O volante Lázaro Luan Zanini Scapolan, o Luan, tinha 18 anos e era joia das categorias de base do São Paulo quando mirou, nas mãos do empresário, um documento que apontava o interesse da Roma em levá-lo para a Europa. Ele começava a ter oportunidades no time, à época, de Muricy Ramalho, mas era difícil conquistar espaço na equipe que empilhava títulos. Viu na papelada a chance de iniciar a trajetória longe do país. Caiu em uma cilada.
Luan viveu na capital da Itália por só uma semana. Mas foi uma longa semana. Não havia interesse da Roma. Na verdade, seu destino era o Cisco Roma, clube que disputava a terceira divisão do país. Ainda sem passaporte europeu, o volante foi deixado em um ambiente que não lhe propiciava a estrutura necessária para se adaptar à nova realidade.
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Ninguém o orientava sobre o que fazer nos treinos. Largavam-no na academia, sem dizer quais exercícios executar. A atitude era a mesma com relação à moradia. Luan foi colocado em um apartamento, dividido com outros três jogadores de nacionalidades diferentes. A barreira da língua impedia qualquer interação.
A rotina era de longas horas enfurnado no quarto, assistindo à televisão que tagarelava frases que passavam longe de sua compreensão. Convencido de que precisava voltar, ligou para o empresário e o colocou contra a parede. Soube, então, que havia a possibilidade de jogar no Bari, clube médio do país.
– Lá, foi diferente. Tinha organização. O treinador era o Antonio Conte, hoje no Chelsea. Só que o meu passaporte (italiano) não saía. O Bari queria que o meu empresário bancasse o passaporte, e ele queria que o clube pagasse. Daí passaram-se os três meses que eu podia ficar lá, e tive que sair – conta Luan.
O agente ainda queria que Luan seguisse uma peregrinação, em busca de alguma equipe disposta a bancar a documentação. O jogador, porém, estava farto e se recusou. De volta ao Brasil, teve de reconstruir a carreira do zero. Recomeçou na equipe sub-20 do Santo André e rodou por Red Bull e Corinthians de Alagoas, passou por Turquia e Portugal, voltou para defender o Juventude e se firmou no Avaí, onde está desde o ano passado. Do episódio traumático do início de carreira, herdou uma desconfiança:
– De lá para cá, muitas pessoas me ligam interessadas em trabalhar como meus empresários, e até podem ser sérias, mas eu sempre fico com um pé atrás. Hoje, não tenho assinado contrato com ninguém para fazer essa função. Posso até perder oportunidades, mas não quero sofrer algo parecido com aquela semana em Roma.
Rodrigo Souza descobriu que foi enganado quando já estava de saída do Vietnã
Rodrigo de Souza Fonseca soube se adaptar mesmo com a barreira da língua, ultrapassou a sonolência das primeiras semanas, atrapalhado pela diferença de fuso horário, e teve oito meses felizes jogando no Vietnã. Mal sabia, porém, que foi enganado no momento em que seu empresário fechou com o Can Tho, clube que defendeu. O golpe só veio à tona no momento em que foi rescindir e não entendeu porque não receberia o valor de dois a três meses de salário que é protocolar no cancelamento do vínculo.
O volante esperava a indenização porque, ao assinar, não havia recebido luvas. Só que o presidente do Can Tho garantiu, na hora de rescindir, que tinha passado o valor ao empresário, um português que o levou ao clube após ter lhe observado em um torneio que o clube Duque de Caxias, no qual Rodrigo atuava, jogou no Vietnã. O jogador, no entanto, nunca viu a cor do dinheiro.
Até ali, a experiência no Sudeste Asiático havia sido uma grata surpresa. A referência que o jogador tinha do país era a da guerra dos anos 1960 tão retratada nos filmes de Hollywood. Imaginava cidades dizimadas pelo conflito, sem considerar que houve tempo para a reconstrução. Ficou impressionado com a qualidade de vida por lá e, principalmente, com a segurança. Passou oito meses felizes.
Contudo, uma lesão o afastou dos campos. E Rodrigo e o clube negociaram a saída do jogador. Foi aí que recebeu a desagradável informação de que havia sido ludibriado. Indignado, confrontou o empresário, que negou ter recebido as luvas.
– Ele sugeriu que eu acionasse o clube na Justiça, disse para eu pegar um advogado. Mas como que eu, com a dificuldade para me comunicar em outra língua, ia explicar tudo para um advogado e confiar no cara? – questiona.
Ficou, então, o dito pelo não dito. Rodrigo ainda ouviu rumores de que o empresário teria pego o dinheiro das luvas para gastá-lo em ingressos da Copa do Mundo de 2010, na África do Sul.
De volta, recuperou-se e fez carreira com passagem até pelo Cruzeiro. Em 2017, começou no Náutico a campanha na Série B, mas resolveu deixar o clube após ter o salário atrasado. Hoje, defende o CRB. E não esquece a sensação amarga de ter sido enganado:
– A gente luta por um sonho que é jogar futebol. Quando é enganado, principalmente nessas questões de dinheiro, é muito triste. Ficou uma frustração, mesmo que eu tenha conseguido dar continuidade na carreira.
* ZH Esportes