Os financiamentos imobiliários com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) mais do que dobraram no Rio Grande do Sul no primeiro semestre deste ano.
O valor financiado para compra e construção de imóveis fechou em R$ 5,312 bilhões de janeiro a junho no Estado, crescimento de 107% ante o mesmo período de 2020 — marcado pelo avanço da pandemia no país. Os dados fazem parte de levantamento da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip).
No acumulado de 12 meses, entre julho de 2020 e junho de 2021, o valor financiado no Estado somou R$ 9,988 bilhões, alta de 88,3% em relação ao período anterior (veja mais no gráfico).
A presidente da Abecip, Cristiane Portella, afirma que o mercado imobiliário como um todo já vinha mostrando sinais de retomada desde 2019. No cenário atual, a manutenção de taxa de juros que ainda cabem no bolso dos consumidores ajuda a explicar o aquecimento do setor, segundo a avaliação da dirigente:
— Como a gente está falando de financiamento de 30, 35 anos, qualquer redução traz muito mais pessoas para o jogo. Muito mais pessoas em condições de contratar um financiamento imobiliário, seja para o primeiro imóvel ou para a troca por um imóvel maior.
Cristiane cita o preço dos imóveis como outro fator que cria ambiente favorável para o financiamento. A presidente da Abecip afirma que, mesmo com movimento de recomposição de preços observada no momento, os valores dos imóveis ainda estão atrativos, levando em conta a inflação.
— Se atualizar pelo IPCA, esses imóveis ainda não estão nos patamares de preço que estiveram lá em 2014, 2015. Então, junta taxa de juros que cabem no bolso e preços de imóveis ainda atrativos. Esses são os fatores mais objetivos para explicar esse bom momento — pontua Cristiane.
O professor Alberto Ajzental, coordenador do curso de Negócios Imobiliários da Fundação Getulio Vargas (FGV), afirma que, além da taxa de juros em patamares mais baixos na comparação com anos anteriores, fatores comportamentais também explicam o aquecimento do mercado imobiliário. Ajzental avalia que o crescimento na busca por novos espaços de moradia, impulsionada pela pandemia, também tem papel esse movimento.
— Fico mais em casa, quero um espaço maior, melhor. Do ponto de vista comportamental é em relação à qualidade. Quero mais espaço ou o imóvel em outra localização, quero sair da cidade e ir para o campo, vou trabalhar de forma virtual. Se não tenho dinheiro para mudar de imóvel, vou reformar aquilo que tenho — destaca Ajzental.
As constantes altas no Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), popularmente conhecido como a inflação do aluguel, também influenciam no aumento na busca pela casa própria, segundo o professor da FGV.
Pessoas que estão na dúvida entre alugar ou comprar um imóvel acabam atraídas pela segunda opção no ambiente atual, no entendimento de Ajzental. O especialista destaca que, com a estimativa de continuidade de novas elevações na taxa básica de juro, o consumidor que está nessa situação é influenciado a comprar o imóvel o mais rápido possível diante da possibilidade de preços mais caros no futuro:
— Você tem um incentivo, um motivo, um impulsionador para as pessoas tomarem decisões e comprar, porque vai ficar mais caro depois.
Diretor do Sinduscon-RS e coordenador da Pesquisa Panorama do Mercado Imobiliário de Porto Alegre, Claudio Schuch avalia que o aumento nos financiamentos ocorre na esteira da busca maior por imóveis como investimento. Schuch afirma que a taxa de juros mais baixa incentiva os consumidores a pensar nesse bem como uma aplicação a longo prazo.
— Hoje, também com a questão do emprego, as pessoas se sentem mais seguras para adquirir um imóvel, contraindo um financiamento de longo prazo. Isso é um fator positivo. Tudo isso ajuda na retomada das construções no geral — salienta Schuch.
O dirigente do Sinduscon-RS afirma que a maior parte de venda de imóveis neste momento está concentrada, principalmente, em ambientes com dois e três dormitórios. Segundo o dirigente, esse movimento reflete a busca por maiores espaços, impulsionada pela crise sanitária.
O movimento registrado no Estado ocorre na esteira do desempenho nacional. O país anotou avanço de 124% no montante financiado no primeiro semestre de 2021 ante o mesmo período de 2020, somando R$ 97,05 bilhões.
Segundo semestre
Especialistas e entidades ligadas ao setor imobiliário mantêm o otimismo em relação à continuidade do bom momento do setor imobiliário no segundo semestre. A presidente da Abecip estima que, mesmo com projeção de Selic por volta de 6,75% ao ano, o número de financiamentos deve seguir em alta nos próximos meses.
A Abecip prevê alta de 57% crédito imobiliário neste ano. Cristiane cita a competição entre as instituições financeiras e as diversas modalidades de taxas como fatores que criam esse ambiente favorável:
— Como tem várias modalidades de taxa hoje no mercado, de dois anos para cá, a gente acredita que tem mais facilidade para a pessoa encontrar aquele indexador que mais se adapta ao seu momento atual.
A dirigente destaca que, em um primeiro momento, o crescimento de 57% no indicador pode passar a falsa sensação de queda em relação ao volume do primeiro semestre. No entanto, ela afirma que esse percentual só é menor em razão de uma base de comparação mais robusta.
O professor Ajzental avalia que o mercado imobiliário seguirá forte no segundo semestre, mas com certa redução na demanda. Ajzental avalia que novos aumentos na Selic vão diminuir a parcela da população em condições de adquirir um imóvel. No entanto, afirma que o setor vai continuar equilibrado:
— O lançamento de imóveis está um pouco mais forte do que a demanda. É provável que ocorra uma retração na demanda e uma readequação na oferta. Mas, de longe, não tem uma crise sistêmica ou uma bolha. Nada disso. O mercado está equilibrado, forte e demandado.