Poucos deram crédito à ladainha de Joseph Blatter em sua primeira manifestação após o terremoto que abalou a Fifa nesta semana. Mas em meio ao discurso que queria responsabilizar indivíduos e eximir a entidade que comanda, ao menos uma frase foi certeira:
- Mais notícias ruins virão.
Entenda os impactos...
...na Copa do Mundo
...no futebol sul-americano
...na Fifa
A instabilidade deve marcar os próximos meses da vida política do futebol mundial. Fifa, Conmebol e CBF ainda tentam recuperar-se do baque. Houve quem comemorasse o marco de uma transformação, de uma nova era de transparência. Outros são mais céticos.
Blatter entrega cargo e convoca novas eleições na Fifa
- Não podemos ser ingênuos e achar que os maus vão sair e os bons vão entrar - destaca Eduardo Tega, diretor executivo da Universidade do Futebol.
- Nada mudou. Houve todo este escândalo e o Blatter se reelegeu. É uma ilusão achar que haverá uma transformação - diz Amir Somoggi, consultor independente de gestão e marketing esportivo, citando a recondução do suíço para o quinto mandato à frente da entidade.
Fato é que as prisões e revelações das autoridades americanas inauguraram uma era de incertezas. Já não se sabe o que vai acontecer com as principais competições do mundo da bola, nem qual será o futuro de quem está no poder. Para tentar traçar possíveis cenários, ZH ouviu especialistas em direito, marketing e gestão esportiva. Confira.
Futebol brasileiro
A história mostra a dificuldade de mudar as estruturas de poder do futebol brasileiro. O comandante da vez sai sempre do mesmo grupo de privilegiados. Não há oposição formal dentro da CBF. Talvez por isso se espalhe o ceticismo quanto à possibilidade de uma transformação.
- Nós temos um modelo arcaico do qual somos reféns. Se não houver uma mudança de legislação, não há abertura para uma mudança - defende Pedro Trengrouse, advogado e consultor especializado em legislação e responsabilidade social.
Para Trengrouse, o senador Romário (PSB-RJ) tem de ser o líder do esforço de mudança, já que pode trabalhar por uma nova legislação. Segundo o advogado, é preciso criar mecanismos de controle efetivo que fiscalizem as atividades da CBF. A proposta costuma ser rechaçada por supostamente interferir na gestão de uma entidade privada.
- Essa explicação não procede. Antes de respeitarem as regras da Fifa, as entidades têm de existir, e, para isso, têm de estar de acordo com a legislação vigente - explica Trengrouse.
Há também o impedimento político. Os tentáculos em Brasília do poder vigente costumam frear iniciativas transformadoras. O momento, porém, é favorável. O clamor público com as revelações pode ajudar na missão de reconstruir as estruturas do esporte brasileiro.
Provocar uma revolução no sistema atual é decisivo porque ele é antidemocrático. Apenas os presidentes das 27 federações estaduais têm direito a voto nas eleições. Clubes e atletas são alijados das decisões. Os dirigentes se juntam em nome da perpetuação no poder. Mesmo que toda a cúpula da CBF seja desmantelada pela investigação norte-americana, os sucessores estariam inseridos na mesma estrutura.
- Só haverá uma mudança efetiva se este modelo ruir. Enquanto ele estiver em vigência, gente séria não vai se apresentar para participar da gestão, porque sabe o que isso vai significar - destaca Gurgel.
A MP que refinancia as dívidas dos clubes de futebol cobra contrapartidas como maior participação dos atletas nas entidades. Mas há quem a critique por não especificar critérios para que os jogadores tenham mais poder de decisão.
- As confederações colocam um representante de atletas nas assembleias e dizem que isso é dar poder aos atletas - dispara Trengrouse.
- Tivemos a Lei Zico, depois a Lei Pelé, agora esta MP, que é um avanço, mas não suficiente. Temos de parar de fazer "puxadinhos" de leis e discutir uma verdadeira nova legislação - defende Tega.
* ZH Esportes