Até hoje fora do mapa da indústria petrolífera, o Rio Grande do Sul tem chances de também tomar parte na exploração de uma fonte considerada a nova revolução energética global.
Por ter grande parte do território na Bacia Sedimentar do Paraná, que se estende do Mato Grosso ao Uruguai, o Estado pode entrar no radar da prospecção do "shale gas", popularmente conhecido por gás de xisto.
Gás natural produzido a partir de rochas chamadas de folhelhos, o insumo está levando os EUA a caminharem para eliminar a dependência dos combustíveis fósseis do Oriente Médio e alcançarem a autossuficiência energética na década de 2030. Em 13 anos, a fonte passou de 1% para 30% da oferta de gás natural no país.
Para não ficar mais para trás, o governo federal anunciou semana passada a intenção de realizar em dezembro leilão específico para o shale gas. Uma das bacias que deve ter blocos ofertados, adiantou a Agência Nacional do Petróleo (ANP), é a do Paraná.
Outro movimento veio da Petrobras. Na sexta-feira, a estatal anunciou um programa para identificar o potencial de gás natural em bacias sedimentares terrestres do país. Entre as principais intenções está o uso do gás de folhelhos na alimentação de termelétricas.
No Estado, explica João Marcelo Ketzer, coordenador do Centro de Excelência em Pesquisa e Inovação em Petróleo, Recursos Minerais e Armazenamento de Carbono da PUCRS, há potencial nas regiões norte, oeste e sul. Mas pondera que, por enquanto, é prematuro dizer que haverá exploração.
- Existe potencial, mas é cedo para dizer se é alto, médio ou baixo - ressalta Ketzer, lembrando não haver certeza de que a ANP incluirá no leilão blocos localizados no território gaúcho.
Estudo da Agência Internacional de Energia publicado ano passado coloca o Brasil na 10ª posição entre as maiores reservas mundiais. Levantamento da consultoria KPMG afirma que o país tem possibilidade de alcançar o segundo lugar nas Américas.
- O shale gas não estava no foco de exploração. Está agora devido a essas descobertas nos EUA - avalia Aloísio Nóbrega, vice-presidente da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI).
Utilização para mover térmicas deve demorar
Com o Brasil recém despertando para o shale gas, o uso da nova fonte no país ainda deve demorar. Para João Luiz Zuñeda, diretor da Maxiquim, consultoria do setor químico, é um trabalho que ocorrerá ao longo desta década até o combustível entrar de fato na matriz energética nacional e começar a mover térmicas.
João Marcelo Ketzer, da PUCRS, lembra que as empresas que arrematarem os blocos oferecidos pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) no final do ano apenas farão estudos nestas regiões para verificar a existência do recurso e a viabilidade econômica da exploração, tarefa que costuma levar alguns anos.
- Não é uma solução para o curto prazo. Além de encontrar as bacias, é preciso definir a regulamentação, a tecnologia de exploração e as questões ambientais. Mas ainda bem que pelo menos estamos iniciando este debate - aponta Zuñeda.
A questão ambiental, aliás, é alvo de polêmica nos EUA, apesar de a emissão de gases de efeito estufa ser inferior em relação ao petróleo e ao carvão. Além do temor até de terremotos, existe a suspeita de que a tecnologia de fracionamento hidráulico das rochas, questionada em alguns países da Europa, possa contaminar lençóis freáticos.
Segundo Ketzer, no caso do Brasil haveria riscos, mas existem formas de precaução e controle para que uma eventual exploração não contamine o Aquífero Guarani, maior manancial de água doce subterrânea do continente. A vantagem, diz o especialista, é que o aquífero está "algumas centenas de metros acima dos folhelhos", portanto distante das rochas que contêm o gás.