Uma das primeiras lições que se aprende quando se aterrissa em Porto Príncipe é que o cenário na capital haitiana é o contrário do que estamos acostumados a ver nas favelas do Brasil: lá, os poucos ricos moram no alto das montanhas e os pobres na parte plana.
Enviado de ZH em 2005, no auge da crise haitiana após a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristide, busquei uma analogia que aproximasse mais o cenário dos leitores gaúchos: Porto Príncipe é como uma grande Cruzeiro, um dos maiores complexos da capital gaúcha, só que do tamanho de uma cidade.
No Haiti, não há saneamento básico e 80% da população vive com menos de US$ 1. Os números frios, porém, só são traduzidos com perfeição no momento em que se pisa no barro. Barro, aliás, que está na maior parte das construções da cidade e até na comida dos haitianos. Umas das visões mais chocantes é uma espécie bolacha, feita de terra, assada no forno e vendida na Cozinha do Inferno, um mercado a céu aberto onde porcos, lixo e comida se misturam, tornando um vencedor de estômago forte quem consegue cruzar seus mais de 300 metros sem vomitar.
O Haiti tornou-se um país familiar dos gaúchos, tanto que em 2007, quando voltei ao país da América Central, uma das imagens mais impressionantes era do fascínio entre as crianças causado pelos homens vestindo a farda verde-oliva e trazendo no braço a insígnia Força Pampa.
Ouça áudio de entrevista de Rodrigo Lopes à Rádio Gaúcha:
No outrora violento bairro de Cité Soleil, chegamos para acompanhar uma patrulha. Logo, os militares foram cercados por dezenas de crianças. De repente, uma delas caiu no chão. Havia sangue no rosto. Em outros tempos, o episódio seria suficiente para deflagrar a revolta e, em minutos, a situação fugir do controle.
Sabedor da máxima de que no Haiti tudo pode mudar de uma hora para a outra, o soldado Nack, de Porto Alegre, tomou o menino nos braços e iniciou uma marcha. Ao seu redor, uma turba infantil o acompanhava. Nack levou o menino a pé até o posto de saúde do bairro, sob aplausos dos haitianos. E a emoção dos repórteres. Como gaúcho, não consegui esconder as lágrimas. O país tinha - e tem - tudo pra dar errado. Já deu. Mas sem os brasileiros - e a ONU - lá, seria muito pior.
Veja como acontece um terremoto: