarugas, ratões-do-banhado, cachorros-do-mato, tuco-tucos, jacarés-do-papo-amarelo, aranhas e mais de 250 espécies de aves têm sido ameaçados pela inconclusão do telamento na rodovia federal, que já dura mais de 10 anos.
A burocracia tem emperrado a reestruturação dos escudos derrubados por uma enchente em 2002. O Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) só autorizou a obra em 2009, estabelecendo como requisito o respeito ao projeto original do Sistema de Proteção à Fauna implementado em 1998. Assim, depois de anos empilhadas nos fundos da sede da estação, as telas doadas em 2004 pela Gerdau começaram a ser instaladas apenas em julho de 2011.
A obra, orçada em R$ 1,5 milhão, emperrou seis meses depois, faltando 10% para terminar - cerca de um quilômetro, em trechos intercalados, dos 10,2 para os quais está previsto o telamento, segundo o projeto original de amparo à fauna. O sistema estabelece que nos 5,5 quilômetros restantes não haja proteção lateral, apenas túneis subterrâneos para passagem de animais.
O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que administra a estação, estima que esses 10% que faltam - em toda a extensão da rodovia, são 25 pontos destelados - poderiam reduzir em mais de 90% o número de mortes de animais. Só em 2013, foram 335 casos - 175 capivaras.
Mata nativa cresceu e será necessária nova licitação
E o serviço está parado até hoje. o contrato com a empresa SBS Engenharia, que executava o trabalho, foi suspenso pelo Dnit em janeiro de 2012, devido à necessidade de se abrir outra licitação para uma nova obra: a supressão da mata nativa que, por causa da demora para o início da restauração do telamento, cresceu em algumas partes da rodovia. A vegetação alta seria, agora, o principal entrave ao fim dos trabalhos. Para suprimi-la e, a partir daí, retomar a instalação das grades de proteção, é preciso autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).
- Eles exigiram uma enormidade de transplantes de árvores e de plantio compensatório, cujos custos não tínhamos previsto - justifica o engenheiro da Superintendência do Dnit em Pelotas, Vladimir Casa.
Ele diz que a licença já foi solicitada ao setor de Meio Ambiente do Dnit. Quando autorizados, afirma, a licitação para a retirada da mata nativa será aberta. Depois de concluída, o contrato com a SBS será reativado, e a obra de telamento, reiniciada imediatamente.
- Se conseguirmos tirar a vegetação hoje, a colocação das telas será feita amanhã - diz Casa, garantindo que até junho a estação estará protegida.
Quantidade de túneis passa-fauna deve crescer
O telamento, embora inacabado, já tem dado resultados: desde que as equipes começaram a monitorar, em 2010, o ano passado foi o que menos registrou bichos mortos por atropelamento. Ainda assim, 335 animais mortos é um número considerado alto pelo analista ambiental do ICMBio e chefe da estação, Henrique Ilha. Uma das causas apontadas por ele é o fato de a rodovia ser reta, sem curvas, convidando os motoristas a exceder a velocidade permitida de 60km/h.
Outras medidas estão sendo propostas pelo órgão para diminuir o número de atropelamentos de animais: aumentar a quantidade e o diâmetro dos 19 túneis passa-fauna, instalar tachões que impeçam as ultrapassagem de veículos e implementar novos radares eletrônicos. Em média, por mês, 31,5 mil carros percorrem o trajeto que liga Rio Grande a Santa Vitória do Palmar.
Além disso, agora que o ICMBio se certificou de que os túneis são realmente eficazes para a travessia de animais, a ideia é remodelar o projeto original do Sistema de Proteção à Fauna, que prevê um trecho propositalmente destelado. Ainda neste semestre, especialistas devem visitar a estação para, junto ao órgão, propor que esse espaço também seja protegido.
- Não tínhamos a confirmação de que os túneis funcionavam de verdade. E prevíamos que as telas poderiam ter furos ocasionados por outros desastres ambientais ou acidentes de trânsito. Então, se algum bicho por ventura chegasse à rodovia por algum desses vãos, ficaria empenhado, não conseguiria voltar ao banhado - explica Ilha.
Segundo ele, no plano inicial, os motoristas deveriam aprender, com placas informativas, controladores de velocidade e campanhas de conscientização, a conviver com os animais na pista.