As mulheres brasileiras, enfim, começam a ganhar espaço dentro do campo. Após os fenômenos Marta, Andressa Alves e Bárbara levarem mais de 70 mil torcedores ao Maracanã nos Jogos Olímpicos do Rio, uma nova regra da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) promete abrir caminho para que outros nomes no esporte possam surgir. A partir de 2019, os times que garantirem vaga na Libertadores e na Sul-Americana só poderão participar das competições continentais se tiverem uma equipe feminina. A CBF, inclusive, estuda estabelecer a mesma norma para as séries A e B:
– Conmebol e CBF estão juntas nisso. A CBF está criando um modelo de licenciamento. A intenção é ter essa mesma regra para as séries A e B do Campeonato Brasileiro. Não queremos fazer regra rígida, talvez seja preciso dar um prazo maior. Mas já está sendo pensado, sim – afirma Marco Aurélio Cunha, coordenador licenciado de futebol feminino da CBF, atualmente fora do cargo para assumir como diretor de futebol do São Paulo.
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O Brasil, aliás, acaba de dar um bom exemplo. Depois de anunciar um Brasileirão feminino com séries A1 e A2 (16 clubes em cada, com dois grupos de oito e turno e returno) e repasse de mais verbas à competição, a CBF contratou Emily Lima como a primeira técnica da seleção feminina. A ex-jogadora estava à frente do São José-SP e assumiu o lugar de Vadão, demitido na terça-feira depois de dois anos e cinco meses no cargo.
Se a norma da Conmebol passasse a valer em 2017 e o Brasileirão terminasse hoje, apenas Santos e Flamengo estariam aptos a participar da próxima Libertadores. Na turma que hoje garantiria vaga na Sul-Americana, os únicos nas condições exigidas são Corinthians e Chapecoense.
Em marketing e em estrutura, quem arranca melhor na disputa é o Santos. As Sereias da Vila, uma versão feminina dos Meninos da Vila, têm 32 atletas. Há alojamento próprio para as meninas desde 2015, quando a
atual gestão retomou o projeto do futebol para mulheres. Todas as jogadoras são registradas na CBF e recebem salários. O Santos gasta R$ 2,3 milhões ao ano, quase sem retorno.
– Futebol feminino não rende nada para o clube, em termos de valor. A nossa missão é fazer acontecer. Projetamos que vai crescer. Quando? Não sei – entende o presidente do Santos, Modesto Roma Júnior.
A venda de jogadoras para o Exterior também, segundo o presidente, não agrega aos cofres do Santos. Apesar de elas terem contrato e pertencerem ao clube paulista, não há interesse dos times de fora. A questão cultural e a falta de revelações no país seriam os principais motivos. E se refletem no cenário internacional. Nenhuma brasileira chegou ao patamar de Marta, hoje no FC Rosengärd, da Suécia, cinco vezes melhor do mundo e indicada pela Fifa entre as 10 melhores do ano de 2016.
O mais próximo disso é a paulista Andressa Alves, atacante da seleção, 23 anos, com passagem pelo Juventus-SP, São José-SP e
Montpellier-FRA, e que assinou com o Barcelona. Para ela, o avanço no esporte para as mulheres esbarra no “excesso de preconceito”:
– Existe o futebol que está acima de qualquer gênero, é paixão mundial e levanta multidões por aí. E se ainda não o faz no feminino é menos por falta de potencial e mais por excesso de preconceito.
A norma da Conmebol permite que os clubes tenham convênios, como ocorre com Flamengo e Marinha, Corinthians e Audax.
– Não pode é ter um time de aluguel. Se o convênio for estruturado, com categoria de base e contratos registrados, pode. É possível absorver uma estrutura pagando custos, desde que fique claro que é um time feminino do clube X – explica Marco Aurélio.
COMO ESTÁ A DUPLA GRE-NAL
A dupla Gre-Nal, assim como a maioria dos times da Série A do Brasileirão, nem começou a pensar no assunto. Sabe da decisão da Conmebol, mas deixará tudo para o ano que vem.
– Ainda não debatemos. Se for obrigatório mesmo, vamos nos adequar no próximo ano – explica Valdir Espinosa, coordenador técnico do Grêmio.
No Inter, o caminho para a montagem de um time feminino está facilitado por conta da proximidade com a escola de formação da ex-jogadora Eduarda Luizelli, a Duda. Com escolinhas em Porto Alegre e em Canoas, ela tem uma de suas sedes no CT Parque Gigante. As meninas, no entanto, não têm qualquer tipo de envolvimento com o clube. Duda, inclusive, paga aluguel mensalmente e não utiliza o nome do Inter nas competições. Mas o caminho, ao que tudo indica, está aberto:
– Quem vai cuidar disso é a nova gestão, e certamente terá uma estratégia. Não tem nada programado, mas a Duda está usando o nosso espaço, aluga. Pode ser um caminho – diz o vice-presidente do Parque Gigante, Geraldo Luiz de Almeida.
Duda concorda:
– É muito importante essa nova regra da Conmebol, estamos felizes com a exigência. Mas sabemos que o mais importante é dar formação pra essas meninas. Essa tem de ser a prioridade. Hoje, temos no Parque Gigante turmas de seis e sete anos e acaba não custando nada. O clube vai até ganhar ao lapidar jogadoras. Tenho certeza de que teremos grandes projetos em seguida – comemora a ex-jogadora.
COMO ESTÁ NO RS E BRASIL
No RS
– O Gauchão é realizado pela Associação Gaúcha de Futebol Feminino, que tem a chancela da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), e é disputado por 14 times. O campeonato é dividido por fases, começando em junho e terminando em novembro. Apenas o Rio Grande, o Cruzeiro e o Pelotas estão representados no Estadual feminino entre os clubes tradicionais. As finais do Gauchão deste ano devem ocorrer nos dias 6 e 13 de novembro e reunirão as equipes Duda/Canoas e Black Show de Guaíba.
No Brasil
– São duas competições vinculadas à CBF. O Brasileirão é composto por 16 times femininos. Flamengo (o campeão da edição de 2016), Portuguesa, Vasco, Corinthians, Vitória, Santos e América-MG são os clubes tradicionais representados na competição. Já na Copa do Brasil são 32 equipes. Entre os clubes de Série A, apenas Santos, Flamengo e Chapecoense estiveram na última edição. O Corinthians/Audax sagrou-se campeão sobre o São José-SP, que até então era treinado por Emily, hoje a técnica da seleção brasileira de futebol feminino.
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