O estudante Alan Somavilla, 11 anos, não precisa mais estudar na barraca construída em meio a lavoura de soja. Três dias após a reportagem de GZH mostrar o empenho da família para construir uma estrutura que protegesse o filho das intempéries, o alcance do sinal foi amplificado, não mais restrito apenas a área de plantio, e já atinge a residência do menino.
O equipamento, que também intensifica a velocidade da rede, foi doado pela empresa paulista Elsys após uma mobilização de empresários junto as companhias telefônicas Vivo e Claro, que envolveu a fabricante do modem ultrapotente.
Com testes e instalação concluídos nesta quinta-feira (27), o aluno do sexto ano já assistiu a aula da forma como sempre desejou, entre o quarto e a sala, protegido do calor de 27ºC que atingia o município de Estrela Velha, na região central do Estado, no fim da manhã.
— Estou muito feliz por não precisar mais ir para a rua estudar. E quero agradecer a quem doou a internet pra mim — resume o garoto, com simplicidade.
A imagem do garoto estudando na barraca percorreu o país em compartilhamentos de redes sociais e reportagens, o que gerou promessas de auxílio financeiro, doação de computadores e propostas para ampliar a rede precária de internet. E, com relação a isso, a familia de Alan teve outra boa notícia nesta quinta-feira. Uma campanha em especial já atingiu, em menos de 24 horas, uma meta antiga dos agricultores: a construção de uma casa nova.
Por meio de um site de "vaquinhas online", foram doados R$ 54 mil para a família — valor atingido às 9h30min desta quinta-feira (27). A campanha de arrecadação foi criada às 13h de quarta (26) e tinha o objetivo inicial de arrecadar R$ 45 mil.
Segundo Jéssica Souza, gerente de campanhas da plataforma Voaa — Vaquinha do Razões Para Acreditar, o sucesso da campanha motivou a ampliação do valor final para R$ 113 mil, mais de duas vezes o projetado na primeira publicação.
— Chamaram muito a nossa atenção dois fatores: o gesto do pai, que com tão pouco montou uma barraquinha com objetivo de o filho não perder os estudos na pandemia, e também vimos a casinha onde moram — explica a jornalista, que contatou a família para sugerir a criação da campanha.
A casa onde a família vive é de madeira e tem paredes tortas devido à ação do tempo. A mãe de Alan, Dejanira Somavilla, estima que a construção tenha cerca de 40 anos:
— A casa é muito antiga, "inferiorzinha", sabe?
Ao saber da quantia já arrecadada, a agricultora emudece ao telefone. Depois, explica que com o valor excedente pretende criar uma poupança para ajudar na faculdade do filho, que quer ser advogado.
— Investir no estudo em primeiro lugar. Eu não tenho nem palavras mais para agradecer — diz Dejanira.
O valor mínimo para doação na plataforma é R$ 25, por conta das taxas bancárias, e no Paypal é de R$ 40. A campanha online deve ficar no ar por mais uma semana, ou até que se observe que ainda há potencial de arrecadação. Depois, o dinheiro é depositado em uma conta bancária da família.
Internet
Para reforçar as condições de conexão, 20 metros de cabos foram instalados em uma clareira que dá acesso à roça. Em um poste de madeira, na mesma área onde os pais de Alan já haviam constatado ser o ideal para recepção do sinal, a antena foi instalada. A partir desse ponto, o sinal pode ser compartilhado para outra casa, porém consome os dados da rede 3G, agora explorada via wi-fi. A medida é estudada para beneficiar outros alunos da Escola Estadual de Ensino Fundamental (EEEF) Itaúba, conforme a diretora da instituição, Giovana Dalcin.
— Para nós, que vimos onde ele estava estudando, saber que tem internet em casa é sensacional — complementa.
A diretora, que foi professora de Alan nos anos iniciais, vê em casa as diferenças entre o que o estudante enfrentou e as condições que a própria filha tinha para estudar. Maria Clara, também de 11 anos, está matriculada na mesma turma.
— Eu via minha filha estudando com conforto, no quarto, deitada, e ele lá na barraca. Era de cortar o coração. Lá é perto do rio, quando é frio, é frio mesmo — reitera a docente.
Diretor comercial da Elsys, Claudio Blatt, destaca que uma situação semelhante encontrou a mesma solução na Colômbia. Em uma região de mata, também com fraca cobertura de internet, uma aluna escalava uma árvore e estudava em um pedaço de madeira pregado como se fosse uma escrivaninha. Na pandemia, o produto desenvolvido em São Paulo e fabricado em Manaus teve sua procurada aumentada de forma exponencial, segundo Blatt.
— O aumento de procura foi gigante. As pessoas precisam ficar em casa e precisam de conexão. E quando a gente ajuda alguém como o Alan, atingimos nosso propósito, que é conectar pessoas para transformar vidas — diz.
A cabana de lona transparente apoiada sobre tocos de madeira não deve ser desmanchada. Além de ter se tornado um símbolo do empenho dos pais, pode ser usada, pela criança, como um espaço para brincar. Sem a preocupações de concluir as tarefas enviadas pelos professores.